Confira trechos do artigo de autoria de Virgílio Almeida, diretor da ABC, em conjunto com Francisco Gaetani, publicado no jornal Valor Econômico no dia 28/6. O texto aborda os desafios para a aceleração digital no Brasil. Virgílio é Faculty Associate with the Berkman Klein Center for Internet and Society na Universidade de Harvard e professor emérito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Os sinais da expansão do mundo digital estão por toda parte, são claros. Nenhum país pode prescindir de se transformar digitalmente. A oferta de empregos em tecnologia digital explodiuno Brasil e não há gente qualificada no mercado, aponta uma recente reportagem do jornal O Globo. O New York Times destacou nas últimas semanas dois temas indicadores dos novos tempos: exigências de maior qualificação digital para as oportunidades de emprego nos EUA e a segurança cibernética do país.
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A covid-19 acelerou anos de digitalização em apenas alguns meses. “Demos um salto de cinco anos, pois toda a população foi repentinamente forçada a se tornar digital”, segundo um executivo da McKinsey Digital na Europa. Essas mudanças fizeram com que quase 70 milhões de pessoas na Europa passassem a usar serviços digitais pela primeira vez nos últimos seis meses, de acordo com uma pesquisa conduzida pela McKinsey, com a maioria dos entrevistados agora preferindo
interagir com empresas somente por meios digitais. Em 2023, a Índia assumirá a presidência do G-20 e já prepara os temas que deverão estar na agenda do grupo. Dentre esses temas estão duas deficiências cruciais que são resultado do desenvolvimento digital até então não regulamentado: a falta de confiança de que os dados privados dos cidadãos serão protegidos de forma adequada por entidades estrangeiras e as grandes divisões internacionais que distorceram os benefícios da
digitalização para alguns países. A região do Indo-Pacífico está particularmente ameaçada por ataques cibernéticos. Estudos concluíram que a população da região carece de habilidades
digitais e seus limitados sistemas de segurança cibernética custam às nações mais de US$ 300 bilhões por ano.
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E o Brasil? Não podemos desistir do futuro, que segue à nossa espera, aguardando uma mudança de atitude coletiva da nação frente às possibilidades que a proximidade da saída da pandemia
apresenta. Precisamos de um Brasil digital, diferente do Brasil de hoje, com oportunidades para todos. Um projeto de Brasil que seja inspirador a construir outro Brasil. Que seja moderno,
eficiente, e ao mesmo tempo inclusivo, não racista, não sexista, acolhedor e menos desigual.
São visões necessárias para imaginar um país diferente e melhor, que motive as novas gerações a ficarem por aqui para construir um país mais moderno, mais justo, mais alegre. Como disse o
músico Gilberto Gil numa recente e iluminada entrevista: o desenvolvimento da tecnologia precisa vir com distribuição de riqueza.
A visão de um Brasil digital tem várias dimensões que precisam ser planejadas por governos, pelo setor privado, pela academia e pela sociedade civil. Algumas dimensões fundamentais de um
Brasil digital são: 1) infra-estrutura digital; 2) segurança cibernética 3) força de trabalho qualificada, 4) dados abertos e inovação 5) cooperação internacional e regional em tecnologia 6)
investimentos em pesquisa e desenvolvimento em novas tecnologias e 7) governança digital.
Boas notícias existem como a entrada em funcionamento da Agência Nacional de Proteção de Dados Pessoais, porém são poucas e lentas. A percepção do avanço digital encontra-se escondida, camuflada e eclipsada pela ruidosa cacofonia da política nacional.
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O futuro é digital. É necessário nos prepararmos para ele ao mesmo tempo em que nos organizamos para construí-lo concretamente. Ano que vem teremos eleições presidenciais e
muitas distrações, típicas de um ano eleitoral. O importante é que neste meio tempo nos concentremos naquilo que nos permitirá sair deste difícil momento pelo qual o país passa. A transformação digital é um dos caminhos.
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O desafio consiste em dar direção e coesão aos esforços de governo e às iniciativas empreendedoras oriundas da sociedade na construção de um país mais alinhado com os princípios de justiça social.