Fortaleza, Ceará. Foi onde nasceu, em 1981, Ana Shirley Ferreira da Silva, numa casa em que já havia uma criança e onde os pais trabalhavam, produzindo roupas noite adentro, donos de sua própria micro-empresa. Outra criança veio, e os irmãos brincavam juntos. As duas meninas eram mais velhas e o caçula era um menino. Do que ela mais gostava, nas brincadeiras, era de correr.  

Ana Shirley gostou mais de matemática do que das outras disciplinas durante todo o período escolar, o que facilitou a escolha de carreira. “Eu resolvia as provas de vestibulares passados apenas por diversão, pois era um grande prazer aquilo pra mim”, relata. Ela costumava dizer que não faria faculdade de matemática porque não queria ser professora. E conta que quando decidiu seguir na área da ciência da computação não sabia o que era a carreira de cientista e muito menos que existiam tantas coisas ainda desconhecidas na matemática. Após cursar o primeiro semestre de computação, já entendendo as possibilidades de carreira científica e apaixonada pela teoria dos grafos, decidiu que queria, sim, ser professora, mas que queria fazer pesquisa. 

Formou-se bacharel em ciências da computação pela pela Universidade Federal do Ceará (UFC), em 2003, e continuou os estudos na mesma área, completando o mestrado em 2005 na mesma instituição. Ela relata que a pessoa mais importante para seu desenvolvimento e formação, foi a professora e orientadora do mestrado, Cláudia Linhares Sales, que, segundo ela, serviu – e ainda serve – como um grande exemplo a ser seguido. Entre 2007 e 2010, realizou seu doutorado em matemática e informática pela Universidade de Grenoble, na França, com tese sobre o problema de b-coloração de grafos, sob orientação do Professor Frédéric Maffray, que morreu precocemente em 2018.

Atualmente, Ana é professora associada do Departamento de Matemática da UFC e bolsista de Produtividade em Pesquisa nível 2 do CNPq. Ela trabalha, principalmente, com a classificação de problemas de coloração de grafos. Sua área de atuação utiliza esses problemas para modelar situações da vida real que procuram dividir objetos em grupos disjuntos de acordo com critérios pré-definidos. “De maneira simples, um grafo modela qualquer relação entre elementos de um conjunto. Imagine que uma empresa deseja fazer uma propaganda de publicidade. Para isso, é interessante escolher os alvos iniciais desta publicidade, tomando de preferência um subconjunto de pessoas que, se compartilharem a informação somente com seus conhecidos, sem necessidade que estes repassem novamente, terão feito com que todas as pessoas na rede tomem conhecimento do seu produto. Isto se traduz no que é chamado, dentro da teoria dos grafos, de conjunto dominante de um grafo”, explica a professora. 

Em 2014, Ana Shirley recebeu o Prêmio L’Oréal/Unesco/ABC para Mulheres nas Ciências, que impulsionou sua carreira. O passo seguinte foi tornar-se membro afiliado da Academia Brasileira de Ciências, eleita para o período de 2021 a 2025. Ela revela que o título veio como uma surpresa, e que, é decerto objeto de prestígio diante de seus pares. “Tem sido muito bom conviver, mesmo que apenas de maneira virtual, com pessoas tão brilhantes”, expressa. Ela acrescenta também que tem o desejo de se engajar ainda mais na comunidade científica e na Academia em si. 

Ana Shirley vê na ciência uma fonte de espiritualidade que não encontra em religiões, uma vez que ela se considera ateia. Ela conta que, ao longo de sua infância e adolescência, teve uma relação muito ruim com a religião, pois sentia uma grande pressão da sociedade para acreditar em algo que não só carecia de sentido, em sua percepção, como lhe parecia raso e vazio. “Quando passei a olhar para o mundo, o universo e as relações sociais pelo ponto de vista científico, é como se tudo tivesse tomado uma nova cor, uma vivacidade que antes não me era tão evidente. Passei então a ter um olhar mais crítico não somente diante de fatos puramente científicos, como também de fatos da vida cotidiana”, declarou a Acadêmica.  

Ela considera fascinante o fato de que a sua área em específico seja apenas uma gota no oceano de possibilidades de ideias e revoluções que a ciência pode promover. “O movimento constante da ciência e do conhecimento, a humildade diante de fatos que possam derrubar crenças antigas, a curiosidade inerente do cientista, tudo isso pra mim funciona como uma força vital, algo que sinto como espiritual mesmo”, salienta.  

Fora da ciência, Ana Shirley gosta muito de ler, assistir filmes ou séries de ficção científica, certamente seu estilo favorito. Com um estilo de vida mais boêmio, Ana tenta praticar alguma atividade física, como correr, ao menos três vezes por semana. Gosta de cozinhar – apesar de não ser tão boa nisso -, pinta e desenha como hobby e prefere o calor ao frio. Ela também ama viajar. “Já estive em Paris, Roma e Londres, entre outros destinos tradicionais na Europa. Mas também conheci a Argentina, Uruguai, México, Bolívia e Peru, além de muitos lugares incríveis no Brasil”, contou a Acadêmica.