A comunidade científica paulista continua extremamente preocupada com o impasse sobre a aplicação da LOA 2017 e o desrespeito ao artigo 271 da Constituição Paulista.
Após a indignação da comunidade científica e da imprensa com o ocorrido na semana do dia 23 de janeiro de 2017, o governo ofereceu um acordo para a FAPESP.
Conforme divulgado na imprensa, tal acordo seria que os R$ 120 milhões retirados ilegalmente da FAPESP a ela retornariam, mas de uma forma “carimbada”. Tal “carimbo” seria para que o dinheiro fosse utilizado para auxiliar os Institutos de Pesquisa do Estado de São Paulo, que de fato encontram-se em situação de penúria devido ao abandono por parte do governo.
O sucesso da ciência paulista está em grande parte baseado na ESTRATÉGIA FAPESP: qualidade aliada pontualidade e continuidade. As incoerências do acordo proposto evidenciam a falta de conhecimento da ESTRETÉGIA de sucesso aplicada pela FAPESP desde a sua criação.
A FAPESP, uma instituição que não pode por lei gastar mais do que 5% de sua receita com administração, financia pesquisa científica e tecnológica. Ela é proibida de financiar salários ou projetos de serviços. Serviços podem sim ser financiados, mas desde que a finalidade do projeto seja pesquisa científica e tecnológica. As decisões sobre projetos são feitas com base em pareceres de mérito (qualidade do projeto e currículo dos envolvidos) e não por decisão de um grupo de dirigentes. Projetos recebem pareceres de especialistas e são aprovados ou não de acordo com tais pareceres. Isto é uma proteção do sistema FAPESP contra decisões que poderiam, de outra forma, serem politizadas e com isto direcionar verbas para projetos que levariam ao desperdício de dinheiro público.
Neste sentido, o acordo proposto pelo governo fere alguns preceitos básicos que fazem com que a FAPESP seja tão eficiente.
Um deles é que quando os recursos são repassados, reza o artigo 271 que são “recursos de sua privativa administração”. Portanto, não pode haver um acordo em que o governo interfira em como gastar – o tal “carimbo” – pois ele é também ilegal.
ma vez retornados os R$ 120 milhões que são, de direito, da FAPESP, esta verba deve ser administrada privativamente pela FAPESP. Ou seja, deve ser administrada de acordo com as suas regras que incluem principalmente a análise de mérito pela comunidade científica. Quebrar este preceito, além de ilegal, é um precedente perigosíssimo que põe em risco um sistema de altíssima eficiência, que de fato deveria ser imitado pelo governo ao invés de combatido.
A FAPESP e a ACIESP concordam plenamente que os Institutos de Pesquisa do Estado devam ser recuperados. Eles são uma importante peça na engrenagem da pesquisa científica paulista e podem ser sim uma frente de aplicação importante da ciência paulista.
Os Institutos de Pesquisa Paulistas têm, ao longo dos anos, recebido financiamento da FAPESP para realizar tanto pesquisa básica quanto aplicada. São estas pesquisas básicas de alta qualidade que têm permitido que São Paulo construa as bases de conhecimento necessárias para responder de forma rápida a eventuais problemas, tais como o Zika e as mudanças climáticas.
O problema nos institutos é que suas pesquisas vêm deixando de ser feitas porque o governo não provê o básico: pessoal. A FAPESP, por outro lado, financia pesquisas nestes institutos com um valor alto e vem sim discutindo com eles sobre a implantação de um programa especial para melhorar a infra-estrutura e contribuir para que jovens pesquisadores, com bolsas e não salários, iniciem linhas de pesquisas que possam ser continuadas por muito anos. Mas melhorar a infra-estrutura para quem ? Quais pesquisadores realizarão a ciência e tecnologia esperadas se na medida em que foram se aposentando os que agora estão, não haja substituição para continuidade?
Para atrair nossos mais brilhantes jovens pesquisadores, no entanto, é imperativo que haja a mínima segurança. Por exemplo, o compromisso do governo de que em 3 anos, vagas seriam dadas equivalentes ao número jovem pesquisadores atuando no sistema. Eles assim teriam a oportunidade de fazer concurso e entrar num sistema que esteja em pleno funcionamento, que seja confiável e pujante. Se for oferecido um sistema decrépito, sem liberdade de ideias para pesquisa e sem qualquer possibilidade de concurso, qual o jovem pesquisador que irá aderir ao sistema? Justamente por serem brilhantes e inteligentes, jamais irão participar.
A ACIESP acredita que os R$120 milhões poderiam sim ser usados para os Institutos de Pesquisa, mas dentro das regras da FAPESP e com uma contrapartida do governo do estado, no mínimo, em manter o pessoal e o funcionamento básico das instituições. Investir 2,5 vezes o valor anual que os institutos já recebem, durante um único ano, pode ajudar. Mas é preciso que os planos sejam feitos com muito cuidado e discutidos não só entre governo e Institutos, mas no âmbito da FAPESP, respeitando as leis estaduais e as regras internas da FAPESP. Temos que manter o que funciona bem em nosso estado. Temos que garantir que as próximas gerações de paulistas tenham independência, desenvolvendo suas próprias tecnologias, ajudando a curar doenças de importância para a nossa sociedade, preservando a nossa biodiversidade, produzindo energia limpa, se defendendo dos impactos das mudanças climáticas globais e, principalmente, garantido que a nossa sociedade seja livre e justa.
Academia de Ciências do Estado de São Paulo (ACIESP)
Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC)
Veja o texto original no site da Aciesp.