Cientistas de diferentes entidades da área acadêmica enviaram uma carta à presidente Dilma Rousseff criticando uma possível fusão da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), vinculada ao Ministério da Educação (MEC), com o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, vinculado ao Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI). Eles formularam o documento baseados em rumores de que a reforma ministerial planejada pelo governo pode resultar nessa junção entre os dois importantes órgãos de fomento à pesquisa nacional.
“Esta medida poderá trazer consequências comprometedoras tanto para o sistema de ensino brasileiro, como para o nosso sistema de ciência, tecnologia e inovação. Seria uma medida equivocada sob todos aspectos já que as duas instituições, criadas e desenvolvidas ao longo de mais de seis décadas, têm missões bastante claras e complementares que funcionam como pilares do sistema educacional e científico do País”, informa a nota, que pode ser lida na íntegra aqui.
O documento é assinado pela Academia Brasileira de Ciências (ABC), Academia Nacional de Medicina (ANM), Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores (Anprotec), Associação Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento das Empresas Inovadoras (Anpei), Associação Fórum Nacional de Gestores de Inovação e Transferência de Tecnologia (Fortec), o Conselho Nacional das Fundações Estaduais de Amparo à Pesquisa (Confap), o Conselho Nacional de Secretários para Assuntos de Ciência, Tecnologia e Inovação (Consecti), e também pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).
De acordo com o presidente da ANM, Francisco Sampaio, não é válido o argumento de que a fusão serviria para reduzir custos. Ele diz que a Capes e o CNPq são alguns dos órgãos mais enxutos do Governo Federal no que diz respeito ao contingente de pessoal e que, para reduzir gastos, a União provavelmente cortaria verbas de pesquisa.
– Os dois sistemas funcionam muito bem e são grandes, uma fusão seria um desastre completo, porque seria muito difícil de administrar. O gasto com pessoal é mínimo. O que existe é o gasto com financiamento de pesquisas. Se a fusão das instituições tem como objetivo diminuir o gasto, significa que vão cortar a pesquisa. O dinheiro utilizado na pesquisa não é um gasto, é um investimento. Gasto é quando você tem um ministério onde ninguém trabalha e só recebe- criticou Sampaio.
Segundo o presidente da ABC, Jacob Palis, a iniciativa para a elaboração da carta surgiu quando os grupos souberam, através de pessoas ligadas ao governo, que existia esta possibilidade de fusão:
– Eu liguei para o ministro Aldo Rebelo (da Ciência, Tecnologia e Inovação), que sempre foi muito atencioso com a gente, na mesma hora que tive essa informação. Ele me informou que falou com a presidente e que estava afastada essa hipótese. Acredito que ele esteja trabalhando firme para que isso não aconteça.
A nota assinada por todos os grupos mostra preocupação com as consequências que este movimento pode causar.
“Mexer nessas estruturas é fragilizar um dos alicerces – talvez o mais importante deles – de sustentação do Brasil contemporâneo que mira um futuro promissor para todos os brasileiros”, informa.
As associações resolveram fazer a nota para ratificar a necessidade da independência das duas agências governamentais.
– O fato dessa junção é muito séria para nós. Mesmo na dúvida, nós resolvemos escrever a carta. Certamente, se acontecer, será muito ruim. São focos diferentes. O CNPq tem foco em recurso para as pesquisas. A Capes, em pessoas. Tem uma parte em comum, que se complementa, mas, na origem, são focos diferentes – analisa Palis.
Em nota, o CNPq, ao reconhecer e agradecer o apoio das entidades que assinam o referido documento, ressalta sua bem-sucedida história de mais de seis décadas de atuação que, somadas às atuais ações, garantem sua inserção independente no Sistema de ciência, tecnologia e inovação nacional.
“Além disso, o CNPq não só atua como órgão executor de políticas de C,T&I do MCTI, como também contribui na formulação de políticas públicas para o setor. Políticas, essas, sempre traçadas em transparente parceria com a comunidade científica e empresarial brasileiras”.
Procurados, o MEC afirmou que era necessário entrar em contato com a Capes. A assessoria da Capes afirmou que não comentará a carta. O Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação não se manifestou.