Críticas à fusão do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação com o das Comunicações, aos preocupantes cortes de recursos da ciência e a defesa do desenvolvimento sustentável marcaram a noite de abertura da 68ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência. Neste ano, o maior evento de divulgação científica da América Latina aconteceu na recém-inaugurada Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB), em Porto Seguro (BA), de 3 a 9 de julho.

Com o tema “Sustentabilidade, tecnologias e integração social”, o tradicional encontro teve, em sua abertura que reuniu cerca de 1.500 pessoas em um auditório lotado, a apresentação do coral da Prefeitura de Porto Seguro, cantando músicas populares. A UFSB é a mais jovem universidade federal, que completa agora dois anos de atividade, e a escolha do local como palco da Reunião Anual foi bastante aplaudida. A abertura também foi marcada por muitos protestos em relação ao momento político brasileiro atual.
O evento desse ano conta com mais de 5 mil inscritos oficiais, 487 palestrantes, 400 monitores e 107 constituintes da comissão local. A reunião é aberta a todos, portanto, espera-se um público de 10 mil participantes.

Compuseram a mesa a presidente da SBPC, a Acadêmica Helena Nader; o presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Luiz Davidovich; o ministro da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), Gilberto Kassab; o secretário executivo do MCTIC, Elton Zaccarias; o secretário de Políticas e Programas de Pesquisa e Desenvolvimento do MCTIC, o Acadêmico Jailson de Andrade; a secretária executiva do Ministério da Integração Nacional, Emilia Curi; a prefeita de Porto Seguro, Cláudia Oliveira; o secretário de Ciência, Tecnologia e Inovação do Estado da Bahia, Manoel Mendonça; o reitor da UFSB, Naomar de Almeida Filho; o presidente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), o Acadêmico Hernan Chaimovich; o presidente da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), Abílio Baeta Neves; o presidente da o presidente da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), o Acadêmico Wanderley de Souza; o diretor-presidente da Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii), o Acadêmico Jorge Guimarães; a cacique Maria das Dores, representando os povos indígenas da região; a presidente da Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG), Tamara Naiz; entre outras autoridades.
Claudia dAvila, secretária geral da SBPC, anunciou que será realizado, durante a 68ª Reunião Anual, um ato público em defesa da ciência e tecnologia, no dia 6 de julho. “Defendemos a manutenção do MCTI sem a sua fusão”, esclareceu, “e exigimos o retorno dos financiamentos dos programas de CT&I”. Ela também informou que a Reunião Anual de 2015 resultou na publicação de um livro, intitulado “Luz, ciência e muita ação: as histórias da 67ª Reunião Anual da SBPC em São Carlos”.


Helena Nader disse estar alegre por chegar a Porto Seguro para realizar a 68ª Reunião Anual da SBPC, mas que esta alegria não excluía a necessária visão crítica sobre o que acontece no Brasil e no mundo. “O ano que se passou desde a ultima reunião, em são Carlos, foi dramático para a sociedade. Apesar de todos os avanços científicos e tecnológicos e da globalização, que parecia ser a esperança de uma sociedade mais pacífica, interligada e tolerante, o que se vê são conflitos de toda ordem. A saída do Reino Unido é um exemplo de como a sociedade não está disposta a viver na complexidade de um mundo com menos fronteiras.”

A Acadêmica destacou que a 68ª Reunião Anual manteve inovações recentes que fizeram sucesso, como a SBPC Indígena e o Dia da Família, e trouxe outras novidades, como a SBPC Educação, realizada nos dias 1º e 2 de julho na Universidade do Estado da Bahia (Uneb). Além disso, a SBPC Indígena desta edição tem um espaço novo com quatro ocas, uma de 130 metros quadrados, que podem ser visitadas e ficarão como patrimônio da UFSB. Também acontecerá, pela primeira vez, a SBPC Artes, “nesta cidade que respira arte”, afirmou Helena.
Luta por recursos para CT&I
A presidente da SBPC ressaltou que o financiamento para a ciência, tecnologia e inovação permanence como uma das grandes preocupações da SBPC. “A luta continua pela reposição do orçamento pelo menos aos níveis de 2013, já que não podemos pensar em um estado soberano sem CT&I. Hoje, nosso orçamento é quase 50% do anterior, é inviável. Continuamos formando doutores, expandindo universidades e institutos e o orçamento vem decaindo.”
Helena Nader também celebrou algumas conquistas, como o Marco Legal de CT&I, sancionado como lei federal no dia 11 de janeiro, após intenso trabalho da SBPC, ABC e várias instituições. Ela comentou outras pautas em que a Sociedade atua e enfatizou que a SBPC é “frontalmente contra todos os projetos que direta ou indiretamente preconizam a interferência do Estado na sala de aula, com teorias absurdas como o criacionismo.” Também disse ser contra a PEC que foi anunciada pelo governo interino que altera os mínimos constitucionais para as pastas da saúde e da educação. “Além disso, continuaremos na luta pela volta do MCTI”, concluiu Helena, que foi aclamada.


A prefeita de Porto Seguro, Cláudia Oliveira, afirmou que a Reunião Anual da SBPC é um momento histórico para a cidade e um marco importante para a Bahia. “Esse mega evento mostra uma potencialidade da terra mãe do Brasil. A terra onde o país começou não possuía uma universidade federal, e o governador da Bahia, Rui Costa, concedeu as instalações para a implantação da UFSB. A valorização de um povo começa pela educação e hoje estamos mostrando que Porto Seguro também promove a área educativa. Tenho certeza de que a Reunião Anual deixará um legado muito especial para a nossa gente.”
A cacique Maria das Dores agradeceu o convite e pediu a todos que aproveitem o evento. “Como nós, indígenas, não somos diferentes, vamos aproveitar e participar de cada momento desta semana.” A presidente da ANPG, Tamara Naiz, comemorou os 30 anos da Associação, e se posicionou contra a fusão dos Ministérios. Ela defendeu, ainda, a educação pública, gratuita e de qualidade, a manutenção das bolsas de estudo e pesquisa e afirmou que é necessário que o Brasil siga mudando com democracia.

O presidente da ABC, Luiz Davidovich, afirmou que o projeto da UFSB realiza sonhos da Academia que, em 2004, publicou um documento sobre a reforma da educação superior, que defendia universidades interdisciplinares, a ideia de ciclos de formação e a participação maciça dos estudantes. Não por acaso, Naomar Filho faz parte de um grupo de estudos da ABC sobre universidades. Ele também lembrou que a ABC e a SBPC estão juntas na luta em defesa da ciência, tecnologia e inovação no Brasil. “A situação das universidades estaduais, por exemplo, que estão sem recursos, claramente denota uma prioridade que não vai levar o Brasil para um futuro de desenvolvimento sustentável.”
Davidovich demonstrou preocupação com o estado atual da ciência. “Documentos como Ponte para o Futuro [plano do governo interino], no qual se encontra somente uma vez a palavra ciência, mostra a batalha que temos que travar para que a ciência esteja nos corações e mentes de todos. Uma ponte para o futuro que não é baseada em ciência e tecnologia cai na primeira ressaca”, comparou o físico, que foi exaltado pelo público.

O ministro do MCTIC, Gilberto Kassab, comentou que a SBPC dá um exemplo de protagonismo ao promover os pilares do desenvolvimento de CT&I. Ele informou que, ao longo das últimas semanas, esteve com os principais líderes da ciência do país e identificou suas aspirações e desafios. “As bandeiras que têm sido colocadas pela SBPC nos últimos tempos contam com todo o nosso apoio. Precisamos recuperar essa queda acentuada de recursos para a ciência, tecnologia e educação dos últimos anos.”