Combatendo as assimetrias regionais no Brasil

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Cearense orgulhoso de suas origens, Pedro Marcos Soares vê nos belos litorais do Nordeste brasileiro um convite diário. Apaixonado por filmes, ele vai ao cinema sempre que pode – isto é, sempre que seus filhos deixam – e se interessa muito por política, história, MPB e forró. Em suas horas de trabalho, que são muitas, atua como professor adjunto da Universidade Federal do Ceará (UFC). Há algum tempo tornou-se também pesquisador do Instituto de Biomedicina do Semiárido Brasileiro (IBISAB), na área de inflamação gastrintestinal.

Neste ano, titulou-se membro afiliado da ABC até 2018. A indicação é um reconhecimento a seu empenho na carreira que escolheu. Mas, afinal, como Pedro chegou à pesquisa científica?

De acordo com ele, sua infância foi um período de muita alegria. À época, ainda se brincava na rua e muitos dos jogos que ocupavam suas tardes hoje são desconhecidos pelas crianças, tão entretidas pela tecnologia. A família de três filhos é muito próxima e são comuns os almoços de final de semana, cujos protagonistas agora são os netos. Orgulhoso, Soares conta que seu pai veio do interior do Ceará e conviveu com as dificuldades da seca nordestina. Mesmo assim, superou as adversidades e tornou-se padre, exercendo o sacerdócio por 20 anos, até conhecer sua futura mulher. Mas encontrar outra ocupação não foi difícil. Após uma sólida formação nos tempos do seminário, passou a lecionar em escolas públicas. “Ele nos mostrou que a educação é a maior herança que podemos deixar”, recorda.

O incentivo deu certo. Pedro estudou em dois bons colégios católicos, o São Vicente e o Marista. No ensino fundamental, sua matéria predileta era a matemática, porém apaixonou-se pela biologia e pela química ao ingressar no ensino médio. Participou, inclusive, de algumas Olimpíadas Brasileiras de Biologia. Nessa etapa de sua vida, a ciência começou a parecer interessante; ao ler os livros didáticos, lhe chamavam a atenção cientistas como Pasteur, Fleming e Chagas. Foi então que decidiu cursar medicina, mas, após alguns vestibulares sem sucesso, optou pela nutrição e começou a estudar, ainda com 16 anos de idade, na Universidade Estadual do Ceará (UECE).

“Na UECE, tive a experiência mais transformadora da minha carreira”, conta Pedro, referindo-se à iniciação científica. Segundo o Acadêmico, foi depois dela que resolveu seguir a área da pesquisa. E esse divisor de águas se deu ainda no segundo semestre da graduação, quando ingressou no Laboratório de Bioquímica e passou a desenvolver trabalhos de isolamento e purificação de proteínas. Dois anos mais tarde, passou ao Laboratório de Farmacologia dos Canais Iônicos, onde trabalhou com animais de laboratório para estudar aspectos fisiológicos e farmacológicos do músculo liso. Lá, em suas próprias palavras, conheceu seus melhores amigos de bancada e também suas maiores referências na área: os professores David Neil Criddle e Ana Maria Sampaio Assreuy.

Após graduar-se, Soares emendou os estudos em um mestrado em ciências fisiológicas, também pela UECE. Tendo Criddle no papel de seu orientador, pesquisou a atividade contrátil muscular lisa e a atuação dos produtos naturais. Em seguida rumou ao doutorado, dessa vez na área de farmacologia da Universidade Federal do Ceará. Neste período, sob forte influência dos professores Ronaldo Ribeiro e Marcellus Souza, ele consolidou sua linha de pesquisas em inflamação do trato gastrintestinal e dismotilidade [função intestinal alterada]. Mesmo um ano depois da defesa de sua tese, Pedro ainda trabalhava no Laboratório de Farmacologia da Inflamação e do Câncer como pós-doutor. Foi lá que recebeu a notícia de ter sido aprovado para o concurso de professor da Faculdade de Medicina da UFC.

Até hoje, seu trabalho é no Departamento de Morfologia. Durante esse tempo, seu maior orgulho é ter colocado em prática, junto a outros professores, um doutorado interinstitucional (Dinter) com a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). “Isso nos qualificou para criarmos o primeiro Programa de Pós Graduação em Ciência Morfofuncional da UFC aprovado e recomendado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, a Capes”, explica. O esforço para concretizar esses planos fez com que os caminhos de Pedro e do Acadêmico Vivaldo Moura Neto se cruzassem. “Ele é um grande amigo e um exemplo de pesquisador, a quem deixo minha gratidão pelos ricos aprendizados advindos de tantos momentos de convivência”, credita.

Ele se diz honrado pelo título de membro afiliado da ABC e sente que essa é uma importante forma de reconhecimento à pesquisa feita no Ceará. “Isso mostra que, com seriedade, somos sempre capazes e é possível produzir bons resultados experimentais mesmo estando em um estado pobre”, alegra-se. Soares também não deixa de mensurar a responsabilidade que vem junto com o título. Uma das intenções do pesquisador para o período que vai até 2018 é contribuir com a equidade na ciência, buscando divulgá-la nas regiões mais carentes do país e, assim, mostrar que todos podem ser cientistas. Em sua visão, diminuir as assimetrias regionais ainda persistentes é a chave para um Brasil melhor. Feliz por ter encontrado sua verdadeira vocação, o professor enxerga a ciência não só como uma motivação, mas como a possibilidade de ir ao encontro do desconhecido.