Leia matéria de Noéli Nobre para o CenarioMT, publicada em 17/8:
Representantes da comunidade científica brasileira defenderam nesta segunda-feira (17) investimentos maiores em ciência, tecnologia e inovação no País. A avaliação dos participantes de uma videoconferência promovida pela comissão mista que acompanha os gastos públicos com a pandemia de Covid-19 é a de que o Brasil gasta pouco, especialmente se comparado a outros países.
O pedido é para que se liberem totalmente os recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) para superar as crises sanitária, humanitária e econômica que assolam o País.
O presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Ildeu de Castro Moreira, fez um apelo pela liberação dos recursos do fundo. “É nossa luta permanente, não só neste momento. Estamos preocupados com o orçamento do ano que vem. Os discursos sobre a importância da ciência, da tecnologia e da educação são fáceis de serem feitos, mas é mais difícil colocar mais recursos para essa área, mas é fundamental que seja feito.”
Recentemente, o Senado aprovou projeto de lei complementar (PLP 135/20) que proíbe o contingenciamento de recursos do FNDCT. Autor da proposta, o senador Izalci Lucas (PSDB-DF) defendeu a aprovação da matéria pela Câmara dos Deputados o mais rapidamente possível e sem alterações, para que o texto não retorne ao Senado antes de ir à sanção.
O presidente da Academia Brasileira de Ciências, Luiz Davidovich, criticou a alocação de apenas R$ 600 milhões, em 2020, provenientes do fundo, embora sua arrecadação tenha sido de R$ 5,2 bilhões. Entre 2006 e 2020, cerca de R$ 25 bilhões foram contingenciados, segundo os dados compilados pelos cientistas.
Também Glauco Arbix, ex-presidente da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), lamentou que a ciência e a tecnologia não sejam prioridade no Brasil e criticou editais recentes.
“São recursos que foram colocados à disposição para editais do CNPq, editais da Capes e de várias outras instituições, menos de R$ 500 milhões. A nossa avaliação, no começo de julho, é que desses 500 milhões de reais, cerca de 100 milhões chegaram efetivamente na mão de quem faz pesquisa.”
Para o deputado Felício Laterça (PSL-RJ), os investimentos em ciência se justificam também para segurar os melhores cientistas brasileiros no País. “A gente não tem como fazer algo maior, de longo prazo, se você não sabe os recursos que você vai poder utilizar.”
Os debatedores chamaram ainda atenção para a falta de investimento em pesquisa científica na Amazônia e o desmatamento do bioma. Foi o alerta de Luiz Davidovich, da Academia Brasileira de Ciências. “Exemplos de recursos que são dados de graça para nós e estão sendo destruídos pelo desmatamento da Amazônia, que não só prejudica o clima, mas prejudica também o estoque de riqueza do País, que está na biodiversidade e vale mais que o ouro.”
Davidovich também alertou para os riscos sanitários do desmatamento ao liberar novos vírus para a civilização urbana. “Cerca de 500 vírus já foram classificados e identificados na região amazônica. Calcula-se que algumas dezenas de vírus podem ter impacto sobre o ser humano. Fonte de uma nova pandemia? Espero que não. Mas veja que é um sistema complexo e, para dominar esse sistema e colocá-lo a serviço do País, precisamos de ciência, tecnologia e inovação.”
O deputado General Peternelli (PSL-SP) acredita que tal assunto deva se vincular ao estímulo da indústria.
Pesquisa da Covid-19
Apesar das críticas aos investimentos em ciência, os debatedores ressaltaram o trabalho das universidades brasileiras durante a pandemia de Covid-19, que, com poucos recursos, atuaram na produção e na realização de testes, e na produção de equipamentos hospitalares (como respiradores) e de proteção individual.
Diretor-presidente do Conselho Técnico-Administrativo da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), Carlos Américo Pacheco lembrou que a entidade, por exemplo, passou a redirecionar recursos durante a pandemia, sem lançar mão de novos gastos. Mais de 150 grupos de pesquisas e startups, nos quais a Fapesp já havia investido R$ 260 milhões em laboratórios e pessoal qualificado, se dispuseram a focar suas pesquisas para o enfrentamento da Covid-19.