A série sobre “O mundo a partir do coronavírus” dos Webinários da ABC | Conhecer para Entender teve sua 15ª edição no dia 14/7, com um debate sobre “Pesquisa e Desenvolvimento nas Empresas Brasileiras: desafios, oportunidades e obstáculos”. Nesta edição, o vice-presidente da ABC para a Região Nordeste e Espírito Santo, Jailson Bittencourt de Andrade, mediou o debate entre os palestrantes e as perguntas do público.

Participaram deste encontro Gianna Sagazio, diretora de inovação da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e responsável pela coordenação executiva da Mobilização Empresarial pela Inovação (MEI); o Acadêmico Carlos Henrique de Brito Cruz, professor titular do Instituto de Física da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) ex-diretor científico e e ex-presidente da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp); e o Acadêmico José Carlos Costa da Silva Pinto, professor do Programa de Engenharia Química do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe/UFRJ) e ex-diretor do Parque Tecnológico da UFRJ.

O futuro depende da inovação

Gianna Sagazio apresentou um retrato da tecnologia e da inovação brasileiras. Segundo ela, o país vive uma retração industrial, um sintoma causado pela queda da inovação e do investimento empresarial em pesquisa e desenvolvimento, entre outros aspectos. Este quadro se torna ainda mais preocupante em um contexto de pandemia e crise econômica.

“Esses resultados distanciam o Brasil, a nona economia mundial, de países com economias mais inovadoras e que têm reconhecido a inovação como uma medida de desenvolvimento”, disse Gianna. Internamente, a ciência, a tecnologia e a inovação (CT&I), tão importantes para a melhoria dessa situação, contam com poucos investimentos do Governo. Nesse contexto, o esforço empresarial também é afetado, com uma diminuição de recursos de 18,2 bilhões de reais para 17,7 bilhões apenas em 2017. “No índice global de inovação, o Brasil teve uma queda de 19 posições em nove anos”, afirmou. Para ela, o país ocupa uma posição que não é compatível com a importância e com o tamanho de sua economia.

Se o histórico brasileiro recente em CT&I já era caracterizado por poucos recursos, a pandemia da COVID-19 acrescentou um novo obstáculo à recuperação econômica do Brasil. De acordo com Sagazio, 65% da indústria nacional paralisou ou reduziu sua produção durante a pandemia e 83% das empresas participantes da pesquisa citada por ela afirmaram que vão precisar de mais inovação para superar a crise e voltar a crescer.

“O que falta é que seja dada prioridade à inovação no país. Temos que continuar trabalhando para evidenciar que CT&I e educação são os principais setores para o desenvolvimento do país. Sem eles, vejo um futuro muito comprometido para o Brasil”, afirmou a economista. Ela acrescentou que essa falta de prioridade compromete as médias, pequenas e microempresas no país, ou seja, a maior parte das empresas do país, que são responsáveis por 27% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro.

Os desafios do ambiente econômico

O Acadêmico Carlos Henrique de Brito Cruz apresentou algumas iniciativas de sucesso, garantido pela união de empresas com pesquisa e desenvolvimento (P&D) com apoio da agência de fomento. “Quando discutimos o desenvolvimento do país, focalizamos sempre nas coisas que não funcionam, mas há coisas que funcionam bem e, se houvesse mais apoio, haveria mais iniciativas bem-sucedidas como essas”, disse Brito.

Além de o país ter poucos pesquisadores, a fração que trabalha em empresas é muito baixa, “O desafio é que precisamos ter mais pesquisadores no Brasil. são quase 30% em relação a um índice de 70% de outros países”, estimou Brito. Esse cenário relaciona-se com a tímida  inserção do Brasil na economia mundial, segundo o Acadêmico.

Brito mostrou pesquisas apoiadas pela Fapesp especificamente para ajudar o país no enfrentamento da pandemia. Tecido antivírus, ventiladores pulmonares e tomógrafos que auxiliam no monitoramento da respiração artificial foram alguns dos produtos desenvolvidos por empresas brasileiras que estão fazendo a diferença agora. “As empresas no Brasil produzem com base em pesquisa quando têm chance de produzir. O ambiente econômico do país desestimula que uma quantidade maior de empresas faça um esforço de produção e de pesquisa competitivo”, afirmou.

A limitada inserção do Brasil no mercado mundial, identificada pelo palestrante, pode ser afetada pela limitação e horizontes criada pela busca apenas do  mercado interno. Esse fator, em conjunto com outros elementos do chamado “custo Brasil”, gera o que o Acadêmico chamou de “introversão econômica” para o país. “Mais competição internacional e mais apoio estatal virtuoso poderiam estimular mais P&D e aumento da competitividade da empresa”, completou.

A cultura de investimento em inovação brasileira

“Nas últimas eleições presidenciais, os temas da ciência e da inovação foram ignorados. O que o país está fazendo para avanças nessas áreas?” perguntou o Acadêmico José Carlos Costa da Silva Pinto, ao iniciar a sua palestra. Segundo um ranking feito pela Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI), uma agência da Organização das Nações Unidas (ONU), o Brasil ocupa a posição 66º entre 129 países no índice de inovação. Embora a qualidade de seus pesquisadores esteja em boa colocação, o levantamento mostra que o país peca no incentivo à pesquisa em universidades.

“Além de investirmos muito pouco em ciência em inovação, o país também tem um nível de investimento baixo em pequenas empresas de base tecnológica”, disse Pinto. Um outro dado, fornecido pela Pesquisa de Inovação do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostra que, entre 2015 e 2017, apenas 30% de mais de 116 mil empresas brasileiras produziram algum tipo de inovação, um índice em queda se comparado a outros períodos. “Temos um quadro financeiro que estimula o retorno de curto prazo. A inovação é uma decisão estratégica de longo prazo tomada, ou não, pelas empresas”, afirmou.

O desestímulo ao empreendedorismo também foi apontado pelo Acadêmico como um desafio para novas iniciativas de inovação no país. “Vivemos um momento singular no Brasil, com jovens interessados em empreender, mas sem recursos. Os editais de agências de fomento que serviriam para apoiar esses projetos pedem, muitas vezes, um aporte inicial de recursos que eles não têm”, disse Pinto. A falta de infraestrutura e de investimentos impede, assim, a formação de start-ups inovadoras.

“Além de problemas de Estado, são problemas de cidadania. Precisamos de uma cultura massificada na área de tecnologia e inovação e mais oportunidades às vocações empreendedoras”, afirmou o Acadêmico. Para ele, a educação pública brasileira, com cerca de 35 a 45 milhões de matrículas, também impõe o desafio de exposição da juventude brasileira à ciência e ao conhecimento. “Vejo extratos da juventude submetidos a condições de ensino e aprendizado que não espelham a valorização e o reconhecimento que a ciência e a tecnologia precisam”, completou.

Dados de outra pesquisa realizada pelo IBGE para medir o impacto da COVID-19 mensurou que cerca de 716 mil empresas fecharam as portas, principalmente as pequenas empresas. E mostrou que a inovação foi a principal ferramenta de enfrentamento da nova realidade pelas empresas que estão conseguindo sobreviver em meio a tantas falências.

 

Confira o vídeo com os principais destaques desta edição.


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