Filho de uma dentista e do músico Caxi Rajão, o mineiro Raoni Guerra Lucas Rajão nasceu em 1981, na cidade de Belo Horizonte, no estado de Minas Gerais. Mas seus primeiros anos e de seu irmão foram passados em contato frequente com a natureza e a atividade rural, na fazenda dos avós em Conceição do Mato Dentro, a 160 km da capital. O avô Osmar, prefeito em Conceição do Mato Dentro nos anos 1970, foi a primeira autoridade a valorizar o patrimônio natural da cidade e criar atrações para ecoturismo e foi quem despertou o interesse do menino pela ciência e tecnologia.

Em função desse interesse, Raoni começou a trabalhar como programador ainda na adolescência, na mesma época do boom da Internet. Ao terminar o ensino médio na Fundação Torino, uma escola italiana em Belo Horizonte, ele se sentiu preparado para ir sozinho para Milão, onde cursaria a graduação em ciências da computação. Ele atuou como programador e consultor em diferentes empresas de pequeno e grande porte na Itália durante e após a graduação. Também estudou canto, com foco no período barroco.

Durante os anos em que permaneceu na Università degli Studi di Milano-Bicocca (UNIMIB), Raoni Rajão realizou iniciação científica no laboratório de Modelos e Algoritmos para Mineração de Texto e de Dados, coordenado pelo professor Fabio Stella, que o indicou para um estágio de pesquisa na Agência de Meio Ambiente e Mobilidade Urbana da Prefeitura de Milão. O objetivo do estágio era desenvolver sistemas que aplicam modelos e algoritmos de mineração de dados para melhor compreender a relação entre políticas de limitação de circulação de carros e melhoria da qualidade do ar na cidade. Graças a essa experiência, ele pôde juntar um interesse crescente em questões ligadas à aplicação de tecnologias para a gestão pública e políticas ambientais. “A prefeitura decidiu implementar um cinturão de restrição do trânsito em um local que ia contra a recomendação do estudo técnico que ajudei a realizar. Essa vivência me fez perceber que além de estudar aspectos técnicos, precisava compreender melhor a dimensão social e organizacional da forma com que a ciência e tecnologia podem influenciar – ou não – as políticas públicas.” 

Mais amadurecido, Raoni Rajão decidiu buscar um tema de pesquisa para o mestrado que lhe permitisse trabalhar em prol do Brasil. Encontrou na Inglaterra programas que atendiam a esse anseio, mas que eram muito caros. Para atingir seu objetivo, ele e a esposa, que também é brasileira e havia se mudado para Itália para trabalhar como enfermeira, economizaram um valor equivalente a um apartamento em Belo Horizonte para poder financiar seu mestrado. Iniciou o mestrado em tecnologia da informação, gestão e mudança organizacional na Universidade de Lancaster em 2006, tendo escolhido como tema da dissertação de mestrado o estudo do papel do monitoramento por satélite nas políticas territoriais na Amazônia brasileira. 

Foi durante o mestrado que Rajão encontrou sua vocação para a vida acadêmica. Focado no desmatamento na Amazônia e no papel das geotecnologias na construção e implementação das políticas ambientais, ele começou a explorar o tema no mestrado de forma qualitativa, buscando compreender como o contexto institucional desde os anos 1970 promoveu o desenvolvimento e uso dessas tecnologias, e como esse uso se modificou a partir do surgimento do movimento ambientalista. Por ter recebido o prêmio de melhor dissertação, a Universidade de Lancaster lhe ofereceu uma bolsa integral e o pagamento das taxas universitárias para aprofundar o tema de pesquisa no doutorado, quando buscou compreender as práticas de trabalho dos diferentes atores envolvidos na criação e implementação das políticas de controle do desmatamento. Com isso, o cientista permaneceu em terras inglesas por mais cinco anos, desenvolvendo sua pesquisa na área de organização, trabalho e tecnologia. Como também praticava esgrima desde a adolescência, chegou a participar da equipe da Universidade de Lancaster, o que lhe conferiu a oportunidade de competir em várias partes do Reino Unido.

Após a conclusão do doutorado, também cursado na Inglaterra, em 2011, Rajão foi aprovado para uma vaga de professor adjunto no Departamento de Engenharia de Produção da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Ele conta que o Departamento acolhe uma ampla gama de abordagens quantitativas e qualitativas, mas mantém a característica das engenharias de buscar um impacto direto na sociedade por meio da ciência e tecnologia.

Nos dez anos de UFMG, comemorados em 2021, Rajão resgatou o interesse em abordagens quantitativas, em colaboração com pesquisadores da engenharia e do Instituto de Geociências. “Com o professor Britaldo Soares-Filho realizei pesquisas que avaliaram o impacto de mudanças no Código Florestal aprovado em 2012, estimaram o valor dos serviços ecossistêmicos produzidos pela floresta amazônica e projetaram as trajetórias de emissão de gases de efeito estufa em diferentes cenários regulatórios, de modo a avaliar a capacidade do Brasil em alcançar as metas propostas no Acordo de Paris (NDC)”, relatou o Acadêmico. A mesma parceria resultou recentemente num estudo que avaliou o nível de contaminação por desmatamento ilegal das exportações brasileiras de soja e carne. Esses estudos tiveram um impacto direto na construção de políticas públicas estaduais e federais, com destaque para a meta de restauração florestal no Brasil e o debate sobre o acordo comercial entre Mercosul e União Europeia.

Atualmente, Raoni Rajão é professor associado de Gestão Ambiental e Estudos Sociais da Ciência e Tecnologia no Departamento de Engenharia de Produção da UFMG, além de professor dos programas de Pós-graduação em Engenharia de Produção e de Modelagem e Análise Ambiental da mesma instituição. Ele também atua como co-orientador nos programas de Pós-graduação em Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília (UnB), de Política Ambiental e Economia na Universidade de Bonn (Alemanha), e de Conservação da Natureza e da Floresta da Universidade de Wageningen (Holanda). Além disso, Rajão já atuou como consultor do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), Cooperação-Técnica Alemã (GIZ) e Banco Mundial.

Sobre a paixão pela área científica, Raoni Rajão ressalta que o processo de descoberta e a contribuição para os debates sobre políticas públicas é o que mais lhe fascina. Trabalhando com a proteção da floresta Amazônica, ele percebe de forma muito clara a importância da ciência para garantir o enfrentamento a ameaças socioambientais e são temas como esse, de interesse social, que pretende destacar na sua atuação junto à ABC.