Leia artigo publicado no Valor, em 8 de setembro, de autoria do vice-presidente da ABC para a região Norte, Adalberto Val (ex-diretor do INPA e coordenador do pré-estudo de viabilidade do Amazon Institute of Technology), e Juan Castilla-Rubio (presidente de SpaceTime Ventures e da KAA Biosciences). Ambos são integrantes do Derrubando Muros e colaboradores da publicação Uma Agenda Inadiável.

Quem reconhece a importância de uma agenda propositiva e inadiável para o Brasil, como o Derrubando Muros, grupo que reúne mais de uma centena de especialistas de referência em suas áreas de atuação, parte da observação de que o Brasil é um país com potencialidades incomuns.

Entretanto, temos perdido, uma após outra, as oportunidades de tornar essas potencialidades em vantagens competitivas. Perdemos os grandes ciclos de formação de valor da economia mundial, dos semicondutores ao software, a inteligência artificial e a robótica avançada. Por razões diversas, nos contentamos em surfar os ciclos de commodities como se isso fosse um fim e não um caminho para termos uma economia mais resiliente e uma sociedade mais rica e inclusiva.

A emergência climática em curso está nos trazendo uma nova oportunidade de sermos globalmente relevantes. A Amazônia, que representa 61% de nosso território, encerra uma oportunidade de produção de riqueza que pode ser muitas vezes superior a tudo que o Brasil já teve, sem derrubar uma única árvore, sem poluir um único rio. Pelo contrário, basta que o país cuide de seu patrimônio natural e aplique a ele as modernas tecnologias de biologia computacional e engenharia biológica, para decodificar o vasto conjunto de informações escondido em sua imensa biodiversidade.

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Em 1859, Charles Darwin foi o primeiro a produzir uma Árvore da Vida evolutiva em seu livro “A Origem das Espécies”. O ‘Livro da Vida’ é a versão moderna desse trabalho o que implica decodificar o DNA de todas as espécies de vida do planeta e os relacionamentos complexos entre elas. Na Amazônia, que hospeda até 20% da biodiversidade do mundo, o ‘Livro da Vida’ está literalmente sendo queimado para abrir espaço para atividades extrativas, gerando um custo gigantesco para a economia global das próximas gerações.

Preservar a vida no planeta, no contexto da sexta grande extinção da biodiversidade, não é apenas crítico para nossa própria sobrevivência como espécie, mas também para preservar a vasta inteligência biológica da natureza codificada no ‘Livro da Vida’ ao longo dos últimos 3,5 bilhões de anos de evolução da vida no planeta. A biologia tem se tornado cada vez mais digital, onde processos e componentes são codificados como “uns e zeros” no genoma. Por sua vez, isso significa que, quando os primeiros capítulos deste livro estiverem escritos, um poderoso mecanismo de inovação inspirado na natureza poderá ser desenvolvido através do uso da biologia computacional e da engenharia biológica em grande escala.

Quando a capacidade total de sequenciamento for atingida, cerca de 1.000-2.000 vezes mais dados serão gerados em comparação com os já produzidos pelo Facebook, Twitter e YouTube juntos. Avanços significativos em inteligência artificial e aprendizado de máquina causal serão necessários para decodificar as causas e os efeitos das inúmeras redes complexas em funcionamento no ‘Livro da Vida’.

A bioeconomia computacional terá o potencial de transformar múltiplas indústrias, criando bioindústrias de exportação competitivas com criação de riqueza estimada em US$ 5 trilhões por ano. Uma nova bioeconomia computacional com características inclusivas foca na prosperidade para todos, começando pelas comunidades tradicionais e indígenas da Amazônia, e poderia ajudar a resolver a maioria dos problemas da humanidade nas áreas de energia limpa, tratamento de água, alimentos, materiais e saúde, em um clima em rápida mudança.

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Isto é uma oportunidade sem par para que o Brasil planeje o desenvolvimento de uma bioeconomia computacional inclusiva nas próximas décadas como uma de suas mais importantes missões de inovação que os próximos governos poderiam definir e apoiar.