O 25º Webinário da ABC, realizado no dia 13/10, com o tema “Instituições de Pesquisa: Ações em resposta à crise”, contou com a participação dos Acadêmico Jerson Lima (UFRJ/Faperj) e Antonio Gomes (UFC), e de Liedi Bernucci (Poli-USP) para falar sobre o enfrentamento da ciência brasileira à pandemia de COVID-19.

Apesar do cenário de cortes de financiamento para ciência, tecnologia e inovação, muitas universidades e instituições de pesquisa brasileiras conseguiram responder rapidamente desde os primeiros sinais da pandemia no país. O vice-presidente da ABC para a Região São Paulo, Oswaldo Luiz Alves, foi o coordenador do evento.

Resiliência em meio à crise

Em meio a uma realidade de cortes às pesquisas científicas e, ao mesmo tempo, de demandas por soluções para enfrentar a pandemia de COVID-19, o Acadêmico Antonio Gomes Souza Filho, cientista-chefe da Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (Funcap) e professor da Universidade Federal do Ceará (UFC), e o Acadêmico Oswaldo Luiz Alves tiveram a ideia de fazer um levantamento da contribuição da ciência ao enfrentamento da doença no Brasil. As informações obtidas, além de revelarem importantes soluções criadas por diversos cientistas, mostraram a resiliência de muitas instituições científicas à escassez de recursos.

“Esse documento não tem a pretensão de documentar todas as realizações, mas é um ponto de partida para conhecermos como a ciência brasileira tem enfrentado a crise”, disse Antonio. Segundo ele, desde o início da pandemia no Brasil muitas pesquisas foram redirecionadas para o diagnóstico e tratamento da COVID-19. Posteriormente, as instituições científicas ainda contribuíram com a produção de álcool em gel e equipamentos de proteção individual e outras se dedicaram à produção de ventiladores pulmonares. Também intensificaram suas ações de  divulgação científica.

“Em todos os Estados, sem exceção, universidades e instituições de pesquisa se envolveram no enfrentamento à pandemia”, relatou o Acadêmico. Da antropologia à zootecnia, as universidades ampliaram suas áreas de atuação: até esta data, segundo o Acadêmico Antonio Gomes, cerca de 1.500 artigos de pesquisadores brasileiros sobre COVID-19 foram publicados em revistas internacionais.

“Costumo dizer que essa capacidade de resposta poderia ter sido maior, mas só foi possível graças  a um sistema de pesquisa bem equipado e com profissionais qualificados”, disse Antonio ao destacar a importância dos Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia — os INCTs —, importantes instituições de fomento à pesquisa no Brasil. “Ciência é o melhor investimento para a nossa sociedade e para o futuro”, afirmou.

A importância da interdisciplinaridade

Liedi Bernucci, além de ser a primeira mulher a dirigir a Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP), é membro do Conselho Superior da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Por trás de cargos tão importantes, a pesquisadora contou como a interdisciplinaridade pode ser a chave para atender as demandas atuais da sociedade neste momento de pandemia. Um exemplo vem da própria Fapesp que, mesmo sob a ameaça de cortes contundentes, lançou editais que privilegiavam projetos diversos de enfrentamento à COVID-19.

“Há cerca de 50 anos já se discutia o papel fundamental da interdisciplinaridade. Hoje, vemos o quão é importante para o combate à COVID-19”, disse Bernucci. Ela também utilizou o exemplo da USP que, por meio da união e da colaboração de pesquisadores de diferentes áreas do conhecimento, criou linhas de pesquisa para gerar novos testes e tratamentos. O resultado de uma dessas parcerias foi a criação de ventiladores pulmonares criados por professores da Escola Politécnica da USP, doados a hospitais para pacientes infectados pelo coronavírus. “A pesquisa tem sofrido neste país, mas teve destaque no combate à pandemia”, afirmou.

Para a diretora da Poli-USP, a educação é fundamental para a propagação e a longevidade da ciência. “Precisamos inserir os jovens nessa realidade, disseminar a importância da ciência na vida de todos”, disse. “Também precisamos unir a indústria brasileira e as tecnologias criadas pelas universidades e evitar um colapso no país”, concluiu.

Ciência em movimento

Durante o auge da epidemia do zika vírus, entre 2015 e 2016, a comunidade científica brasileira desenvolveu inúmeras pesquisas que contribuíram para um entendimento maior da doença e suas consequências, como a descoberta da ação do vírus capaz de gerar a microcefalia em recém-nascidos. De acordo com o bioquímico e Acadêmico Jerson Lima, presidente da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj), diante de outro momento desafiador para a ciência brasileira, em uma situação de menos recursos, a comunidade científica conseguiu responder aos desafios da COVID-19.

“O Brasil tem alta influência e especialização na pesquisa da área de saúde e ainda pudemos utilizar essa infraestrutura para o enfrentamento da pandemia”, disse o Acadêmico. “Mesmo com a crise e a perda de recursos, lançamos editais para projetos de novos diagnósticos, equipamentos e estudos de vacinas”, exemplificou ao citar algumas iniciativas da Faperj. Apenas o Laboratório de Virologia Molecular da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), coordenado pelo Acadêmico Amilcar Tanuri, recebeu cerca de 1,5 milhão de reais da Faperj para o desenvolvimento de pesquisas contra a COVID-19. “Com mais recursos, poderíamos ter apoiado muitos outros projetos”, disse.

Também como coordenador do INCT de Biologia Estrutural e Bioimagem, Jerson Lima participa de estudos de vacinas contra a COVID-19 a partir da imunização passiva, que utiliza anticorpos produzidos em cavalos. O Acadêmico observou que, além da escassez de recursos, há falta de vontade política. “É preciso haver uma ação mais articulada entre diferentes grupos de pesquisas e agências de fomento para o combate a essa pandemia”, afirmou. Segundo Lima, a tramitação de um projeto de lei que pretende limitar recursos da Fapesp, em São Paulo, é uma demonstração dessa desvalorização da ciência como patrimônio brasileiro e da necessidade da população confiar na ciência e defendê-la.