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O Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) foi palco da diplomação dos cinco novos cientistas da região Norte que integrarão a Academia Brasileira de Ciências (ABC) pelos próximos cinco anos (2017-2021). O presidente da Academia, Luiz Davidovich, saudou os jovens Acadêmicos com um convite: integrar o time de defesa da ciência e tecnologia no país. “Contamos com vocês para defender as lutas da ciência junto com a Academia e empunhar essa bandeira em favor dela”, declarou o presidente. Ele ressaltou ainda a diversidade de áreas de pesquisa e origens regionais que compunham o grupo, fazendo uma reflexão sobre a educação no Brasil. “Hoje, o que vemos aqui mostra que tem muita coisa boa sendo feita no Brasil e muitos jovens de talento. Imaginem se multiplicássemos isto por 100, quantos mais mentes brilhantes teríamos. Eu sou físico, mas a minha paixão é pela ciência e ver os trabalhos desses jovens me emociona e faz acreditar na ciência do país, apesar de toda a situação que estamos enfrentando”, acrescentou.
O diretor do Inpa, Luiz Renato de França, reforçou a necessidade dos jovens cientistas se somarem à defesa da ciência e destacou o momento duro que a comunidade tem sofrido no país. “Vejo os jovens afiliados como as células tronco de um organismo, que tem a função de se replicar e fazer a diferenciação. O Brasil nunca deslancha nesse sentido, a ciência nunca é posta como uma prioridade de fato e é papel também dos jovens levantarem essa bandeira”, disse ele.

O vice-presidente da Regional Norte, Roberto Dall’Agnol, também ressaltou a importância de se ter um grupo jovem integrando o time da ABC e destacou: “Os cientistas jovens trazem um viço para a Academia, que é muito importante”.

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Após a abertura, o presidente da ABC, Luiz Davidovich, falou sobre a evolução e o valor da ciência no país e o o diretor do Instituto Evandro Chagas e Acadêmico Pedro Vasconcelos proferiu conferência sobre as arboviroses emergentes no Brasil.

A Academia Brasileira de Ciências e a pesquisa no Brasil
dsc04690.jpg Davidovich explicou que o investimento em educação começou tarde no país. A primeira universidade brasileira, a Universidade Federal do Amazonas (Ufam), foi criada em 1909. Início tardio, se comparado com o da Universidade de Bolonha, fundada em 1088. “Foi graças à Napoleão que o país ganhou os primeiros livros e universidades. Isso só aconteceu depois da invasão de Portugal, quando a família real veio para o Brasil”, esclareceu o físico.
A Academia Brasileira de Ciências entrou nessa história em 1916. Em sua sede foi fundada e hospedada a Rádio Sociedade, pelos Acadêmicos Henrique Morize e Roquette-Pinto, dedicada à ciência e cultura. Por suas salas passaram ainda presenças ilustres como o físico Albert Einstein, que explicou aos Acadêmicos sua teoria sobre a constituição da luz.

Atualmente, os Acadêmicos vêm produzindo documentos com propostas para políticas públicas baseadas em ciência. Um deles, sobre a reforma do ensino superior, teve grande repercussão e suas propostas de modelo para o ensino superio estimulou a criação da Universidade Federal do ABC (UFABC) e da Universidade Federal do Sul da da Bahia (UFSB). “Nós gostaríamos que ele tivesse sido mais influente em universidades mais antigas, que já existem, e cujos sistemas são difíceis de mudar”, pontuou Davidovich.

Dentre estes projetos da Academia, o presidente destacou o Projeto de Ciência para o Brasil. Iniciado em 2016, ele reúne cerca de 180 cientistas em grupos interdisciplinares para criar documentos integrados com sugestões de políticas públicas para diferentes áreas. “O intuito é criar um documento acessível para enviar aos políticos. Principalmente, os que irão se eleger em 2018”, explicou o presidente.

Para Davidovich, os impactos da atual crise econômica no setor científico são reflexo de uma má gestão. “O governo vai pela lógica do padeiro, de cortar gastos na crise, mas os países desenvolvidos estão fazendo o oposto, investindo na ciência nestes momentos”, salientou. O físico lembrou das crises sofridas pela China, Índia e Rússia, durante as quais os gestores aumentaram a verba da ciência, quase que como uma consequência das dificuldades enfrentadas. Ele mostrou ainda como, em sete anos (de 2010 a 2017), o orçamento brasileiro para ciência foi reduzido quase que pela metade e os Ministérios de Ciência e Tecnologia e o das Comunicações foram unificados.

Davidovich contou que um estudo feito pela União Europeia, em 2015, mostrou que o retorno monetário da ciência é de 3 a 8 vezes o valor inicial investido e que 75% das inovações não poderiam ter sido feitas sem pesquisa pública. Um dos grandes exemplos brasileiros destes dados é a engenheira agrônoma e Acadêmica Johanna Döbereiner. “A pesquisa produzida por ela sobre inserção de bactérias para aumentar a produção de soja é responsável por uma economia de 15 bilhões de reais/ano na produção de soja do Brasil. Vejo a Johanna como uma heroína para o país”, apontou. Enquanto isso, lembrou Davidovich, a área da agricultura, base da economia brasileira, é, hoje, a que mais perde cientistas para outros países.

O físico lembrou também que a China está comprando terras africanas e que a África conhece a tecnologia brasileira de produção de soja. Além disso, no Vale do Silício, já existem estudos para fabricar carne bovina em laboratório, de forma mais econômica que a tradicional. “Tudo isso mostra que estamos andando para trás e não podemos. A agricultura e pecuária brasileira precisam andar no ritmo dos outros países para ter protagonismo nesse novo mundo que se anuncia”, defendeu.

Ele reforçou ainda que a educação brasileira não contempla um grande número de jovens e que o ensino fundamental é o que mais recebe investimento em países como China e Coreia do Sul. “Estamos desperdiçando milhares de cérebros, o que além de injusto é uma burrice. São pessoas que poderiam dar contribuições brilhantes para o sistema nacional e que são ignoradas’, acentuou.

Para ele, o país tem capacidade de produzir um grande volume de conhecimento, mas tem seu potencial sabotado por uma gestão negligente. “No nosso país, é possível fazer pesquisa de qualidade e que traz retorno para a sociedade brasileira, mas se continuarmos descansando, ficaremos cada vez mais atrás no mercado”, arrematou.

Confira aqui os perfis dos novos membros da ABC na regional Norte:
Amante de répteis e anfíbios
Pesquisadora do Inpa e uma das sete vencedoras do prêmio ABC-L’Oréal-Unesco “Para Mulheres na Ciência” 2016, a bióloga Fernanda de Pinho Werneck sempre teve grande afinidade pelo estudo da natureza. Mas foi numa pesquisa de campo na floresta amazônica e no cerrado que ela encontrou a sua paixão: a herpetologia.
Na matemática, a saída para uma vida melhor
Do balcão da sorveteria da família para o Exército brasileiro, até o pós-doutorado nos Estados Unidos. Dedicação e perseverança conduziram José Nazareno Vieira Gomes para a pesquisa em geometria diferencial.
Cultivando café, colhendo conhecimento
Por entre as lavouras da família no Paraná e depois em Mato Grosso, José Júlio de Toledo viu nascer o interesse pelo estudo das plantas e animais. Biólogo de formação, especializado em ecologia, ele hoje pesquisa e leciona na Unifap.
Ciência e tradição amazônica juntas
Professora da UFPA, a química Joyce Kelly do Rosário da Silva pesquisa as plantas aromáticas e seus óleos essenciais, um conhecimento transmitido por gerações e que está no dia a dia dos moradores da Região Amazônica.
Combatendo as doenças negligenciadas
O bioquímico Wuelton Monteiro é pesquisador da Universidade Estadual do Amazonas. Ele estuda doenças negligenciadas, como a malária, e atua em acidentes com animais peçonhentos.