Na abertura do Simpósio Internacional sobre Excelência no Ensino Superior, realizado na Academia Brasileira de Ciências entre os dias 22 e 24 de setembro, o Acadêmico Jorge Guimarães tratou de aspectos que considera de primeira importância para atingirmos a excelência na educação superior. Analisando as universidades de classe mundial, Guimarães observou que muitas das melhores do mundo são pequenas e médias, comparadas com as nossas. ”Elas dispõem de autonomia e governança. Tem um sistema robusto, tanto na graduação como na pós-graduação, com muito menos horas em sala de aula e com foco principalmente na pesquisa básica e aplicada”, apontou o presidente da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).

Além de autonomia e governança, Guimarães apontou um terceiro componente fundamental para se alcançar a excelência nas universidades – ”accountability”. Segundo o Acadêmico, nenhum órgão brasileiro tem ”accountability”, que seria a capacidade de responder pelos seus atos, sem interferência externa. No Brasil, as ações das universidades são supervisionadas por órgãos como o Tribunal de Contas da União (TCU), a Controladoria Geral da União (CGU) e o Ministério Publico. ”A UERJ e a UFRJ estão passando por problemas sérios. Não há um reitor que não tenha um processo nas costas por coisas como instalar um poste numa região perigosa do campus sem licitação, em função da urgência do problema. Supervisionar e monitorar é uma coisa, já interferir na gestão é outra muito diferente.” Para o presidente da Capes, no Brasil não existe a cultura do planejamento de médio e longo prazo, que é necessário para tudo. ”As universidades federais não tem autonomia para fazer um planejamento mais longo, especialmente importante na educação, ciência e tecnologia.” Guimarães aponta que mesmo que se consiga a autonomia e a governança, é mais difícil se conseguir a ”accountability”.

Segundo a Wikipedia, ”accountability” é um conceito da esfera ética com significados variados. Frequentemente é usado em circunstâncias que denotam responsabilidade civil, imputabilidade, obrigações e prestação de contas. Na administração, a ”accountability” é considerada um aspecto central da governança, tanto na esfera pública como na privada, como a controladoria ou contabilidade de custos. O fato de não termos uma tradução literal é um sintoma de que nossa cultura não tem um conceito similar.

Guimarães alerta que a excelência passa pela internacionalização e por outros processos formativos fora de sala de aula. ”Temos que oferecer cursos em inglês e em outras línguas. As universidades têm diversos acordos internacionais, que são pouco executados por falta de cultura e recursos específicos. O programa Ciência sem Fronteiras contribui para solucionar o problema, ao prover financiamento para a mobilidade dos estudantes. Temos que trazer estudantes estrangeiros. Precisamos oferecer moradia nos campi, como nossos estudantes que vão pra fora e moram nas universidades, onde têm contato com outros estudantes do mundo inteiro”, ressaltou. Ele apontou ainda que o Brasil é dos países que menos tem colaborações internacionais em artigos científicos, o que mantém baixo o índice de impacto das nossas publicações. Esse é um dos pontos que precisa ser trabalhado para que o Brasil, que está hoje em 13º lugar no ranking mundial de produção científica, chegue em 2024 entre os dez primeiros lugares. ”Para isso teremos que ultrapassar Índia, Austrália e Coreia, ou seja, não será fácil”, alertou Guimarães.

 

Excelência setorizada na pós-graduação

Segundo seu presidente, a Capes está propondo dois programas para ajudar na internacionalização. Um deles envolve identificar e fomentar os cursos de pós-graduação das universidades brasileiras para ver quais podem atingir mais rapidamente o padrão internacional de excelência, possibilitando às suas universidades uma internacionalização setorizada e crescentemente abrangente. Nesse sentido, ele apresentou o ranking da Capes e o comparou ao ranking da Folha de São Paulo. ”As 20 universidades listadas são as mesmas, o que difere em alguns casos é uma pequena e eventual discrepância na ordem de classificação”, explicou, acrescentando que a produção científica dessas instituições corresponde a 70% da produção científica total do país.

No ranking da Capes, dos 3.793 programas de pós-graduação avaliados, 415 ganharam notas seis ou sete – as notas mais altas – na última avaliação. Dentre as universidades, as cinco primeiras colocadas – USP, UFRJ, Unicamp, UFRGS e UFMG – têm entre 32 e 50% dos cursos de pós-graduação avaliados com notas seis e sete. Esses cursos são a referência para a internacionalização setorizada da universidade. Guimarães destaca que, segundo seus dirigentes, o investimento a ser feito para que alcancem a excelência deve ocorrer principalmente em termos de mais flexibilidade de recursos e mais flexibilidade para trazer pesquisadores de fora. ”A USP
Universidade de São Paulo], primeira colocada, tem mais da metade dos seus cursos de pós-graduação nessa condição de alto nível. As 15 instituições seguintes tem em torno de 20% de cursos que podem ser estimulados para alcançar o nível desejado”, observou Guimarães.

 

Aproveitamento das experiências dos alunos do CsF

A segunda proposta da Capes visando contribuir para a internacionalização envolve utilizar a experiência do programa Ciência sem Fronteiras (CsF), criado para incentivar a mobilidade internacional de estudantes nas diferentes áreas de ciência, tecnologia e inovação. De acordo com Guimarães, a continuidade do programa certamente passará por alguns ajustes.

O programa teve início em 2011, com 3.837 bolsas. Até 2014, totalizou a oferta de 86.100 bolsas, sendo 67.096 de graduação-sanduíche. O foco de maior concentração de bolsas é a engenharia e outras áreas tecnológicas, com 25.460 bolsas oferecidas. As ciências da saúde e biomédicas vêm em segundo lugar, com 11.049 estudantes encaminhados. A maior concentração de alunos está nos Estados Unidos, com 17.152 bolsistas, seguido de longe pelo Canadá, com 5.217. As universidades parceiras são do mais alto nível, tanto nos EUA como nos outros países, assim como as empresas que oferecem estágios para os estudantes do CsF.

Guimarães destacou que as universidades devem se envolver mais no processo do CsF, que até então vem sendo conduzido mais pelas agências. ”O melhor de tudo é que os jovens estão voltando e querendo implantar nas suas instituições de origem o que viram de bom lá fora, como a redução das horas aula e o aumento de tempo para estudo individual e pesquisa.

O presidente da Capes insistiu que as universidades precisam aproveitar mais as informações dos estudantes que voltam do CsF. ”Os jovens estão fazendo blogs contando suas experiências, o que eles viram lá fora, apontando caminhos para mudanças e em que sentido elas devem ocorrer. Isso deve ser acompanhado de perto, pois é informação preciosa, financiada com dinheiro público”, concluiu Guimarães.

 

Veja alguns blogs relacionados ao programa:

 

Um ano na terra da rainha

Como o Ciência sem Fronteiras mudou a minha vida

Vivendo na Califórnia

Clovis no Canadá

Um Lugar chamado Chapel Hill