”O principal desafio das universidades brasileiras é formar pessoas inovadoras”. Assim, o diretor da Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii) e membro da Diretoria da Academia Brasileira de Ciências, João Fernando Gomes de Oliveira, iniciou sua fala no Simpósio Internacional sobre Excelência na Educação Superior, realizado nos dias 22, 23 e 24 de setembro na sede da ABC.

A universidade precisa ter excelência para cumprir a missão de produzir conhecimento de ponta e para desenvolver o país. Segundo Oliveira, é necessário um ambiente de aprendizagem onde os alunos possam ”interagir com a pesquisa e as empresas através de desafios”.

O secretário executivo do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e Acadêmico Álvaro Prata, que também palestrou no Simpósio, acredita que para alcançar a excelência a universidade precisa ter envolvimento com a indústria. Prata enfatizou que falaria sobre sua experiência como ex-reitor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Ele destacou mudanças que deram certo em relação ao curso de engenharia da UFSC.

Ao falar sobre engenharia, Prata percebeu uma série de particularidades das universidades brasileiras que mostram a capacidade de reagir e reverter quadros desfavoráveis. Um exemplo de situação desfavorável que as instituições de engenharia vivem é a falta de experiência na profissão por grande parte dos professores, dado que a maioria dos que ensinam nas universidades nunca exerceram a profissão de engenheiro.

”A engenharia se assemelha muito à medicina. Quanto mais biologia e química, melhor. Mas estudar muita biologia e muita química não significa tornar-se um bom médico. Como também saber muita física e muita matemática não quer dizer que o aluno seja um excelente engenheiro. O engenheiro e o médico precisam solucionar problemas, e para isso é necessário praticar”, argumentou Prata. Em sua visão, para se formar bons engenheiros a universidade deve se apoiar no setor industrial, algo que normalmente não acontece.

A falta da prática em cursos de engenharia também é um fator que leva a evasão dos alunos, principalmente no início do curso. Atualmente, somente 6% dos estudantes que se formam são bacharéis em engenharia.

Para mudar esse quadro, a UFSC apostou em dois novos modelos de cursos de engenharia.

 

Engenharia de materiais

O curso de engenharia de materiais busca corrigir o problema da falta de experiência na área através de uma estrutura que faz com que, durante todo o curso, o aluno estude e pratique. De acordo com Prata, ”assim que o estudante é matriculado, ele lida especificamente com a disciplina de engenharia de materiais. O aluno tem a prática, mas também a física e a matemática”.

O curso tem uma grade flexível e é dividido em trimestres. Nos primeiros quatro trimestres, o aluno apenas aprende a teoria. A partir do quinto trimestre, começa uma alternância: um trimestre de estágio na indústria e outro na universidade.

”É um curso muito diferente e que dá trabalho. Não se pode deixar o estudante solto. Mas o aluno ganha experiência no ambiente industrial, passando por diferentes setores, como também na administrativa e na gerencial. Além disso, o estudante aprende a trabalhar em equipe e a propor soluções para problemas na empresa. Esse sistema de aprendizado motiva o aluno a se dedicar mais ao curso”, contou Prata.

Essa experiência não é nova. A Universidade de Waterloo (UW) e a Universidade de São Paulo (USP) criaram cursos com esse tipo de sistema em 1957 e 1989, respectivamente. Atualmente, o curso de engenharia de materiais da UFSC conta com 355 alunos matriculados. A evasão atinge 11% do total de matrículas nos primeiros quatro trimestres. A partir do quinto trimestre esse valor cai para apenas 2%.

 

Engenharia da mobilidade

Outra experiência que Prata considera ”muito criativa” é o sistema de ensino do curso de engenharia da mobilidade. Criada em 2009, a graduação permite que os alunos passem por três ciclos. O primeiro, de dois anos, ensina disciplinas básicas de engenharia, enquanto o segundo, de um ano, foca em eixos específicos: veicular ou transportes. Os últimos dois anos são destinados à ênfase em outras sete áreas: mobilidade aeroespacial, automotiva, ferroviária e metroviária, mecatrônica, naval, infraestrutura e transportes e logística. Mesmo antes desta última fase – com apenas três anos de curso -, o estudante pode sair da faculdade como bacharel interdisciplinar em mobilidade.

A graduação em engenharia da mobilidade na UFSC começou em 2004, e tem atualmente 400 alunos matriculados. Para Prata, o curso é um exemplo do que as universidades devem seguir. ”A engenharia convencional envelheceu e a engenharia civil perdeu a identidade. A proposta do curso de engenharia da mobilidade é formar um profissional mais plural. É exatamente o que o mercado precisa, mas o que as instituições ainda têm dificuldade de fazer”, afirmou.

Apesar dos obstáculos que a educação superior precisa transpassar, Prata acredita que o Brasil já deu sinais de que pode ter um ensino de excelência. ”Tenho muito otimismo em relação ao nosso país. Sobretudo, porque somos muito jovens em tudo. Um dos grandes casos de sucesso, por exemplo, é a agricultura. O Brasil foi o único país do mundo que fez uma revolução na agricultura. Também melhorou o sistema energético, diminuiu o desmatamento da floresta Amazônica… É um país que deu certo. Por esse e outros exemplos de sucesso é que precisamos ser guardiões da nossa qualidade de reagir e melhorar”, declarou Prata.