Reestruturar as universidades brasileiras implica em reformá-las de fora para dentro; caso contrário, as mudanças continuarão sendo apenas incrementais. Essa é a visão do Acadêmico José Fernando Perez, diretor presidente da Recepta Biopharma, empresa de biotecnologia que desenvolve novos fármacos para o tratamento do câncer. Ele participou do Simpósio Internacional sobre Excelência no Ensino Superior, realizado no final de setembro, na Academia Brasileira de Ciências (ABC).

”A governança nas universidades é estabilizadora do status quo. Não temos uma meritocracia, e sim uma ‘mediocracia’”, atacou Perez, que apresentou a visão do setor empresarial sobre o ensino superior brasileiro. A Recepta Biopharma é um exemplo bem-sucedido de companhia que conjuga a atividade produtiva à pesquisa e inovação realizada nas universidades e institutos. A empresa tem parcerias com a Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), o Instituto Butantan, a Escola de Administração do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), o Instituto Ludwig de Pesquisa sobre o Câncer (LICR), dos EUA, entre outros.

Esse tipo de integração, conforme é apontado por muitos especialistas, é crucial para o desenvolvimento dos dois lados – academia e indústria. No caso da Recepta Biopharma, o trabalho em conjunto já possibilitou importantes conquistas. Ela é, por exemplo, a primeira empresa brasileira a realizar testes clínicos de Fase II com anticorpos monoclonais para tratamento do câncer com registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e no Food and Drug Administration (FDA). Por isso, foi escolhida como empresa parceira do Ministério da Saúde e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) na Rede de Pesquisa Clínica Oncológica, para a realização de teste clínico com seu anticorpo monoclonal RebmAb 100 em pacientes com câncer de mama.

 

Incentivo à cultura do risco

Na visão de Perez, que atuou por 12 anos na Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), o ambiente acadêmico precisa de mais incentivo à ousadia, e as agências de fomento devem fazer parte disso. ”Não há estímulo para que sejam assumidos riscos. Os projetos apresentados são aqueles em que se tem certeza de que vão dar certo antes de serem iniciados. As agências reprovam projetos que têm risco de dar errado.” Segundo o Acadêmico, sem esse estímulo, continuaremos com uma produção científica de baixo impacto mundial. ”Nosso sistema não só não estimula, como reprime a ousadia”, afirmou.

Perez também apontou a necessidade de um novo modelo de governança que crie uma responsabilidade efetiva, e citou exemplos como o Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada (Impa) e o Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (Cnpem): ”Eles têm conselhos cujos membros respondem com seus próprios bens. Na USP, o reitor gasta 106% do orçamento e ninguém responde por isso”. O palestrante também sugeriu que as escolhas para os cargos sejam externas – que o reitor da universidade não seja necessariamente professor desta, por exemplo. ”Essas decisões se dão por processos eleitorais, que acabam gerando compromisso, mas não com a excelência”, provocou.

 

Buscando exemplos no setor empresário

Para o diretor do Instituto Tecnológico Vale (ITV), Luiz Eugênio Mello, o comprometimento é um dos fatores essenciais para uma universidade de excelência, e o mundo empresarial pode dar o exemplo nesse sentido. Ele afirmou que, na Vale – uma das três maiores mineradoras do mundo e a maior empresa de logística do Brasil -, os funcionários conhecem os objetivos e valores da companhia. ”É importante definir um horizonte comum que todos compartilham e entendem. Se você perguntar para professores a missão de suas universidades, poucos vão saber de cor.”

Com o objetivo de promover o desenvolvimento e a divulgação da pesquisa científica e tecnológica, o ITV também é um bom exemplo de cooperação entre academia e indústria. Entre suas atividades, incluem-se workshops sobre temas como desenvolvimento sustentável e mineração, que reúnem pesquisadores do mundo todo.

Já o superintendente de Pesquisa e Desenvolvimento Tecnológico da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), Elias Ramos de Souza, acrescentou que esse é o momento de introduzir tecnologias continuamente para otimizar projetos e ampliar os retornos, tanto para as empresas quanto para a sociedade.

”O Brasil é um protagonista na exploração e produção de petróleo, e a descoberta do pré-sal reforçou essa vocação. Este é um excelente ambiente para o desenvolvimento”, destacou Souza, enfatizando que os investimentos em pesquisa e desenvolvimento (P&D) e a colaboração entre empresas e universidades devem oferecer soluções tanto para baixo e alto risco quanto para demandas tecnológicas de curto e longo prazo.