Os participantes Fernando Galembeck, Pedro Wongtschowski, Carlos A. Pacheco e Jorge Guimarães.

 

A Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) reuniu cientistas de diversas áreas para a 9ª Conferência Fapesp 60 anos, que ocorreu nesta quarta-feira, 23/3. Sob a temática “Inovação e Indústria”, os palestrantes debateram a importância da inovação tecnológica e sua imprescindibilidade na agenda de inúmeras instituições, incluindo a própria Fapesp. 

Desde o final dos anos 1970, a palavra inovação entrou de forma definitiva na agenda das políticas de ciência e tecnologia. A inovação tecnológica está no centro das estratégias empresariais e esforços políticos e públicos de melhoria de qualidade de vida. Dessa forma, a ciência – tanto a básica, quanto a aplicada – e o desenvolvimento tecnológico se unem para adentrar os mercados e as políticas públicas.  

Segundo Marco Antonio Zago, presidente da Fapesp e membro titular da ABC, a inovação sempre fez parte do planejamento da instituição: “Aqui, todos reconhecem que a origem da inovação está na ciência. E a inovação leva ao crescimento econômico.” 

“À medida que os setores dependentes do conhecimento se expandem e a pressão competitiva aumenta, o financiamento da pesquisa básica se torna um elemento central para apoiar o desenvolvimento empresarial e para promover interação entre os setores público e privado”, observu o Acadêmico. Para Zago, os palestrantes devem discutir o papel de uma agência de apoio à pesquisa na promoçã da inovação. 

O ponto de vista de quem inova 

O professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Fernando Galembeck, também membro titular da ABC, afirma que apesar de a inovação ser muito defendida e muito necessária, ela envolve problemas ético-sociais e tem opositores – como os trabalhadores que temem que sua mão de obra seja substituída pelo uso de máquinas. “Por muitos anos disseram que um dia ocorreria o ‘fim da ciência’. De fato, estamos vivenciando um novo mundo na ciência. Um mundo do caos, do status e da complexidade”, observa o químico, defendendo formas inovadoras de fazer ciência, novas ferramentas e mais possibilidades.  

Ao oferecer um panorama do ecossistema de inovação no Brasil, Galembeck defende que o país oferece vantagens, mas precisa aprender como explorá-las a seu favor: “Existe capacidade ociosa, o que reduz as necessidades de investimento em plantas, e a crescente intensidade do interesse de empresas industriais em inovação. Já aderimos às práticas de ESG [sigla para environmental, social and corporate governance, abordagem para avaliar até que ponto uma corporação trabalha em prol de objetivos sociais que vão além do tradicional], mas é preciso estendê-las para o setor público.” No entanto, as desvantagens ainda são muitas, o que dificulta o progresso: “O essencial aqui é que o ecossistema precisa ser todo forte, ou não avançamos. Nenhuma corrente é mais forte que seu elo mais fraco”, declara o Acadêmico. Galembeck aponta o negacionismo, os altos custos e a legislação hostil como alguns dos principais pontos fracos do país dentro desse aspecto. “Deixo claro que, nesse ecossistema, o que mais importa, do meu ponto de vista, é talento. É ter pessoas qualificadas, diversificadas e com objetivos comuns.” 

Em seu laboratório, Galembeck está em busca da inovação, tendo destacado um de seus mais recentes projetos na apresentação: a higroeletricidade, que foi descoberta em 2010 e verificada por vários autores, um tipo de eletricidade estática formada em gotículas de água e podendo ser transferida para pequenas partículas de poeira. O cientista desenvolveu um equipamento que se propõe a gerar energia através da higroeletricidade presente na umidade do ar, gerando uma quantidade de energia equivalente a 0,000001% da produzida em uma mesma área por uma célula solar. “Ao abandonar um velho paradigma, foi possível viabilizar um novo processo de produção de energia”, aponta o químico. 

O ponto de vista de quem financia a inovação  

Jorge Almeida Guimarães ousou ao propor um debate sobre o desencontro entre as ICTs e a indústria no Brasil e o papel de mediação da Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii), onde atua como diretor-presidente. Segundo ele, um dos grandes erros dessa ligação é a ausência de uma cultura que facilite uma interação entre os órgãos, capaz de destacar a importância da pesquisa para o desenvolvimento socioeconômico do país.  

Guimarães defendeu que os pilares da educação são talento, instituições acadêmicas fortes e a existência de um estado empreendedor, capaz de investir em ciência – algo que o Brasil não tem até os dias de hoje. “Continuamos escapando da necessidade do Estado de participar pesadamente na subvenção e no recurso não-reembolsável… Esse foi um dos motivos pelos quais surgiu a Embrapii”, conta o pesquisador, utilizando a situação do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) como exemplo. Metade da verba do fundo virou empréstimo bancário, oferecio pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). Apesar de o Brasil preeencher todos os outros requisitos, a falta de um governo capaz de prover incentivo à ciência ainda é uma lacuna que precisava ser preenchida.

Visando suprir essa ausência, em 1951, foram criadas as primeiras iniciativas de amparo à pesquisa, com a fundação do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). A Fapesp, primeira fundação de apoio à pesquisa estadual, surgiu em 1960. Criada em 2013, a Embrapii é uma associação privada criada para ampliar os centros de pesquisa e desenvolvimento no Brasil, além de buscar solucionar outros problemas, como diminuir a distância entre produção científica e desenvolvimento tecnológico. “O índice de inovação tecnológica no Brasil ainda é muito baixo”, comenta Guimarães. “Há mais de 2 mil indústrias no país e poucas promovem pesquisa e desenvolvimento. É necessário fazer algo diferente.”  

Quase uma década após sua criação, a instituição demonstra um rápido crescimento, contando com 76 Unidades Embrapii – centros de pesquisa com foco em desenvolvimento de alta tecnologia industrial. Os projetos desenvolvidos nas instalações prezam pela alta rigorosidade e competitividade, além de abrangerem múltiplas competências, desde inteligência artificial até engenharia marinha. Para o futuro, Guimarães espera que a atuação da Embrapii cumpra com um de seus principais objetivos: elevar para 2% a participação de pesquisa e desenvolvimento no PIB brasileiro.  

Assista à gravação completa no canal da Fapesp no YouTube.