O câncer é uma doença bem mais particularizada do que se imaginava. Estudos genéticos vêm mostrando que cada paciente apresenta uma combinação praticamente única de alterações genéticas que, somadas a questões ambientais, resultam num determinado tumor. Para combater com eficácia tal problema, a saída, no futuro, seria um tratamento altamente individualizado.

“Cada vez mais se chega à conclusão que, além dos genes em comum para um determinado tipo de câncer, há sempre alterações genéticas que ocorrem num grupo muito pequeno. Mas pequeno a ponto de podermos dizer que talvez seja uma doença individual” afirmou o Acadêmico Sergio Verjovski de Almeida, do Departamento de Bioquímica da USP.

Ele fez no dia 7 de agosto palestra sobre o tema Genoma humano: rumo à medicina personalizada, no simpósio em homenagem aos 40 anos do Instituto de Ciências Biomédicas da UFRJ, cujo objetivo era debater a Biomedicina do século XXI.

Um câncer, o de rim, por exemplo, é definido por alterações genéticas determinadas, presentes em todos os que sofrem desse tipo de tumor. Ocorre, entretanto, que, além dessas alterações, há outras, bem mais particularizadas, ou praticamente individualizadas. Esse conjunto de alterações vai determinar que o câncer de rim de um indivíduo é diferente, pelo menos do ponto de vista genético, do de outro.

Se levarmos em conta, no entanto, que o genoma humano é formado por cerca de 23 mil genes e que cada um desses genes pode apresentar de duas a três formas diferentes, o número de combinações possíveis é bem alto. “A pesquisa do câncer tem um século, mas só começamos a estudar a doença em nível molecular nos últimos 40, 50 anos”, lembrou Almeida. “E só há pouco tempo, começamos a estudar os genes um a um. Agora, estamos olhando para milhares de genes ao mesmo tempo, para tentar perceber essas combinações, que são diferentes em cada paciente.”

Muitas drogas descartadas podem ser úteis

Este estudo terá um impacto direto no tratamento da doença. O pensamento que até hoje norteou a indústria, aponta o especialista, era o de desenvolver drogas que tivessem um efeito máximo no maior número possível de pessoas.

Ao longo de anos de desenvolvimento de novas drogas, várias delas foram descartadas por serem inócuas ou tóxicas, claro, mas muitas por apresentarem resultados (ainda que bons) num grupo muito pequeno de pacientes. Para o especialista, no futuro, algumas dessas terapias poderiam ser resgatadas.

O especialista acredita que, no futuro, à medida que as informações sobre as combinações de alterações genéticas individuais forem sendo acumuladas, será possível criar bancos de dados com os vários perfis dos diferentes tumores. De outro lado, seria factível também criar bancos com todos as drogas disponíveis (mesmo aquelas que fossem eficazes para uma parcela muito pequena da população). “Esse cruzamento vai identificar o melhor remédio para aquela combinação específica”, afirmou Almeida. “Mas é coisa para no mínimo dez anos.”