A matéria do jornal o Globo fala sobre a dificuldade de financiamento para a Olimpíada de Matemática e da mudança de decisão da Capes em relação ao concurso. O repórter Renato Grandelle entrevistou os Acadêmicos Hilário Alencar e Marcelo Viana. Ele cita ainda o matemático, ganhador do Nobel de matemática e também Acadêmico Artur Ávila. Confira o texto original:
Uma tradicional competição do ensino público brasileiro enfrentou dificuldades para conseguir verbas este ano. A Olimpíada de Matemática, que contribui para o aprendizado de 26 mil alunos e registrou um número recorde de 50.359 escolas inscritas, ficou sem recursos para o pagamento de bolsas a professores e estudantes. A verba só foi liberada na madrugada de ontem e, ainda assim, será abaixo da expectativa. A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), órgão do Ministério da Educação (MEC), destinará R$ 6 milhões para os programas de iniciação científica ligados ao evento, segundo o MEC. Inicialmente calculava-se que esta quantia chegaria a R$ 7 milhões. A resistência da Capes foi noticiada no último domingo na coluna de Elio Gaspari.
Desde 2005, os seis mil alunos premiados a cada ano com medalhas da Olimpíada (Obmep) têm direito ao PIC (Programa de Iniciação Científica), com aulas com professores universitários. No ano passado, porém, a Capes informou que não daria mais bolsas a professores universitários, financiando apenas o corpo docente do ensino básico.
Com a existência do PIC em risco, o Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada (Impa), organizador da olimpíada desde sua primeira edição, criou um programa de forma e filosofia distintas, o Obmep na Escola, que prepara alunos para o torneio. O projeto seleciona mil professores do ensino básico para que deem aula, em suas escolas, a 20 mil alunos.
Em 2017, a Capes sinalizou que não repassaria verbas para o PIC e que forneceria apenas R$ 2 milhões para o Obmep na Escola. Em vez de 26 mil alunos, a Olimpíada de Matemática contemplaria apenas seis mil.
Procurado durante dois dias, o órgão do MEC não informou por que cortou os recursos para os programas de iniciação científica. Três anos atrás, o PIC chegou a contar com R$ 8,8 milhões.
– O programa cresceu e está cada vez mais difícil obter recursos – explica Hilário Alencar, presidente da Sociedade Brasileira de Matemática. – A Olimpíada tem uma importância crucial. É uma competição que mobiliza a escola inteira, aumenta a atenção dada à disciplina. O governo precisa lembrar que o grande embate na educação do país começa no ensino básico. A criança aprende a falar e, depois, a contar. Esta é uma das prioridades do ser humano, é um componente fundamental para o raciocínio lógico. Se essa habilidade não for dominada, seu progresso pode ser impedido.
PAÍS TEM NOBEL NA ÁREA
Diretor-geral do Impa, Marcelo Viana assinala que as bolsas proporcionam a capacitação de alunos e professores.
– O PIC dá bolsas para os medalhistas. a Obmep na escola qualifica os professores de educação básica, que transmitem o conhecimento para turmas de 20 alunos. São dois programas muito importantes, mas, ainda assim, é um sofrimento para conseguir recursos, ficamos com os cabelos brancos – lamenta. – Os alunos que participam de nosso programa de incentivo têm notas duas vezes maiores do que a média nacional nas Olimpíadas.
O Brasil conta com um vencedor da Medalha Fields, o “Nobel” de Matemática: Artur Ávila recebeu o prêmio aos 35 anos, em 2014. Aos 16, ganhou a medalha de ouro na Olimpíada Internacional de Matemática, superando oponentes de 72 países. Ávila cursou a pós-graduação do Impa e participa do Instituto Serrapilheira, projeto de divulgação científica financiado por João Moreira Salles que doará R$ 350 milhões para a pesquisa nacional. Segundo o presidente do instituto, o francês Hugo Aguilaniu, a matemática está entre os principais triunfos científicos do Brasil e pode ser um diferencial no cenário internacional.
A 13ª edição do programa começa no dia 6 de junho. Pela primeira vez as escolas particulares estarão no torneio. Sua premiação, porém, será à parte, sem a retirada de recursos destinados ao ensino público.
A dificuldade para a obtenção de verbas para a Olimpíada é mais um sinal da dificuldade do governo federal para conduzir programas de incentivo ao ensino básico. No ano passado, o MEC anunciou o fim do Programa Ciência Sem Fronteiras para o ensino fundamental, alegando que o custo para manter os bolsistas era alto.