O Nobel é considerado o prêmio mais prestigiado do mundo, mas, para a israelense Ada Yonath, vencedora na categoria Química em 2009, outra homenagem que ela recebeu teve mais importância: o prêmio de “Avó do Ano”, dado pela neta pré-adolescente. “Ela disse que eu tenho que me provar merecedora dele todo ano. Esse é o único prêmio que eu posso perder”, brincou a cientista, provocando gargalhadas na plateia que lotava o auditório no último dia da Reunião Magna da ABC, em uma palestra simpática e bem-humorada.
Ada Yonath é a única mulher entre os 12 ganhadores do Prêmio Nobel em Israel. Juntamente com os cientistas Venkatraman Ramakrishnan e Thomas Steitz, foi responsável por revolucionar os estudos sobre a estrutura e o funcionamento do ribossomo e por possibilitar avanços no desenvolvimento de antibióticos mais eficientes.
Os ribossomos são estruturas presentes em todos os tipos de células, que têm como principal função a síntese de proteínas que serão usadas em processos internos celulares. Ao determinar a estrutura dessa partícula celular multicomponente, foi possível explicar o mecanismo do processo de tradução do código genético, executado pelo ribossomo. Isso permitiu o descobrimento dos modos de ação da maioria dos antibióticos que têm o ribossomo como alvo, bem como as bases da resistência bacteriana a eles.
O desenvolvimento da medicina e o aumento dos cuidados com a higiene foram cruciais para o aumento da expectativa de vida no último século – nos Estados Unidos, entre 1900 e 2003, a expectativa de vida das mulheres subiu de 48.3 para 80.1 e dos homens, de 46.3 para 74.8. No entanto, esse crescimento também aconteceu por conta do surgimento dos antibióticos. Ainda assim, após uma década de um aumento expressivo, esse índice estagnou. A razão foi o aparecimento da resistência das bactérias a esses medicamentos.
Pesquisadora no Instituto Weizmann de Israel, Ada contou que as bactérias intestinais dos Ianomâmis, povo indígena habitante da América do Sul, já desenvolveram um leque diversificado de genes resistentes a antibióticos, mesmo que essas pessoas nunca tenham ingerido medicamentos. “Isso sugere que os micróbios têm desenvolvido a capacidade de lutar contra toxinas, incluindo antibióticos, e que combater a resistência às drogas pode ser mais difícil do que os cientistas pensavam.”
Mais de 40% do uso clínico de antibióticos têm como alvo a biossíntese de proteínas, principalmente pela paralisação do ribossomo. Ada explicou que as proteínas executam quase todas as funções celulares – desde as requeridas para a respiração e digestão até as que respondem à pressão (choque térmico, falhas no coração e até mesmo ciscos no olho). Elas são longas cadeias feitas de aminoácidos, cuja sequência é determinada pelo gene que codifica esta proteína, concebendo, assim, a sua função específica.
Os ribossomos são universais e funcionam de maneira muito similar nas células, independentemente de sua origem. Eles agem continuamente formando ligações peptídicas (entre os aminoácidos) e dificilmente cometem erros – cerca de um em 1 milhão. “Ribossomos são as fábricas universais que produzem proteínas decodificando a informação genética em todas as células vivas”, destacou Ada Yonath. Em seguida, ela exibiu um vídeo que mostrava o funcionamento do ribossomo e seu envolvimento com o t-RNA (transportador) e o M-RNA(mensageiro) na produção de proteínas.
A química mostrou também como pequenos antibióticos paralisam ribossomos gigantes. “Todos eles inabilitam pelo menos uma função.” A tetraciclina, por exemplo, ocupa a posição do t-RNA. A eritromicina bloqueia o túnel de saída da proteína e interfere, assim, na progressão da proteína nascente. A clindamicina obstrui a formação da ligação peptídica. “Tão simples, tão esperto”, comentou.
A resistência aos antibióticos é um dos maiores problemas na medicina moderna. Mas, na opinião de Ada Yonath, não seremos capazes de combatê-la completamente por uma razão: “As bactérias querem viver!”. Uma forma de lidar com o problema que vem sendo trabalhada é a combinação de dois compostos, promovendo o sinergismo de antibióticos, mas cuja desvantagem é o fato de ser tóxica.
Outra alternativa seria a elaboração de medicamentos específicos para cada patógeno, distinguindo-os de espécies de bactérias úteis no microbioma humano, de modo a preservá-lo, e não apenas minimizar a resistência. “Estamos fazendo uma revolução no campo dos antibióticos”, afirmou, animada, a cativante cientista.