King Crimson, Genesis, Can. O rock progressivo dos anos 60-70 é o som que mais agrada a Max Cardoso Langer, embora tenha passado a infância ouvindo as cantatas de Bach. Até os doze anos, Max morou na vila de engenheiros da Mineração Morro do Níquel, em Pratápolis, pequena cidade do interior de Minas Gerais. Seu pai era alemão, diretor da multinacional que geria a mineração, além de pioneiro no Brasil no beneficiamento da garnierita, mineral rico em níquel. Max foi o único filho de seu segundo casamento. Sua mãe, natural de Pratápolis, foi diretora e professora de história na escola estadual da cidade, onde Max cursou o ensino fundamental, fase em que seus maiores interesses eram pela história e a geografia.
Seus dois irmãos por parte de pai eram pelo menos vinte anos mais velhos que Max e já moravam fora quando ele nasceu. Como filho único, suas brincadeiras eram solitárias: colecionava pedras, borboletas, moedas, selos e tudo mais que aparecesse pela frente. Tinha um grande fascínio por animais, tendo criado de tudo um pouco, especialmente dos 12 aos 17 anos, quando viveu numa fazenda. Já no ensino médio, agregou a biologia aos seus interesses anteriores e dedicou-se aos esportes: jogava tênis, vôlei e basquete. Nesse período, Max pensou em ser agrônomo. Ou físico. Ou matemático. Ou engenheiro naval.
Como referências, Max cita seu pai e seu tio Franz, que não eram cientistas, mas eram engenheiros de minas e homens de grande cultura, tendo levado uma vida de aventuras, explorando minas no Peru e no nordeste do Brasil entre os anos 40 e 60. O estudo e a busca pelo conhecimento eram aspectos muito valorizados na família, o que “fertilizou o solo”, segundo Max. “Mas fui eu mesmo que plantei a semente da ciência em meu caminho.”
O rapaz acabou prestando vestibular para engenharia de minas, na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), e para ecologia, na Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Rio Claro. “A primeira opção foi uma tentativa de seguir os passos do meu pai e a segunda foi sugerida por ele mesmo, que achava – com razão – que eu seria um péssimo engenheiro”, diverte-se Max Langer. Passou nas duas universidades e escolheu ecologia, não sabe bem por que. “O fato de eu ser um grande amante da natureza deve ter sido decisivo, e fui para Rio Claro salvar as baleias”.
A decisão foi muito acertada, pois uma cidade menor, como Rio Claro, permitia uma imersão mais integral no mundo universitário. Chegando lá, porém, o rapaz se decepcionou profundamente com o discurso ambientalista que estava em voga na época. Ao mesmo tempo, foi totalmente arrebatado pela possibilidade de fazer ciência. Max Langer destaca que o curso de ecologia era de uma amplitude fascinante e o fato de ter sido apresentado a um conjunto amplo de disciplinas facilitou muito a escolha de temas para investigação. “Não importava a área, queria era produzir conhecimento”, relata.
Inicialmente, Langer frequentou um laboratório que investigava fisiologia de répteis. “Mas quando tive as primeiras aulas de paleontologia e percebi que poderia trabalhar com evolução sem fazer genética, ficou clara minha preferência e fiz iniciação científica na área por dois anos”, conta. Quando começou a ler “Evolution of the Vertebrates: a history of the backboned animals through time”, do paleontólogo norte-americano Edward Colbert, sentiu-se transportado para o período Permiano do Texas, em meio à pelicossauros e anfíbios labirintodontes. “Em companhias como essas, quem quer saber de baleias?”, brinca Langer.
Ele diz que muitas pessoas questionam se sua escolha profissional teve relação com alguma fantasia de infância, pois muitos meninos sonham com dinossauros. Mas Langer conta que embora passasse horas brincando com os bichos de plástico quando criança, nunca pensou em ser paleontólogo até o terceiro ano da graduação, quando trabalhou com tartarugas fósseis e aprendeu conceitos básicos de geologia e paleontologia. Ao final desse período, decidiu cursar o mestrado em geociência na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), quando fez grande imersão em bioestratigrafia, osteologia comparada e sistemática. Finalmente, desenvolveu sua dissertação sobre rincossauros, um grupo de répteis do Triássico do Rio Grande do Sul (RS).
Langer foi então cursar o doutorado pela Universidade de Bristol, no Reino Unido, onde aprendeu muito sobre evolução e filogenia. Sua tese se constituiu de uma revisão da origem dos dinossauros, com a descrição osteológica de Saturnalia tupiniquim, um dos dinossauros mais antigos do mundo, do Triássico do RS. Em seu ponto de vista, o doutorado fora do Brasil foi importante para que se integrasse à comunidade científica internacional e perdesse o “complexo de vira-lata”.
Suas novas referências passaram a ser os professores, inspiradores. “Além de meus orientadores Reinaldo Bertini, Cesar Schultz, Martha Richter e Mike Benton, contei ainda com os exemplos dos professores Bill Magnusson, Ernesto Lavina e Jorge Ferigolo”, conta Langer. “Todos eram extremamente dedicados àquilo que faziam, mas sempre com um olhar aberto, crítico, filosófico, para o mundo fora da academia”, avalia.
Livre-docente pela Universidade de São Paulo (USP), presidente da Sociedade Brasileira de Paleontologia e professor associado do Departamento de Biologia da USP no campus de Ribeirão Preto, seu objeto principal de pesquisa é a origem dos dinossauros. Langer comenta que todos já ouviram falar da extinção que aniquilou o grupo, com exceção das aves, seus descendentes, que se deu há aproximadamente 60 milhões de anos, no fim do período Cretáceo. “No fim do período Triássico, 170 milhões de anos antes, foram registrados os primeiros fósseis de dinossauros, principalmente no sul do Brasil e noroeste da Argentina”, localiza o pesquisador. Ele explica que esses dinossauros eram pequenos, comparados aos gigantes Juro-Cretácicos. Eram animais bípedes, havendo formas herbívoras e carnívoras. “Além de coletar tais fósseis no Rio Grande do Sul e descrever sua anatomia, investigo principalmente suas relações de parentesco, ou seja, quais são mais proximamente relacionados entre si e com seus descendentes”, explica o Acadêmico.
Ele relata que também investiga padrões evolutivos da irradiação basal dos dinossauros, buscando saber onde e quando o grupo surgiu, se sua diversificação foi lenta ou rápida, se esta se deu catapultada por alguma alteração ambiental, quais as relações ecológicas com os demais organismos da época e se houve mais de um pulso de diversificação. Langer tem investigado também, mais recentemente, outros grupos fósseis, especialmente no Permiano do Paraná, Jurássico do Maranhão e Cretáceo do Sudeste.
Um dos aspectos da carreira que mais motivam Max Langer é o fato de a ciência ser uma empreitada conjunta, democrá
tica e universal. “Por mais que os cientistas possam ser criaturas estranhas, muitas vezes solitárias e irascíveis, e não raramente ególatras, eles fazem parte de uma engrenagem que, como toda engrenagem, só funciona integrada.” Para o Acadêmico, toda conquista científica tem como base esforços anteriores, por mais sem precedentes que seja, e é inútil se não impulsionar novas investigações. “Se um pesquisador faz uma grande contribuição à ciência, não será questionado quanto a sua nacionalidade, etnia, sexo, ou religião”, afirma Langer.
Ele também aprecia o fato de que o conhecimento produzido pela ciência seja transitório, não dogmático. “Langer observa: “Não importa quão famosa ou aceita seja uma teoria, ela será rejeitada se não suportar o teste das evidências. Longe de ser uma fraqueza, esta é a grande força da ciência, pois o conjunto de conhecimentos se adequa aos novos tempos, não luta contra eles.”
Orgulhoso por ter sido eleito como membro afiliado da ABC, ele diz que inicialmente pretende entender melhor o funcionamento da Academia e que, depois, tentará contribuir para fortalecer a paleontologia no Brasil através da ABC.