
Presidente de honra da SBPC, Mascarenhas foi protagonista no desenvolvimento da ciência do país. Ele foi um dos fundadores da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e do Centro Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento de Instrumentação Agropecuária da Embrapa (Embrapa Instrumentação). Também criou o Instituto de Física e Química da USP de São Carlos e o primeiro curso de Engenharia de Materiais da América Latina, na UFSCar. Foi professor convidado das mais prestigiosas universidades do mundo, como Harvard, Princeton e o MIT. E a lista de prêmios que já recebeu é imensa: Comendador da Ordem Nacional do Mérito Científico, Prêmio de Mérito Científico, na classe de Grã Cruz, a Prêmio Conrado Wessel de Ciência e Cultura 2006, entre tantos outros.
Uma história incrível de um intelectual que, sempre com muita lucidez, está a olhar para o futuro, como Janus, o deus de duas faces romano, que representa a dualidade, os começos e as passagens, ponto inicial da conferência intitulada De Leibniz à Era Digital do Século XXI. “Em sua imagem, a face do homem olha para o passado e a face da mulher olha para o futuro. E é olhando para o passado que a gente constrói o futuro”, disse ele, sugerindo, todo tempo, a leitura de grandes clássicos – porém, em suas versões digitais. “Hoje em dia, quem não lê livro digital está por fora. Eu posso carregar uma centena de livros comigo em meu tablet”.
A história dos grandes cientistas e das grandes revoluções científicas foi se construindo ao longo de séculos de muito estudo, muitas dúvidas e muita incompletude. Mascarenhas passa por Galileu Galilei, o gênio que revolucionou a ciência e a forma como hoje vemos o mundo. Morreu no mesmo ano em que nasceu Isaac Newton, em 1642. “Uma generosidade do universo”. O criador da teoria da gravitação sabia que não compreendia sua criação por completo, mas resolveu o problema de explicar a movimentação da lua. “Newton introduziu na ciência uma coisa muito ruim, que foi o determinismo absoluto”. Mas Karl Popper, séculos depois, contestou o princípio da verificabilidade, e trouxe para ciência a ideia da falseabilidade.
Retornando à época de Newton, passamos pela história de Gottfried Wilhem Leibniz, matemático, político, historiador, filósofo que descreveu o primeiro sistema binário de numeração. Os estudos de Leibniz, segundo o físico brasileiro, preparam o caminho para a criação do computador, séculos mais tarde. Ele também ficou conhecido por sua teoria das mônadas – outro conceito científico extremamente complexo que ainda não é totalmente compreendido. “A cabeça dele era um vulcão em atividade”, comenta.
Mascarenhas perpassa ainda Faraday, Darwin, Freud, Bertrand Russel, Godel e Ludwig Boltzmann, físico austríaco que desenvolveu o conceito de entropia e explicou a direção do tempo: “Foi com ele que aprendemos que o tempo é irreversível”.
E, décadas mais tarde, todo esse conhecimento edificado por séculos desemboca na revolução da informática que vivemos hoje. A invenção do transistor, em 1947, no Bell Labs, no Vale do Silício, nos Estados Unidos, foi a pedra fundamental de todos os produtos digitais que conhecemos hoje. “Isso foi mais importante que a bomba atômica”, considera.
Consciente de que o tempo só nos faz caminhar para frente, Mascarenhas conta que vislumbra um futuro para a ciência como o que foi desenhado por Charles Percy Snow, cientista e autor do livro “Duas Culturas e a Revolução Científica”. Nesse tempo, não muito distante, está a criação de uma chamada “terceira cultura”, fruto da união entre a ciência e o humanismo. “Isso é o que realmente precisamos: de uma ciência e arte, ciência e empreendedorismo”.
Essa seria a união que vai ser capaz de solucionar os problemas do futuro. E, como concluiu o vice-presidente da SBPC, Ildeu de Castro Moreira, que assume hoje a presidência da instituição, Sérgio Mascarenhas é um exemplo dessa convergência entre humanismo e ciência. E é este o conselho final do sábio cientista: “O futuro da ciência brasileira está nas crianças da favela, na solução da desigualdade. O futuro da ciência está na compaixão”.