Sonaira Souza da Silva nasceu em Sena Madureira, no Acre, onde viveu até os 19 anos, quando se mudou para Rio Branco para cursar a faculdade. Sua pesquisa envolve o monitoramento de queimadas na Amazônia e mostra o quão fundamental é a formação de pesquisadores de excelência na região.

O município de Sena Madureira é enorme, como costuma ser na Amazônia. Com 23 mil km², é cerca de 15 vezes maior que a cidade de São Paulo, e é cortado em toda sua extensão pelo rio Iaco. Os pais de Sonaira nasceram no alto do rio, numa zona de seringais, e se mudaram para a cidade onde construíram a família. Ambos só tiveram a oportunidade de completar o ensino médio já adultos, mas proporcionaram às filhas, Sonaira e Silmara, a oportunidade de chegar até a faculdade.

O gosto de Sonaira pela sala de aula veio da família. A mãe e quatro tias maternas são professoras de ensino fundamental. Talvez por isso ela sempre tenha sido boa aluna, com gosto particular por geografia e matemática, duas áreas fundamentais para sua pesquisa atual. Mas a importância da família não esteve apenas no exemplo.

Quando tinha 15 anos e cursava o ensino médio, Sonaira engravidou. Histórias de meninas que precisam largar os estudos para cuidar dos filhos são comuns no Brasil, mas graças à sua rede de apoio familiar, Sonaira foi diferente. “Com apoio dos meus pais, continuei os estudos com bom rendimento. Ao concluir o ensino médio, me incentivaram a fazer o vestibular, onde estudei muito e passei no curso de Engenharia Agronômica na Universidade Federal do Acre (UFAC). Meus pais cuidaram do meu filho para eu me formar”, conta.

A escolha de curso foi inusitada, Sonaira chegou a considerar medicina, educação física, economia e geografia, mas de última hora optou pela engenharia agronômica, pegando de surpresa até a própria família. Na UFAC, foi apresentada a um mundo de pesquisadores renomados, sobretudo quando o assunto é Amazônia. “Foram professores como Sebastião Elviro, Foster Brown, Judson Valentim, Willian Flores, Elsa Mendoza, Ane Alencar, Philip Fearnside, entre muitos outros, que me apoiaram e incentivaram na academia, abriram portas no mercado de trabalho, e muitos até hoje são parceiros de pesquisa científica”.

O senso de equipe sempre a motivou durante a graduação. Sua primeira bolsa veio num programa de tutoria e foi crucial para se manter na faculdade. Depois disso passou a se envolver de forma voluntária com projetos de iniciação científica nas áreas de agricultura, geoprocessamento e ecologia. Ao se formar, logo entrou para um mestrado na mesma universidade, trabalhando com a adaptação de áreas de pastagem para a produção agrícola.

Uma vez mestre, conseguiu uma vaga de professora no campus de Cruzeiro do Sul da UFAC. Logo depois sua carreira daria mais um salto e chegaria até sua área de pesquisa atual. Ela passou para doutorado no Instituto de Pesquisas Amazônicas (Inpa), em Manaus, com um projeto para entender a dinâmica das queimadas em seu estado natal. A mudança não veio sem desafios, pois Sonaira estava grávida de seu segundo filho. “Mesmo assim, foi o período em que me consolidei como pesquisadora, aprovei meus primeiros projetos, coordenei e participei de campanhas de campo, e publiquei meus artigos mais citados, que consolidaram minha carreira”, explica.

“Minha pesquisa busca compreender o tamanho e intensidade do impacto das queimadas e incêndios florestais na Amazônia. Analisamos imagens de satélite para mapear e identificar onde estão e qual o tamanho das queimadas, e quais os fatores que contribuem para sua ocorrência, como secas, temperatura, usos da terra e desmatamento. Analisamos também como as queimadas têm impactado a qualidade do ar, afetando a saúde pública das pessoas nos centro urbanos e na zona rural. Outra linha de pesquisa é a análise da degradação das florestas afetadas pelo fogo, como perda de biomassa, perda de recursos madeireiros e não-madeireiros e biodiversidade”, explica a nova membra afiliada da Academia Brasileira de Ciências (ABC).

Sonaira é a primeira Acadêmica do Acre e quer trazer para as discussões o ponto de vista de cientistas que vivem e sentem na pele os impactos da destruição ambiental. “A ciência transformou minha vida, e dá oportunidade para tantos outros jovens de transformarem suas vidas a partir de evidências e conhecimento com a discussão crítica e ética”, afirma.

Mas nem só de ciência vive o cientista. Nas horas vagas, Sonaira ama passear ao ar livre, principalmente nos igarapés de águas pretas típicos de sua região. Também é apaixonada por crochê e outras atividades manuais, criando mandalas e acessórios coloridos. “Fiz mais de 150 chaveiros de crochê para dar de brinde aos participantes do Simpósio de Ciências do Ambiente, que coordenei em 2023”, conta a Acadêmica.