Experiências brasileiras inovadoras na formação técnica no ensino médio podem servir de inspiração para outras iniciativas e contribuir para uma melhoria na qualidade da educação no país. Essa foi a pauta da quarta sessão do “Simpósio Internacional Desafios da Educação Técnico-Científica no Ensino Médio”, que aconteceu nos dias 30 de novembro e 1º de dezembro, na sede da Academia Brasileira de Ciências (ABC), no Rio de Janeiro.

O Centro Paula Souza

Uma dessas experiências foi apresentada pelo coordenador de Ensino Médio e Técnico do Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza, Almério Melquíades de Araújo. A instituição do Governo do Estado de São Paulo administra 219 Escolas Técnicas Estaduais (Etecs) e 65 Faculdades de Tecnologia (Fatecs), reunindo mais de 283 mil alunos em cursos técnicos de nível médio e superiores tecnológicos, alcançando mais de 300 municípios.

Segundo Araújo, o Centro teve a preocupação de elaborar uma construção curricular que garantisse que a formação teórica e prática acontecesse de uma forma mais integrada.

“Nosso currículo buscou uma articulação do ensino técnico com o médio, com base em uma educação continuada de professores, avaliação interna e supervisão pedagógica”, explicou. A articulação teve o objetivo de resolver um dilema que, segundo Araújo, é característico da educação brasileira: a separação dos ensinos médio e técnico em duas escolas diferentes. “Fazer cada ensino em duas escolas é meio jabuticaba [fruta que só dá no Brasil], e fazer uma depois outra também é.”

O currículo, informou Araújo, foi pensado de modo a costurar as competências da base nacional comum com competências profissionais. No caso do curso técnico em eletroeletrônica integrado ao ensino médio, por exemplo, o aluno estuda temas como matemática, física e circuitos elétricos, mas também empreendedorismo, sociologia e língua estrangeira. Ao final da terceira série, ele tem habilitação profissional de técnico em eletroeletrônica.

Educação + inovação: a experiência do Senai

Felipe Morgado, gerente executivo de Educação Profissional do Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial), um dos mais importantes polos nacionais de geração e difusão de conhecimento aplicado ao desenvolvimento industrial, falou sobre a relação entre educação e inovação.

Segundo o palestrante, a indústria brasileira vem perdendo participação no PIB: o Brasil caiu 18 posições no ranking de competitividade de 2014 para 2015 – é o 75º entre 140 países e o pior entre os BRICS. No mesmo período, também caiu nove posições no ranking de inovação. “Tudo isso está relacionado a inovação e a produtividade”, afirmou Morgado. “A produtividade do Brasil, em 2011, era a mesma que a da Coreia do Sul em 1983, um quinto da dos Estados Unidos e um quarto da alemã.”

Segundo o representante do Senai, os empresários brasileiros apontam a educação como principal fator para a competitividade. “A educação e a formação das pessoas é a mola propulsora da inovação. É importante incorporar uma cultura de inovação na formação dos alunos. E, para isso, é preciso trabalhar currículo, metodologia e formação de professores, com um diálogo entre governo, indústria e academia.” Morgado apontou, também, a necessidade de se intensificar o uso de metodologias com base em competências focadas no desenvolvimento de projetos, pesquisas aplicadas e resolução de problemas.

Segundo Morgado, o Senai atua, desde 2002, na expansão da educação profissional com qualidade. “Uma estratégia do Sistema Indústria foi a articulação da educação básica do Sesi [Serviço Social da Indústria] com a educação profissional do Senai-Ebep [educação básica e profissional].” Ele informou, ainda, que, desde 2010, o Senai vem avançando na ampliação do número de matrículas que, atualmente, são quase 4 milhões. A oferta aumentou em quase 100%.

Morgado também falou sobre a Rede Sesi – oficinas tecnológicas na área de eletrônica, eletromecânica etc, com uma metodologia repensada. “O aluno faz opção por oficinas tecnológicas ou projetos de aprendizagem e de ciências aplicadas (física, química, biologia e matemática).” Além disso, a Metodologia Senai de Educação Profissional define quais são as competências essenciais que devem ser avaliadas no final do curso.

Os desafios do MEC

Nilva Schroeder, da Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica do Ministério da Educação (Setec/MEC), destacou que, nos últimos anos, vivemos um processo de expansão da educação profissional tecnológica e da formação continuada. “Com o Pronatec [Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego], lançado em 2011, iniciamos um esforço de articulação das diferentes iniciativas, estruturando as políticas de educação profissional e tecnológica.”

Segundo Nilva, o Pronatec envolveu 15 Ministérios e teve como um dos resultados oito milhões de matrículas realizadas entre 2011 e 2014. Há oferta de cursos em 77% dos municípios brasileiros, 220 cursos técnicos com no mínimo 800 horas, para quem concluiu ou está cursando o ensino médio, além de 600 cursos de qualificação profissional, de no mínimo 160 horas. “Estas são as portas de entrada para muitas pessoas, o retorno para a escola daquelas pessoas que não acreditavam que era possível. Agora o desafio é como assegurar que elas tenham continuidade.”

A dificuldade maior é em relação aos jovens: 24,3% da população está entre 15 e 29 anos. Nilva apontou que é crescente a relação dos jovens com o trabalho, informando que 67,5% dos que estão na faixa de 25 a 29 anos têm uma ocupação. “Em 2013, 63% dos jovens estavam inseridos no mercado de trabalho – procurando emprego, trabalhando ou vivendo a experiência do desemprego. Mas os jovens têm muita dificuldade de conseguir o primeiro emprego. A rotatividade é muito grande e a qualidade e a estabilidade de emprego também são problemas.”

Diante disso, o Plano Nacional de Educação (PNE) traz de forma explícita duas metas sobre a educação profissional e tecnológica (veja abaixo). Atualmente, 77 milhões de pessoas não concluíram a educação básica e estão fora da escola. Além disso, em 2013, o país tinha apenas 1.6 milhões de matrículas nos cursos técnicos, número que espera-se triplicar até 2024. Os desafios, são, portanto, variados. “Com uma formação técnica de qualidade, o cidadão tem toda condição de uma inserção socioprofissional”, ressaltou Nilva. “A formação profissional técnica pode ser, sim, uma boa escolha para o jovem.”