Sancionado em janeiro do ano passado, após um longo e penoso trabalho da comunidade científica, o Marco Legal da Ciência, Tecnologia e Inovação (C,T&I) – Lei 13.243/16 – ainda aguarda ser regulamentado. Considerado um importante avanço para o desenvolvimento da CT&I brasileira, o decreto ainda divide opiniões no Palácio do Planalto, especificamente junto à equipe dos ministérios da Fazenda e Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG).
“Há três semanas, em reunião na Casa Civil, eu defendi que o Marco Legal da Ciência e Tecnologia não fosse regulamentado. O texto sairia com vetos em três pontos fundamentais”, afirmou o presidente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Mário Neto Borges. Ele participou de mesa-redonda sobre o Marco Legal da C,T&I na tarde de quinta-feira, 20 de julho. O debate fez parte da série de atividades da 69ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira pelo Progresso da Ciência (SBPC), que aconteceu na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Além do presidente do CNPq, estiveram presentes no encontro a ex-presidente da SBPC e Acadêmica Helena Nader; a presidente da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), Ângela Maria Paiva Cruz; o presidente do Conselho Nacional das Fundações de Apoio às Instituições de Ensino Superior e de Pesquisa Científica e Tecnológica (Confies), Fernando Peregrino; e a presidente do Conselho Nacional de Secretários para Assuntos de Ciência Tecnologia e Inovação (Consecti), Francilene Procópio Garcia.
Segundo Borges, o texto do Marco Legal conta com o apoio de integrantes dos ministérios da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), da Educação, além da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). “Todos têm lutado pelo texto que foi apoiado pela comunidade científica e contou também com a participação de empresas”, acrescentou ele.
Borges defendeu que derrubar o decreto depois de aprovada sua regulamentação é sempre pior. “Sabemos disso. A luta é para que tenhamos alguma coisa aceitável, pelo menos”, afirmou. Segundo o presidente do CNPq, o decreto foi discutido no dia 27 de junho, na chamada reunião do Conselhão da Economia. Três pontos do texto têm provocado divergências, impedindo, assim, que a matéria seja regulamentada.
O primeiro deles é a mudança de rubrica, que dá flexibilidade no uso dos recursos aos pesquisadores e acaba com a problemática que envolve a separação entre recursos de capital e de custeio. O segundo, a simplificação do processo de prestação de contas. Este tem esbarrado apenas no entendimento da Advocacia Geral da União (AGU), ao mesmo tempo que conta com o apoio de representantes da Fazenda e do MPOG. Por fim, está a busca pela extinção da obrigação de registro de projetos, contratos e convênios no Sistema de Gestão de Convênios e Contratos de Repasse (Siconv).
Apesar dos esforços, os representantes das instituições de ensino superior pediram celeridade na regulamentação do decreto. Presidente da Andifes, Ângela Maria Paiva Cruz disse lamentar que há um ano e meio da sanção da lei, o Marco Legal da C,T&I ainda passe por dificuldades em algumas instâncias do executivo para ser regulamentado. “O Marco Legal é um avanço importante e diferencial para a ciência e tecnologia brasileira. Ele virá a se tornar a principal marca de impacto nas universidades federais e institutos de ciência e tecnologia do país”, avaliou.
Presidente do Confies, Fernando Peregrino disse ser difícil entender o porquê de uma regulamentação demorar tanto tempo. “A corrida da inovação é de alta velocidade. Precisamos ter pressa para que o Marco Legal seja regulamentado”, observou ele.
Peregrino ressaltou ainda que 35% do tempo de pesquisa é gasto com burocracia. “Estamos construindo um código de conduta junto com a Controladoria Geral da União (CGU), a AGU, o MEC, o MCTIC e o Confies para que seja esclarecido o que é bolsa, o que é taxa de administração, o que é convênio. Precisamos acabar com essa descentralização, onde cada órgão fiscalizador tem um entendimento diferente. Com a burocratização não vamos fazer ciência, tecnologia e nem inovação. É preciso que haja a flexibilização dos processos”, defendeu.
Já a presidente do Consecti, Francilene Procópio Garcia, lembrou que se o Marco Legal já estivesse em pleno funcionamento, possivelmente a economia brasileira estaria em um melhor momento. “Em qual medida o país quer que a ciência, tecnologia e a inovação protagonize a mudança?”, questionou.
“Uma das demandas propostas no Marco já era a busca de uma maior integração entre pesquisa e desenvolvimento com as demanda do setor produtivo. Se temos um investimento que nos aparelha em entes públicos é preciso que ele seja colocado à disposição e que seja resolutivo”, enfatizou ela. “Nós pesquisadores não temos que provar diariamente que não somos desonestos. Precisamos é entregar a solução de um problema que a sociedade se depara”, destacou Francilene.
Para a presidente do Consecti, se a regulamentação do Marco Legal não sair, a comunidade científica vai se mobilizar para que as principais medidas previstas no decreto da União sejam adotadas nos estados. “Buscamos ganhar tempo diante de um atraso imenso. Queremos isso urgentemente, da forma como vier e da maneira como podemos avançar. Não dá para assistir ao país afundando em várias áreas sem impor uma proposta que acreditamos que seja inovadora”, defendeu.