Bruna Aparecida Souza Machado nasceu em 1986, na cidade de Livramento de Nossa Senhora, na Bahia. Teve uma infância feliz, rodeada de familiares, primos e amigos da escola e do bairro onde morava. Seus pais eram comerciantes muito conhecidos e queridos na cidade, tinham uma loja de roupas onde Bruna e a irmã ajudavam nas épocas de muito movimento. A família era grande, com sete tios e tias por parte de pai e dez tios e tias por parte de mãe. Os avós de ambas as partes também eram muito presentes e os vínculos afetivos construídos, muito profundos.
Bruna estudou em escola pública até o fim do ensino fundamental, período em que estudou música e aprendeu a tocar teclado. Participava das atividades de teatro, desfiles cívicos, quadrilhas juninas e festas religiosas da cidade. “Cresci num ambiente familiar de muito amor e incentivo à fé, ética e respeito”, contou a cientista. Os pais sempre a incentivaram a estudar e acompanhavam de perto sua trajetória escolar. A menina era muito dedicada e comprometida com os estudos: gostava muito das aulas de história e biologia, assim como de redação, pois gostava de escrever.
Ela cursou os dois primeiros anos do ensino médio numa escola particular em sua cidade natal. Mas, quando começou a ver os primos saindo de Livramento para prestar vestibular e ingressar em universidades em Salvador, ela sabia que era o que queria. Com o apoio dos pais, pôde dividir um apartamento com primas, primos e sua irmã, que já fazia faculdade de enfermagem na Universidade do Estado da Bahia, em Salvador, e foi terminar lá o ensino médio. Em seguida, prestou vestibular e ingressou na Faculdade de Farmácia da Universidade Federal da Bahia (UFBA).
Desde o início da graduação, Bruna percebeu que o ambiente científico acadêmico era a sua vocação. O interesse na ciência foi despertado quando conheceu a pesquisadora Janice Druzian (in memoriam), logo no início do curso. “Tive a sorte e a oportunidade de ser orientada durante toda a minha graduação pela professora Janice, um exemplo de cientista e de mulher”, ressaltou. Foi no então Laboratório de Pescados e Cromatografia Aplicada que Bruna participou de diferentes projetos de pesquisa e extensão e apoiou os trabalhos de alunos de mestrado e de doutorado do grupo. “Foi lá que recebi as minhas primeiras bolsas de iniciação científica, foi onde respirei a ciência pela primeira vez. Aprendi a escrever e publicar os meus primeiros artigos científicos, e a celebrar cada um. Foi a professora Janice que me incentivou a fazer mestrado e doutorado, a ser ética, a ser justa. Foi ela quem me ensinou a ensinar”, declarou Bruna, com emoção.
Elas caminharam juntas até o mestrado de Bruna, na UFBA, e Janice abriu as portas para seu doutorado em biotecnologia pela Universidade Federal de Sergipe (UFS), apresentando-a à sua futura orientadora, professora Francine Padilha. No doutorado, Bruna teve a oportunidade de trabalhar com um projeto de interesse para a indústria e que tinha apoio institucional do Senai Cimatec. Foi o ponto chave de seu amadurecimento científico, quando ela estabeleceu um grupo forte na área de bioprospecção e de produtos naturais com foco na indústria.
Sua trajetória de pesquisa se iniciou em 2011, no Senai, onde ingressou como bolsista de Desenvolvimento Tecnológico e Industrial de um projeto na área de biotecnologia, e se consolidou no Instituto de Tecnologias da Saúde. Mesmo antes de finalizar o doutorado, teve projetos importantes aprovados pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (Fapesba), em editais de inovação promovidos pelo Senai DN e pela Embrapii, além de sempre trabalhar muito em colaboração com outras ICTs públicas e com diferentes indústrias. Dez anos depois, Bruna se tornou a primeira mulher professora titular do Senai Cimatec, tendo trilhado todos os passos do caminho.
Em 2017, através de uma parceria entre sua instituição e o Infectious Disease Research Institute em Seattle nos Estados Unidos, Bruna foi pesquisadora visitante a convite do professor Steve Reed. Foi lá que, em 2019, realizou estágio de pós-doutorado, na área de adjuvantes e produção de proteínas para vacinas. Da mesma forma que foi treinada durante o período nos Estados Unidos, Bruna diz ter imenso prazer de passar e compartilhar esse conhecimento para as pessoas que trabalham com ela, e as estimula a continuar o ciclo virtuoso. “Talvez esse seja o meu maior prazer na área científica, formar pessoas qualificadas em ciência e tecnologia”, afirmou.
A pesquisadora participou da estruturação e consolidação do instituto de que hoje faz parte, que é o Instituto Senai de Inovação em Sistemas Avançados de Saúde (ISI SAS), parte integrante do Cimatec Saúde. Hoje ela atua na área de formulações farmacêuticas, vacinas, estudos pré-clínicos clínicos e biotecnologia, sendo docente permanente dos programas de pós-graduação em Gestão e Tecnologia Industrial e de Modelagem Computacional e Tecnologia Industrial. Atua como pesquisadora líder do ISI SAS, na área de produtos farmacêuticos de base química e biotecnológica.
Sua atuação principal é na área de desenvolvimento de produtos farmacêuticos, como vacinas e medicamentos, desde as etapas iniciais do desenvolvimento e caracterização em laboratório até os estudos em humanos. “Atualmente me dedico a pesquisas de novas rotas de produção para o desenvolvimento de vacinas e sistemas de delivery ou entrega do medicamento, com foco em vacinas de RNA e nanocarreadores lipídicos”, relatou.
Ter sido orientada por duas mulheres cientistas fizeram muita diferença para Bruna. “Elas sempre estimularam a participação de meninas e mulheres no meio acadêmico. Eu busco continuar plantando essas sementes, orientando, incentivando e formando mais mulheres cientistas”. A Acadêmica avalia que a formação científica é sempre difícil, mas que pode ser mais “leve” se houver um ambiente acolhedor e humano. “Foi o que sempre tive com as minhas orientadoras e carrego esse legado para os meus alunos e alunas: ensinar e ouvir as necessidades do outro, vale para ambas as partes. O lado humano não pode falhar no processo de formação profissional, ensinando aprendemos muito”, avaliou Bruna.
Ela tem muito orgulho de atuar numa instituição como o Senai Cimatec, considerada uma das mais avançadas nas áreas de tecnologia e inovação do país, integrada por uma universidade tecnológica com dez cursos de graduação, com programas de pós-graduação de diversos tipos, além da escola técnica com cursos de qualificação profissional e cursos técnicos. “O Cimatec é hoje o maior operador de recursos Embrapii do país, é a instituição de ciência e tecnologia com o maior orçamento de receita anual em pesquisa. Temos à nossa disposição infraestrutura de ponta e equipe de alto desempenho. Esse ecossistema me permitiu desenvolver inúmeras habilidades de caráter interdisciplinar e trabalhar com pesquisadores com conhecimentos e expertises diferenciadas. Isso é muito enriquecedor e desafiador para mim”, apontou Bruna.
A Acadêmica considera que ciência, tecnologia e educação são a base para o desenvolvimento econômico, social e tecnológico do país e têm relação direta com a qualidade de vida de toda a sociedade. Durante a epidemia de covid-19, ela participou de projetos de referência relacionados ao desenvolvimento de tecnologias de desinfecção implantados em diferentes hospitais do estado da Bahia, bem como na rede nacional de manutenção de respiradores, no desenvolvimento da bolha de contenção para apoio na ventilação não invasiva e nas iniciativas de envase de álcool líquido e produção de álcool em gel.
Nesse período, atuou na estruturação, implantação e certificação do Laboratório de Diagnóstico Molecular do Senai Cimatec, com classificação NB-2, que realizou mais de 32 mil exames de RT-PCR, dando suporte a indústria do Estado da Bahia e para a comunidade baiana. Também atuou em estudos clínicos para o combate da doença, inclusive captando mais de 25 milhões em recursos financeiros em projetos específicos para o enfrentamento da pandemia. Liderou tecnicamente o desenvolvimento de uma candidata a vacina de RNA em parceria com os EUA (HDT Bio), com apoio do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e anuência da Anvisa, coordenando inclusive o desenvolvimento dessa plataforma tecnológica para aplicação em outras doenças, incluindo o câncer. Em 2023, ela foi a única representante da América Latina a participar de evento em Seul, na Coreia do Sul como Fellow in Vaccinology do International Vaccine Institute (IVI), referência internacional na área de vacinas.
Bruna Machado vê a ciência nos três tempos: passado, presente e futuro. “Para realizar a ciência presente e futura, é essencial olhar para o passado e observar, refletir e apreender com o que já está disponível na literatura. Isso permite a redução do tempo de desenvolvimento de inovação. Ciência é divulgação, é compartilhamento de conhecimento, é pensamento colaborativo e construtivo, é progresso para qualquer sociedade, para qualquer país.”
“A ciência me encanta porque ao mesmo tempo que ela nos permite compreender, ela também nos permite desenvolver. E isso traz melhoria da qualidade de vida da sociedade”, argumenta. Ela dimensiona o título de membro afiliado da ABC como um marco de muita relevância em sua vida profissional. “A ABC é uma instituição extremamente respeitada, que reúne cientistas de grande importância e que atua de forma colaborativa, buscando unir esforços para contribuir com o desenvolvimento tecnológico, científico e social do nosso país. Estou muito feliz e honrada em fazer parte dessa Academia e quero, junto com os outros membros, continuar na luta pela preparação e estruturação de um ecossistema mais favorável e igualitário para desenvolver ciência no Brasil. Além disso, espero poder contribuir na minha área para discutirmos ações importantes relacionadas a saúde pública e incentivos a pesquisas para melhoria do acesso a produtos de saúde, medicamentos e novas terapias. É uma área que o Brasil tem muito potencial e que precisamos incentivar pesquisas nessas áreas consideradas como fronteiras do conhecimento.”
Para Bruna Machado, o que vale da vida é ser feliz. Além da realização profissional, a outra parte da sua felicidade reside na família e nos amigos. “Adoro boas comidas, principalmente comidas regionais. Gosto de correr, de ler livros, ver séries e filmes de ficção, que estimulam meu pensamento criativo, pois me faz sair um pouco do mundo real e mergulhar no imaginário. Adoro viajar para conhecer novos lugares, culturas e gastronomia. Adoro explorar lugares novos”.
Mas a baianidade tem aquele poder mágico que todos conhecem. “A Bahia é um lugar rico de beleza natural e cultural, a gastronomia, o povo, as praias, o sertão e a chapada. Adoro o mar, a água salgada, a brisa. É onde encontro a minha paz interior. A Baía de Todos os Santos é um dos lugares mais inspiradores para mim. Adoro navegar, olhar o horizonte e a beleza das águas e de todo o ecossistema. Amo a Bahia.”