Leiam artigo que o Acadêmico Sérgio Mascarenhas, coordenador do Instituto de Estudos Avançados da USP de São Carlos, enviou para as Notícias da ABC em 13/10:

O século XX trouxe grandes revoluções na ciência, na tecnologia e também na cultura, para a humanidade em geral. Mas, sobretudo, preparou as outras grandes revoluções que explodiram logo no começo do séc.XXI, uma das quais estamos vivendo plenamente agora: a globalização do conhecimento, a democratização, embora imperfeita, das comunicações entre os seis bilhões de seres humanos que habitam o planeta Terra. Pensem que, só no Brasil, temos milhões de celulares, computadores e TVs. Claro que há lixo misturado com coisas lindas, como o mar azul que permanece depois que a multidão de banhistas deixa a praia suja. Mas se verdadeiramente amamos o belo, sozinhos na praia, no meio do lixo, miramos o mar e guardamos aquele momento de pura beleza. E começamos a pensar e a ligar os pontos do passado, como cansou de dizer Steve Jobs, para entender o presente e imaginar o futuro. Outro grande pensador e cientista do século XX, C.P.Snow, viu o futuro no que chamou a Terceira Cultura. Ele começou por descrever o presente, que chamou das Duas Culturas, separadas, distantes e às vezes até conflitantes. Essa duas culturas eram a ciência e tecnologia de um lado e as humanidades e artes do outro lado .

Depois, Snow sonhou com um futuro, no qual as duas culturas convergiriam magnificamente para o que chamou a Terceira Cultura: a convergência entre os saberes, a sua inter-fertilização criativa e inovadora: razão e emoção, lógica e intuição, praticidade e serendipitia, ambição e generosidade, todos se completando.

A vida e a morte de Steve Jobs nos ensinam tudo isso: ele foi cientista, tecnólogo embora sem diplomas, mas também artista do design, poeta, filósofo do cotidiano, com suas frases impressionantes já em face da morte iminente: “a morte nos deixa nus”, disse ele, “portanto faça o que o seu coração quer, siga o seu coração, amando o que faz e os outros”. Foi um ser humano que encarnou a Terceira Cultura e enriqueceu a humanidade, permitindo que bilhões usufruíssem da beleza da inovação, espalhando imagens, músicas, textos, e-books e a mágica da comunicação global das redes sociais, da engenharia de sistemas – agora chamada de “sistemas complexos”, cujo melhor exemplo é a própria internet, a web onde navegam as redes sociais, o ensino a distância , como navegaram antes pelos oceanos desconhecidos e aterrorizantes os antigos navegantes, dos gregos aos portugueses, ou no espaço extra-terrestre, como os atuais astronautas.

Mas o que mais nos ensina na sua morte pelo câncer é a bravura da lição que a própria morte lhe deu, aconselhando a vida plena e entusiasmada aos jovens ainda em plena vida. Uma lição de Terceira Cultura no século XXI, sonhada por C.P. Snow no século XX. Como dizia Steve Jobs, “o passado serve para você aprender a ver os pontos se unirem no futuro.”