Depois de quase um ano de convivência forçada com a covid-19, algumas lições pareciam óbvias e fáceis de serem assimiladas. Todos sabem, por exemplo, que é importante usar máscara, manter o distanciamento social, ter uma embalagem de álcool gel sempre por perto e investir em pesquisa. Certo? Errado. Mesmo passando os últimos meses com o pires na mão, esperando que países como a China e a Índia nos forneçam vacinas e insumos básicos para combater a pandemia, o governo do presidente Jair Bolsonaro resolveu iniciar o ano de 2021 propondo novos cortes no orçamento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI). Pior. A ideia nem é inovadora. No ano passado o governo já havia cortado 15% dos investimentos em pesquisa.
A comunidade científica, obviamente, está protestando contra mais este atentado à inteligência nacional. Nesta quarta-feira, dia 3, o Conselho Deliberativo da Coppe/UFRJ divulgou uma nota repudiando a proposta do governo: “A Coppe/UFRJ adverte a sociedade brasileira para as recentes decisões e medidas do governo federal que resultarão no enfraquecimento e, no limite, na eliminação das condições objetivas de funcionamento de instituições do sistema brasileiro de Ciência, Tecnologia e Inovação”, diz o texto.
O desmonte do sistema se estende a agências de fomento à pesquisa, como a Capes, o CNPq e o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT). A Capes terá 1,2 bilhão de reais a menos do que teve em 2019. Já o CNPq terá apenas 18% do que dispunha no mesmo ano. O FNDCT corre o risco de perder 4,8 bilhões de reais este ano, desviados da sua função primordial para aumentar a Reserva de Contingência Financeira. No ano passado já foram retirados deste Fundo 4,3 bilhões de reais com a mesma finalidade.
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Além disso, a proposta do governo prevê um corte de 68,9% nos benefícios fiscais para a importação de equipamentos e insumos destinados à pesquisa científica. Para o professor Renato Cordeiro, pesquisador emérito da Fiocruz e membro da Academia Brasileira de Ciências, essa redução vai prejudicar fortemente as investigações dos laboratórios e instituições que estão na linha de frente do combate ao covid-19 como a Fiocruz, o Butantan, a USP, a UFRJ, a Unifesp, a UFMG e muitos outros: “Sequenciamentos do genoma do SARS-CoV-2, fabricação e pesquisas com novas vacinas e medicamentos, exigem modernização constante de equipamentos e compra de insumos que não são encontrados no Brasil”, explicou.