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Jerson Lima Silva, novo presidente da Faperj: recursos investidos em ciência, tecnologia e inovação trazem retorno a médio e longo prazo | Foto: Leo Martins

RIO – Professor titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e membro da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Jerson Lima Silva construiu uma carreira científica de prestígio internacional ao decifrar mecanismos de proteínas ligadas a doenças como câncer e mal de Parkinson. Ha duas semanas, porém, ele enfrenta um desafio tão complexo quanto a estrutura molecular de proteínas. Nomeado presidente da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj), ele precisa dar vida nova à ciência do estado, mergulhada em sua pior crise. Em entrevista ao GLOBO, ele diz que o foco neste momento está em recuperar o orçamento perdido nos últimos quatro anos para depois apostar em setores estratégicos para o Rio, como energia, nanotecnologia, tecnologia da informação e biotecnologia.

Quais serão suas prioridades à frente da Faperj?

Reafirmar a missão principal da fundação, a de utilizar o fomento para estimular um aumento da qualidade e da quantidade da produção do conhecimento, aumentar a formação de recursos humanos e fazer chegar as inovações nas empresas. Somos o segundo estado em produção de conhecimento do país e quatro de nossas universidades estão entre as 20 mais bem avaliadas no Brasil (UFRJ, UERJ, UFF e PUC).

Qual o maior desafio?

Há muitos desafios, mas certamente o maior deles é a recuperação da execução do orçamento como previsto pela Constituição do estado do Rio, que aloca 2% da arrecadação líquida para a fundação. Devido à crise econômica e fiscal, o governo não repassou todo o orçamento da Faperj nos últimos quatro anos, o que levou a um atraso no pagamento dos projetos. Com o acordo de recuperação fiscal, é possível ter um plano de recuperação do status financeiro da fundação. Os recursos investidos em ciência, tecnologia e inovação trazem retorno a médio e longo prazo. Exemplos recentes foram os investimentos em pesquisas sobre extração do pré-sal e zika, que trouxeram um grande retorno econômico e social para o estado e para o país.

Qual o caminho para o Rio recuperar o protagonismo na ciência brasileira?

Pesquisa custa caro e requer investimentos; e é isso que a Faperj deve fazer. Na minha avaliação, é possível dobrar indicadores com uma política acertada de fomento. As universidades do estado têm exemplos de sucesso de parcerias público-privadas, principalmente por meio de seus parques tecnológicos. Precisamos replicar os parques de ciência e tecnologia e trazer mais crescimento tecnológico para o Rio de Janeiro.

A Faperj priorizará que áreas de pesquisa?

Por ser uma agência regional, temos que alavancar algumas áreas que poderão ser transferidas para o setor empresarial ou público. Destaco nanotecnologia e novos materiais, engenharias, biotecnologia, pesquisa clínica e estudos de segurança.

E que áreas da ciência são estratégicas para o estado do Rio?

A primeira é a de energia. O setor de óleo e gás tem um papel fundamental na economia do estado e foi alavancado pela pesquisa em águas profundas e a exploração do pré-sal. Boa parte dessa tecnologia foi desenvolvida aqui em universidades e institutos de pesquisa, cabendo destacar a Coppe/UFRJ, que possui um tanque oceânico para o desenvolvimento de inovações na área de extração de petróleo em águas profundas. Mas ainda é necessário avançar no desenvolvimento de tecnologias para baixar os custos do pré-sal. O secretário Leonardo Rodrigues propôs à Faperj buscar parcerias com empresas e agências reguladoras. Além das grandes indústrias, há toda uma cadeia de pequenas empresas tecnológicas que atuam na área e que devem ser estimuladas. Ainda dentro da área de energia, é muito importante para o estado ampliar a matriz energética de forma sustentável. O Rio de Janeiro tem grande potencial em energia solar e eólica.

Que outras áreas o senhor destaca?

A de nanotecnologia, novos materiais e dispositivos. Ela está entre as prioridades dos primeiros 180 dias. A nanotecnologia tem permitido produzir materiais superiores aos convencionais. Outra área é a de tecnologia da informação, que inclui inteligência artificial, cibersegurança e ciência dos dados. Essa área tem impacto em segurança, saúde, educação, agricultura e indústria 4.0. A biotecnologia e a biomédica translacional também são estratégicas. O Rio é líder no estudo de doenças emergentes, reemergentes e negligenciadas. As pesquisas com as doenças negligenciadas, tais como Chagas, leishmaniose, tuberculose, hepatite C são cruciais, já que há pouco interesse das indústrias farmacêuticas. A tuberculose é extremamente relevante devido à sua alta incidência.

Em que áreas da ciência o estado é mais avançado?

Em muitas, mas destaco doenças negligenciadas, arboviroses, neurociências, nanociências, energias limpas, física de altas energias, engenharias, tecnologias da informação, matemática e humanidades em geral.

Que tipo de parceria poderá ser feita com o setor privado?

Pretendemos estimular startups, parques tecnológicos e núcleos de inovação tecnológica nas instituições de ensino e pesquisa. Planejamos para os próximos meses o estabelecimento de um convênio com a Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii) para aumentar o número de unidades Embrapii com empresas e instituições do Rio de Janeiro. Está no Plano de 100 dias do governo uma ação “iNovaRJ” para estimular as parcerias.

Em que outras áreas a Faperj atuará?

No fomento de projetos de divulgação científica e na melhoria do ensino de ciências e matemática no Ciclo Básico (ensinos Fundamental e Médio), principalmente estimulando uso de laboratórios e experimentos “mão na massa” pelos alunos.