Com um forte tom político, tiveram início nesta segunda (23), as atividades do 70º Encontro Anual da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), maior encontro científico do país.

Ao chegar ao campus de Maceió da Universidade Federal de Alagoas (UFAL), Gilberto Kassab, ministro da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações foi recebido por autoridades acadêmicas sob protesto de servidores que pediam mais concursos na área, inclusive para a reposição daqueles que se aposentaram, e a recuperação de verbas para o setor.

A jornalistas, o ministro disse entender e apoiar as reivindicações dos pesquisadores e servidores da área de ciência e tecnologia e afirmou que seu ministério é um dos que menos sofreu com os cortes.

“As mobilizações [por vagas e contra os cortes] têm o nosso apoio. Elas nos ajudam a dar visibilidade para as demandas do setor. São manifestações corretas, com peso político e representatividade. Parte grande das demandas vem carregada de muita coerência e legitimidade”, disse.

“Não há país do mundo que consiga ter crescimento, desenvolvimento econômico e criação de empregos sem o avanço da pesquisa, da ciência e inovação. E esse avanço se dá cada vez mais com a participação do capital privado, mas é imprescindível, sempre foi e vai continuar sendo, a participação dos recursos públicos.”

O ministro também falou sobre a fusão dos ministérios realizada pelo governo Temer, que uniu as áreas de Ciência, Tecnologia e Inovação com Comunicações. A ação é vista como um retrocesso pelos pesquisadores. Para Kassab, houve um resultado positivo para ambas as áreas, com um ganho de visibilidade para as demandas e maior proximidade entre setores estratégicos.

“O ministro é ministro das duas áreas em conjunto, dificilmente ele teria outra opinião”, afirma Ildeu de Castro Moreira, presidente da SBPC. “A criação do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação foi uma conquista brasileira depois de décadas de luta, e ele vinha funcionando muito bem. Nós achamos que a fusão não ajudou em nada e trouxe alguns prejuízos. Não se concentrou tanto na ciência quanto deveria.”

“Nós continuamos com a posição de que é mais interessante fazer a separação dos ministérios, já que eles têm objetivos, estruturas e lógicas diferenciadas. É mais justo para o país, pela importância que a área tem. No entanto, nós estamos muito preocupados com uma questão maior de fundo, que é o desmonte do sistema de Ciência e Tecnologia com a redução drástica de recursos.”

O orçamento do MCTI em 2009 era de R$ 7,9 bilhões (R$ 13,4 bilhões em valores atuais). Atualmente o valor disponível é de R$ 4,1 bilhões.

Na abertura oficial do encontro, no domingo (22), estudantes, servidores e pesquisadores vaiaram a participação do ministro da Educação Rossieli Soares da Silva e de representantes do MCTIC e protestaram contra o corte de verbas para os projetos de pesquisa. Também houve manifestações pedindo que o ex-presidente Lula, preso em Curitiba, seja libertado.

Uma dessas manifestações veio [do Acadêmico] Elisaldo Carlini, professor aposentado da Unifesp que recentemente foi chamado a prestar depoimento acusado de apologia às drogas. O especialista em maconha, há mais de 60 anos na pesquisa, foi um dos homenageados dessa edição da SBPC —e o único dentre eles que está vivo.

Os demais foram o físico pernambucano [e membro titular da ABC] José Leite Lopes (1918-2006), que completaria cem anos em 2018, Nise da Silveira (1905-1999), psiquiatra alagoana, e a socióloga Ana Maria Fernandes, morta em maio deste ano, aos 70 anos.

Em sessão comemorativa dos 70 anos da SBPC, realizada na tarde desta segunda (23), Kassab reconheceu perante o público de acadêmicos que falta apoio político para a ciência brasileira.

“Falta apoio político, falta convicção, falta melhor relação com a sociedade para nos ajudar nessa importante missão de mostrarmos para nossas autoridades do campo da economia que eles têm uma visão errada em relação aos resultados que a ciência brasileira pode trazer para a recuperação da nossa economia.”

O físico e ex-presidente da SBPC  Sérgio Mascarenhas [membro titular da ABC] pediu a palavra e disse para o ministro que ele poderia ser o defensor da ciência nacional, já que está dentro da “ditadura civil do governo Temer”.

Vídeo de autoria desconhecida

“A democracia tem muito a ver com a verdade. E a verdade é que há um desgaste completo da ciência. Não só dela, mas da educação, da inovação. Vossa excelência falou que a inovação está crescendo no país, mas ela está sendo destruída por esse governo. Seria uma coisa maravilhosa se vossa excelência pudesse ser o herói dessa luta e representar verdadeiramente [a ciência]. Gostaria que vossa excelência fosse o herói de acabar com esse marco ilegal da ciência [referindo-se ao slide que mostra a queda de investimentos ao longo dos anos]. Falo como um admirador de sua gestão de acabar com o marco ilegal da ciência que nós estamos vivendo.”

O ministro não respondeu a Mascarenhas e saiu para pegar o voo de volta a Brasília. Mais cedo, ele, acompanhado de assessores e servidores do MCTIC, visitou os estandes das diversas entidades que participam do evento, como Finep, Marinha, Agência Espacial Brasileira, Cemaden, Impa, entre outros.