O Instituto Ayrton Senna (IAS) lançou nesta quinta-feira (14/05), em São Paulo, o eduLab21, que é um laboratório de inovação dedicado à produção e disseminação de conhecimento científico para a formulação de políticas públicas para uma educação de qualidade. O laboratório reúne uma rede multidisciplinar de parceiros ao redor do mundo, entre universidades, pesquisadores, fundações e organizações internacionais.
Além da presidente do IAS, Viviane Senna, o evento contou com a presença de diversos parceiros, entre eles, os economistas Ricardo Paes de Barros (Instituto Ayrton Senna e membro titular das ABC) e Daniel Santos (Universidade de São Paulo) e os psicólogos Filip de Fruyt (Universidade de Ghent, Bélgica), Oliver John (Universidade da Califórnia, Berkeley) e Ricardo Primi (Universidade de São Francisco).
Durante a abertura do evento, Viviane Senna explicou que a educação brasileira precisa mesmo avançar. “Nós tivemos uma revolução científica gigante nos últimos anos e essa revolução entrou na vida das pessoas em todos os sentidos, na maneira de viver, de trabalhar, de se relacionar, de se comunicar. Ela só não entrou na educação. A educação continua parada no século XIX, alheia a essas mudanças. As aulas são dadas da mesma forma. As regras continuam as mesmas, como a maneira de ensinar e aprender. E quando se fala em fazer uma escola para o século XXI, muitas pessoas pensam em colocar tecnologias dentro da sala de aula, como tablets, smarthpones, por exemplo. Mas a ciência vai muito além. Acreditamos que a ciência possa nos ajudar a melhorar a educação, a melhorar as técnicas de aprendizagem, as políticas públicas”, afirmou.
Segundo Viviane, o eduLab21 irá fazer com que as informações produzidas por todas as ciências ajudem as crianças a enfrentarem o século XXI, já que existem conhecimentos importantes que devem ser aproveitados. Para melhorar a qualidade da educação, o IAS vem investindo em iniciativas de aproximação entre cientistas e gestores públicos de educação. “Há 20 anos, o Instituto trouxe para a educação dois paradigmas que não existiam na época, o da escala e o da eficiência, que são princípios da economia e da administração moderna. O que nós queremos fazer agora é trazer as outras ciências para a educação, a psicologia, as neurociências, todas as que puderem apoiar políticas públicas que preparem as crianças para o século 21″, completa Viviane Senna ao lembrar que o Instituto já está trabalhando em parceria com a Rede Nacional de Ciência para a Educação (Rede CpE), que conta com neurocientistas, que irão usar informações produzidas pela área em favor da educação. Mas queremos mais”, enfatizou.
Para Ricardo Paes de Barros, economista-chefe do Instituto Ayrton Senna e um dos líderes do eduLab21, esse descompasso entre o que o mundo exige e o que a escola oferece é uma das principais causas da falta de engajamento dos jovens com a educação. “Quase um milhão de jovens abandonam a escola durante o ano letivo no Brasil. A gente acha que isso tem muito a ver com uma escola do século 19 sendo apresentada para alguém do século 21”, afirma.
O laboratório contará com dois polos de trabalho para produção e disponibilização de conhecimento científico para a formulação de políticas públicas baseadas em evidência. A função de produção de novos conhecimentos será conduzida por uma cátedra na Universidade de Ghent, na Bélgica, coordenada pelo psicólogo Filip de Fruyt. A função de “tradução” e “customização” desses conhecimentos para apoiar o desenho de políticas públicas será conduzida pela Cátedra Instituto Ayrton Senna e pelo Núcleo de Pesquisas Ciências para Educação no Insper, ambos coordenados pelo economista-chefe do Instituto Ayrton Senna, Ricardo Paes de Barros.
A iniciativa
A diretora do eduLab21, Tatiana Filgueiras, explicou que o eduLab21 quer fazer duas pontes, uma entre as ciências que estão desconectas, e a outra entre essas ciências e a educação pública. “Hoje na escola o aluno tem acesso ao o conhecimento todo compartimentado. A gente tem as disciplinas que não são integradas entre si. Isso reflete na forma de como estamos tentando resolver os problemas da educação no Brasil. A gente conversa com economista, separado do que a gente conversa com o psicólogo. Do mesmo jeito que a gente acredita que na educação do século XXI deve haver uma interconexão entre as disciplinas escolares, já que ninguém no mundo se depara com problemas de uma disciplina só. No século XXI a gente se depara com problemas complexos, a escola está de costas para isso”, explica. Por isso, completa, “o eduLab21 quer juntar todo o conhecimento produzido por diversas áreas, como por exemplo pedagogia, neurociência, economia, psicologia, entre outros, e disponibilizar essas informações para que os secretários de educação possam melhorar a políticas de educação que eles têm desenhado”.
Tatiana disse que o eduLab21 já conta com seis secretários estaduais de educação que vão trabalhar juntos, sendo que um deles é o presidente do Conselho dos Secretários de Educação (Consed). Segundo ela, o Laboratório tem sentido reciprocidade dos secretários, porque eles têm percebido que a forma que têm tentado resolver alguns problemas, nem sempre os ajuda a alcançar os resultados esperados”, afirma. Para ela, é preciso acelerar a velocidade com a qual estamos conseguindo melhorar a educação do Brasil. “Esta é uma aposta, estamos conseguindo colocar eles em contato com o que de melhor tem sido feito no Brasil e no mundo”.
A diretora do eduLab2 explica ainda que a iniciativa começa com oito projetos que vão ser colocados em prática e uma parceria com a rede do Rio de Janeiro, onde algumas ideias já estão em prática.
Quanto às universidades, Tatiana explica que a parceria com a Universidade de Ghent vai dar oportunidade de se comunicarem e trabalharem com pesquisadores do mundo todo. “No nosso comitê diretivo temos pessoas especialistas que são consultores da própria OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), que faz o Pisa. Então estaremos lado a lado, com especialistas de ponta. O Brasil não pode se dar o luxo de não trabalhar com as informações que já existem. Ainda temos um atraso grande para saldar”.
Ela explica também que o eduLab21 já conta com dois projetos mais acelerados, um deles é o do Rio de Janeiro “Modelo de educação inovadora do ensino médio”, onde o eduLab21 já colhe frutos. E o outro, acontecerá no segundo semestre, em Santa Catarina. Lá iremos desenvolver um instrumento junto com a OCDE para mensurar criatividade, pensamento crítico e resolução de problemas, que são as três competências para o século XXI”.
Conhecimento aplicado
Como explica Paes de Barros, o diferencial do trabalho do laboratório é a aplicação do conhecimento. “Nada disso é desenvolvido sem ter uma escola, sistemas educacionais envolvidos. Nós estamos trabalhando com Rio de Janeiro, Ceará e Santa Catarina em coisas muito específicas, algumas tratam do sistema educacional como um todo, outras da unidade escolar e outras dentro da sala de aula”.
Para garantir que os projetos do laboratório sejam concebidos e conduzidos de maneira a responder aos principais problemas enfrentados pelas re
des públicas de educação no Brasil, o laboratório conta com um Conselho Consultivo formado por gestores de educação e que atualmente conta com seis secretários estaduais de Educação (atuais secretários do Acre, Ceará, Goiás, Pernambuco, Rio de Janeiro, Santa Catarina).
des públicas de educação no Brasil, o laboratório conta com um Conselho Consultivo formado por gestores de educação e que atualmente conta com seis secretários estaduais de Educação (atuais secretários do Acre, Ceará, Goiás, Pernambuco, Rio de Janeiro, Santa Catarina).
Para Fred Amancio, secretário de Educação de Pernambuco e membro do Conselho Consultivo, esse diálogo entre gestores e cientistas é fundamental para a construção de “uma nova escola” para o “novo jovem”. “O principal papel dos secretários de Educação no Conselho será promover a aproximação do trabalho desenvolvido pelo eduLab21 do dia a dia das salas de aula e da construção das políticas públicas”, afirma.
Competências socioemocionais
Um dos pontos importantes destacados durante a apresentação do economista Paes de Barros é que outro desafio para dar saltos de qualidade no ensino público é a construção de avaliações em larga escala, confiáveis para verificar as habilidades socioemocionais – que incluem um conjunto de comportamentos e sentimentos individuais como uma espécie de padrão constante ou tendência de responder de determinada forma em determinados contextos e situações cotidianas, como ao gerenciar as próprias emoções ou tentar atingir um objetivo – desenvolvidas, e o impacto delas sobre a vida dos alunos.
Segundo ele, esta nova rede deve procurar responder “Quais são as competências mais relevantes?”, “Como podem ser mensuradas e de que forma é possível estimar a medida potencial e desenvolvida de cada habilidade?”. Ao mostrar algumas pesquisas, ele afirma que “na escola, as diferenças das competências sociemocionais explicam mais que o dobro do desempenho das crianças, do que as diferenças em ambiente familiar ou sociodemográficas. Tudo isso me leva a crer, que talvez, o fraco desempenho educacional brasileiro esteja relacionado às competências sociemocionais e no fato de que algumas crianças conseguirem desenvolver e outras não”, explica.
Para Tatiana, cientistas e até mesmo professores já reúnem conhecimentos sobre essas competências e sobre seu potencial de contribuir para a melhoria da qualidade da educação, mas ainda de forma pouco articulada entre si e com os gestores. “Queremos compartilhar ideias que podem até não ser novas para quem faz ciência, mas certamente podem gerar inovação para quem desenha e implementa as políticas educacionais”, afirmou.
Na opinião de Tatiana, um dos pontos essenciais para acelerar o aprimoramento da qualidade da educação no país passa por uma articulação entre o trabalho realizado pelos responsáveis por desenvolver e gerir as políticas públicas e quem atua diretamente nas escolas, além de oferecer uma formação específica para os docentes. “Queremos compartilhar ideias que podem até não ser novas para quem faz ciência, mas certamente podem gerar inovação para quem desenha e implementa as políticas educacionais”, afirmou.
Para Tatiana, as competências sociemocionais podem ser estimuladas intencionalmente na escola. “Já foi divulgado pelo Pisa que os alunos que mais aprendem matemática são os que mais têm persistência. Muitas vezes para o aluno ir bem na escola não requer só inteligência, mas sim competências sociemocionais. As atitudes da família podem modificar o resultado/desempenho da criança. Por exemplo, um pai que estimula o filho a estudar faz com que a criança tenha mais disciplina, foco na escola, e isso é mais poderoso para que a sua nota melhore, do que a sua própria inteligência. Essa informação faz com que todos se responsabilizem. Se ciência nos mostra que atitude do pais e professores interfere nas características socioemocionais dos alunos, isso está na mão de todo mundo que lida com a criança. A gente sai do desculpismo. Ou seja, todos têm o poder”.