Coluna do publicitário Nizan Guanaes na Folha de S. Paulo dá voz à pesquisadora Lygia Pereira da Veiga.
Viver é compartilhar. Tem muita gente compartilhando ódio, mas tem muita gente compartilhando amor, conhecimento e suas legítimas, respeitosas e respeitáveis opiniões.
Hoje compartilho este nobre espaço com uma grande amiga e cientista brasileira, Lygia da Veiga Pereira, professora titular e chefe do Laboratório Nacional de Células-Tronco Embrionárias da USP.
Lygia e tantos outros cientistas vêm nos alertando sobre a importância da ciência e da tecnologia para o crescimento sustentável da sociedade e da economia brasileira.
Com a palavra, Lygia:
“Ciência não é gasto –ciência é investimento!” Com esse bordão, nós, cientistas, conseguimos pela primeira vez viralizar um vídeo nas redes sociais revelando a situação calamitosa de falta de recursos para pesquisas, que está destruindo a infraestrutura de ciência, tecnologia e inovação construída com muito suor nas últimas décadas.
Fazer ciência por aqui nunca foi fácil. Mas o prenúncio da tempestade atual veio quando o Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (CTI) foi fundido com o das Comunicações, virando a quimera MCTIC.
Desde então, o orçamento para CTI, que já era dos mais baixos, teve corte de 44%, sobrando só R$ 2,5 bilhões para fomentar a atividade.
Mas, com o cobertor tão curto diante da crise fiscal, por que gastar com ciência, tecnologia e inovação? Porque esse trio é justamente a saída mais perene e saudável para garantir uma economia pujante.
Coreia do Sul e Israel, por exemplo, investem 4% do PIB em pesquisa e desenvolvimento (P&D), e hoje, em meu carro coreano, sou guiada por um aplicativo israelense para escapar do trânsito. Aqui, no Brasil, investimos só 1% do PIB em P&D.
Mesmo assim, a ciência brasileira foi capaz de criar uma grande exportadora de aviões, transformar o país na maior potência agrícola mundial, inventar o bioetanol, descobrir que a zika causa microcefalia, extrair mais da metade do petróleo do pré-sal e muito mais. Essas conquistas são fruto de investimentos passados e demonstram a capacidade intelectual e produtiva de nossa comunidade científica quando lhe são dadas as condições adequadas –yes, we can!.
Precisamos de vontade política para tornar educação e ciência prioridades estratégicas para a construção do Brasil melhor. Mas educação efetiva, valorizada, que vá muito além de estatísticas de alunos formados, porém analfabetos funcionais –uma educação que revele os grandes talentos hoje desperdiçados. E ciência levada a sério, com investimentos consistentes, vontade política para desburocratizar a vida dos pesquisadores e a promoção de interações academia-iniciativa privada para que juntos transformemos os novos conhecimentos em produtos.
O orçamento de CTI para 2018 está sendo discutido na Câmara. Corremos o risco de ele ser menor ainda que o de 2017, quando deveria ser maior.
Como dissemos no nosso vídeo, sem ciência, não existe remédio, não existe energia, não existe agricultura, não existe transporte. Sem ciência, não existe conhecimento, não existe solução, não existe cura. Parlamentares, lembrem-se: ciência não é gasto, ciência é investimento”.
Essas são as palavras de Lygia, que eu assino embaixo (e lá em cima). Defendo o ajuste fiscal e reconheço que é muito difícil realizar os cortes necessários dos gastos públicos num país tão carente como o nosso. Infelizmente, não há bancada da ciência no Congresso. Mas a voz dos nossos cientistas precisa ser ouvida.