No ciclo de palestras que aconteceu na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), em homenagem ao Dia do Químico, o Acadêmico Ângelo da Cunha Pinto apresentou a palestra “A química no Brasil – antecedentes e atualidade”, no dia 17 de junho. O evento foi promovido pela Centro Técnico Científico da PUC, organizado pela diretora do Departamento, Ângela Wagner.

Cunha Pinto, do Instituto de Química da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IQ-UFRJ), contou um pouco da história da química em nosso país desde o seu início. Durante, pelo menos, 300 anos, desde a chegada dos portugueses e seu contato inicial com os povos indígenas, a química brasileira girou em torno da fauna e da flora. Datam desta época registros sobre a vinda dos primeiros naturalistas ao país.

“Durante muito tempo a área esteve ligada aos produtos naturais. A Europa já conhecia certos elementos e quando seus navegadores chegaram por aqui, encontraram um povo sem escrita, mas com um vasto conhecimento de plantas da região”, relatou.

Por volta de 1808, com a chegada da família real, o cenário passou por muitas mudanças. “Os navios da corte traziam uma bagagem cultural extensa. Foram criadas as Escolas de Medicina e a Escola Médica e Cirúrgica. Já em 1832 foram criados os primeiros cursos de Farmácia. Ou seja, as principais instituições de ensino apareceram como consequência da evolução da química”, explicou Pinto.

O Acadêmico deu um breve histórico sobre essas instituições, como é o caso do Laboratório Químico Prático, inaugurado em 1812. A intenção com a sua criação era tornar a fabricação de sabão sólido viável no país, pois até então ele vinha da Ilha de São Tomé. “Lá foram feitas as primeiras análises de ópio e aguardente da cana-de-açúcar”, detalhou o Acadêmico, explicando que em 1819 a instituição, que havia entrado em processo de decadência, foi extinta.

Segundo Pinto, assim como as instituições, também surgiram químicos de renome, como Ezequiel Corrêa dos Santos, cujo trabalho científico provocou grande polêmica. “Santos descobriu como isolar o alcalóide, que denominou de pereirina, das cascas do Pau-pereira, uma árvore nativa. Paralelamente, outros pesquisadores trabalhavam com o mesmo material botânico, o que acabou levantando questionamentos sobre o pioneirismo de sua descoberta”, contou o Acadêmico.

Outro “químico” citado por Pinto foi o alemão Theodore Peckolt, um grande farmacêutico nascido em 1822. “Foi um dos cientistas mais importantes que já trabalhou em terras brasileiras. Ele estudou muitas plantas nativas e chegou a fundar uma farmácia em Cantagalo, no Estado do Rio de Janeiro. Seus estudos resultaram em excelentes publicações, sendo, a maioria, em revistas alemãs. Peckolt publicou cerca de 400 trabalhos científicos”, informou.

Em 1918, devido a um artigo escrito por José de Freitas Machado intitulado “Façamos Químicos”, foram oficializados os primeiros cursos de química no país. Nesse artigo, Machado, que era um farmacêutico formado pela Faculdade de Medicina da Bahia, fez um apelo aos poderes públicos para que considerassem a criação de uma escola superior de ensino de química. “Seu artigo foi um marco para a institucionalização do ensino da área no Brasil”, ressaltou o Acadêmico.

Em 1934, foi criado o Instituto de Química Agrícola, que teve sua origem no laboratório de análises do Instituto de Química, criado em 1918 para fiscalizar a manteiga que era produzida no Brasil. Com a nova denominação, o Instituto passou a atuar em outros segmentos, como a química, mineralogia e gênese do solo; biologia do solo e microscopia; alimentação vegetal e agentes corretivos e defensivos da lavoura, conforme relatou Cunha Pinto.

Anos 50 e 60

A década de 50 teve um papel valioso na história da química brasileira. “Já se tinham registros importantes sobre a cromatografia em papel, se dispunha dos espectrômetros de raios ultravioletas, o ponto de fusão misto era uma propriedade física importante, entre outros. Em 1942, com a formação do primeiro doutor – Simão Mathias – pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP, o país começa a se industrializar e a Química avança mais rápido, pois já se sabe que ela é necessária para o desenvolvimento econômico brasileiro”, explicou o Acadêmico.

Em termos de estruturação da pesquisa científica, os anos 50 foram determinantes. Com a criação do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico (então BNDE, atual BNDES), foi estipulado que 40% dos recursos do Fundo Tecnológico (FUNTEC) deveriam ser destinados à criação de cursos de pós-graduação. O objetivo era a formação de mestres e doutores nas áreas de engenharia, química, medicina, entre outras. “O Rio de Janeiro recebeu o maior quinhão de financiamento do BNDE, com especial destaque para a Escola de Química da UFRJ, que hoje é a COPPE”, ressaltou o professor.

As duas décadas foram marcadas pela criação das primeiras grandes indústrias farmacêuticas e os anos 60 se destacaram pelos estudos em espectroscopia de ressonância magnética nuclear, aplicada à determinação de produtos naturais.

A química nos dias de hoje

Atualmente, a área detém o maior número de programas de pós-graduação. De 2003 a 2010, o número de doutores e mestres subiu significativamente. “São 1735 mestres em 2003 para 2395 no ano de 2010. Entre 2003 e 2007 foram titulados 1487 doutores, contra 2337 no triênio 2007-2010”, disse Pinto. Ele acrescentou que o Brasil, em termos de publicação, também evoluiu. “Temos o Journal of the Brazilian Chemical Society e a Revista Virtual de Química (RVq), ambas com grande projeção e prestígio”. Enquanto o JBCS é uma revista científica tradicional, a RVq é destinada, principalmente, aos estudantes de graduação e pós-graduação.

O Acadêmico destacou que 2008 foi um ano de referência para a química, pois a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes/MEC) criou o Conselho Técnico-Científico (CTC) da Educação Básica. “Além disso, o ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva assinou a lei dos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia (Ifets). “As escolas técnicas e os Cefets (Centros Federais de Educação Tecnológica) ganharam a nova denominação de Ifets e tiveram o número de discentes e docentes aumentado, passando a obedecer uma nova lei” explicou o químico. (Para saber mais acesse o site.)

O setor ainda está em processo de expansão. “A nossa indústria química é a oitava maior do mundo, mas ainda precisamos expandir nossa balança de exportação, agregar mais valor aos nossos produtos. Contudo, sem priorizar a educação não vamos muito longe. Devemos olhar para a formação básica dos nossos professores”, concluiu o Acadêmico.