É fácil notar a influência dos irmãos mais velhos de Kyria Santiago do Nascimento em sua trajetória profissional. Caçula de quatro filhos de um casal de empresários do litoral capixaba, hoje ela é pós-doutora em biotecnologia e membro afiliado da Academia Brasileira de Ciências (ABC) – Regional Norte para o período 2015-2019.
Primeiro laboratório, o mar
Nascida em Vila Velha, no Espírito Santo, a 8 de maio de 1980, Kyria cresceu com a família em uma casa próxima à praia. Recorda-se do fogão à lenha em torno do qual os parentes se reuniam nos finais de semana para cozinhar. Lembra-se especialmente das moquecas capixabas feitas em panela de barro.
Graças à proximidade do mar, a futura pesquisadora pôde estimular seu interesse pela natureza. Acompanhava as irmãs, Polyanna e Kelany (sete e dois anos mais velhas, respectivamente), no surf e nos passeios de barco e o irmão, Hermann (um ano mais velho), mergulhador e caçador submarino, nas expedições, mas, por não ter coragem de matar os peixes, Kyria preferia ficar apenas observando os seres marinhos. Quando emergia, após os mergulhos noturnos, era a vez de contemplar as estrelas no céu do litoral.
A partida da filha caçula
Ao ler a descrição do curso de engenharia de pesca no Guia do Estudante, percebeu que a área abrangia, justamente, os fenômenos naturais que tanto despertavam seu interesse nas aulas de geografia do professor Inácio, do Centro Educacional Charles Darwin de Vila Velha. Estavam decididos o curso e a faculdade – seria a Universidade Federal do Ceará (UFC). “Eu tinha apenas que convencer os meus pais a apoiarem minha saída de Vila Velha com 17 anos para estudar em Fortaleza”, relembra a pesquisadora, que, após muita conversa, conseguiu que aceitassem.
A graduação foi um pouco “traumática”, segundo Kyria. “Muitos professores do curso estavam se aposentando, o que fez com que tivéssemos muitas aulas com professores substitutos e chegamos a ter três professores para a mesma disciplina”, conta.
Sempre buscando aprender
Kyria Nascimento sempre gostou de aprender. Na escola, conta que se interessava por todas as matérias e, mesmo sem precisar, frequentava as aulas de reforço durante as férias.
Na graduação não foi diferente. “Na universidade, acabei me interessando mais pelas atividades de laboratório, pois isso era algo sem limite de conhecimento”, conta Kyria.
“O despertar para a ciência veio quando eu estava na universidade, pois vi que era possível fazer ciência desde cedo. Antes, eu imaginava que isso era algo somente para grandes nomes”, recorda.
Logo depois de se formar, procurou o mestrado e o doutorado. “Toda a minha formação foi na UFC e muito do meu aprendizado foi graças à credibilidade, às oportunidades e aos desafios que o BioMol-Lab (Laboratório de Moléculas Biologicamente Ativas) do Departamento de Bioquímica da Universidade Federal do Ceará me proporcionou”, recorda. “O BioMol-Lab foi minha grande motivação para seguir na trajetória científica e, eu devo toda a minha formação também a ele”, reconhece.
Em 2010, a pesquisadora fez pós-doutorado, também na UFC, e Gestão Empresarial na Fundação Getúlio Vargas.
Quem ama, cuida
O zelo pelos peixes durante os mergulhos no Espírito Santo pode ter antecipado uma das bases da pesquisa à qual a professora Kyria Santiago se dedica atualmente.
Seu trabalho consiste em identificar a presença de lectina em plantas e algas. Quando detectada, esta proteína é isolada, purificada e, então, realiza-se a sua caracterização bioquímica, tornando possível a produção da substância em bactérias utilizando ferramentas de biologia molecular. Essa geração alternativa é chamada “forma recombinante” e permite a preservação da natureza, pois as plantas e algas são apenas utilizadas uma vez na obtenção da lectina.
Após identificar uma proteína, Kyria fornece a substância à equipe da professora Ana Assreuy (UECE), que estuda o potencial anti-inflamatório da moléculas em ratos.
Perpetuando a ciência
Para Kyria, o título de membro afiliado da ABC simboliza o reconhecimento por seu esforço e dedicação e dos que a ajudaram em seu percurso como cientista. “Dessa forma, quero contribuir, não só para a ABC, mas também na formação dos meus alunos para que eles se tornem apaixonados pela ciência e possam perpetuar essa atividade tão prazerosa. “