O ano de 2022 é marcante para a questão do meio-ambiente. Há 50 anos foi realizada a célebre Conferência de Estocolmo, abordando pela primeira vez a degradação ambiental de forma global. Vinte anos depois foi a vez da Rio 92, que relacionou o desenvolvimento à sustentabilidade e culminou em importantes convenções sobre clima e biodiversidade. Tanto a Rio 92 quanto a Rio+20, realizada em 2012, são exemplos do papel central que o Brasil já ocupou nas discussões ambientais e que foi perdido nos últimos anos.
Para debater a situação atual do país, sobretudo com relação à Amazônia, foi realizado um painel virtual durante a 74ª Reunião Anual da SBPC. Participaram os membros titulares da ABC Paulo Artaxo, Carlos Nobre e Carlos Joly. Na mesa também estavam presentes a ex-ministra do meio ambiente, Izabella Teixeira, e o ex-secretário executivo da Convenção sobre Diversidade Biológica da ONU, Bráulio Dias.
Amazônia se aproxima do não-retorno
A situação atual da Amazônia é crítica. O Brasil está entre os cinco maiores emissores de carbono do mundo e quase metade dessas emissões vem do desmatamento, que já atinge 20% da floresta. Mas esse não é o único problema: áreas degradadas, nas quais a destruição é apenas parcial, também sofreram expansão, o que contribui para a perda da capacidade do bioma de armazenar carbono. “A preocupação hoje não vem mais da observação de modelos climáticos, mas da observação da própria Amazônia”, resumiu Nobre.
As consequências desse cenário já estão sendo sentidas e afetam diretamente a economia brasileira. As secas no Centro-Sul estão cada vez mais frequentes, assim como os eventos climáticos extremos. “Não existe contradição entre a agricultura e o meio ambiente. É impossível produzir alimento sem um ambiente saudável ao redor”, afirmou Teixeira. Os participantes advogaram por uma moratória urgente sobre desmatamento, para que o Brasil consiga cumprir a meta assumida na COP 26 de zerar a destruição da vegetação até 2030.
Mas o problema não passa tanto pela criação de leis quanto pela sua implementação. O Brasil possui um marco legal sofisticado e uma Constituição que protege o meio ambiente, mas falta fiscalização. Hoje, 94% do desmatamento amazônico provêm de atividades ilegais. “Acima de tudo, é urgente rever toda uma série de medidas infralegais que foram estabelecidas nos últimos quatro anos”, disse Joly. “Por exemplo, precisamos voltar com os Conselhos Participativos e acabar com o bloqueio à atuação do Ibama e do ICMBio”.
Combater o desmatamento, promover a restauração
Mas se é preciso estancar a destruição, também é preciso focar na restauração das áreas destruídas. Para enfrentar o arco do desmatamento que se estende nas fronteiras da floresta, o Painel Científico para a Amazônia (SPA, da sigla em inglês) defende a criação de um arco de reflorestamento que pode salvar a Amazônia de um ponto de não-retorno. “Um megaprojeto para recuperar um milhão de quilômetros quadrados custaria entre 30 e 40 bilhões de dólares” afirmou Nobre. “Não é nada trivial; mas se recuperarmos nossa credibilidade internacional, é possível”.
Entretanto, reflorestar é um processo extremamente complexo, que precisa respeitar a biodiversidade local. Para isso, é necessário investir em ciência e tecnologia para a região, construindo novas universidades e centros tecnológicos. “Atualmente, o Brasil investe apenas 5% do orçamento de ciência, tecnologia e inovação na Amazônia, é muito pouco”, afirmou Dias.
Além de zerar o desmatamento e reflorestar, o SPA pede também a criação de uma nova bioeconomia para a região, que faça uso da imensa biodiversidade e da floresta em pé para criar novas ocupações e trazer desenvolvimento humano às populações locais. “Precisamos avançar a compreensão de desenvolvimento para além do crescimento, é preciso adicionar a sustentabilidade à equação”, sumarizou Teixeira.