As mudanças climáticas já começaram a acontecer, e são um sinal de que as atividades do homem estão indo além dos limites do planeta. As discussões globais sobre meio ambiente e sustentabilidade avançam pouco, porque é difícil chegar a um consenso entre todos os países. Diante desse cenário de crise, o secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), Ban Ki-moon, propôs a criação da Rede de Soluções para o Desenvolvimento Sustentável (Sustainable Development Solutions Network – SDSN, na sigla em inglês), que tem como um dos líderes o engenheiro florestal Virgílio Viana (foto ao lado), que apresentou a iniciativa durante a 66ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), em Rio Branco, no Acre.
Segundo o palestrante, que já atuou como secretário estadual de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável do Amazonas, a rede é um movimento para estimular os países pioneiros, e não os retardatários. “Se um país caminhar, o outro fica para trás e vai se incomodar”, afirmou. Viana assumiu o cargo de co-presidente da SDSN a pedido do economista norte-americano Jeffrey Sachs, coordenador global da rede.
Sobre a situação ambiental, Viana alertou que “estamos mais próximos do cenário catastrófico do que do razoável”. Em 2010, por exemplo, o planeta lançou na atmosfera 51 bilhões de toneladas de CO2, quando a meta era que as emissões se mantivessem em cerca de 44 bilhões de toneladas. “Por um lado isso é positivo, porque significa redução da pobreza. Ainda assim, estamos aumentando a demanda no momento em que deveríamos diminuir as emissões.”
A região Norte é um dos lugares onde as mudanças climáticas são perceptíveis. Há quatro meses, o Acre foi afetado por uma grande cheia do Rio Madeira, em Rondônia, enquanto o Rio Amazonas já sofre com secas. “A frequência de eventos extremos tende a aumentar – e está, de fato, aumentando.” Os oceanos, que correspondem a 2/3 da Terra, estão em situação ainda pior que das florestas desmatadas, segundo Viana. Além disso, são lançados anualmente dois bilhões de litros de agrotóxico em solos e rios, o que acarreta a perda da biodiversidade.
O preocupante ponto de não-retorno
Ele usou o conceito de resiliência, da biologia, para falar sobre a capacidade de um sistema de reestabelecer seu equilíbrio após um distúrbio e informar que estamos próximos ao ponto de não-retorno, ou seja, do limite do planeta. Passado esse ponto, ele não consegue mais se recuperar. “Pense no boneco João Bobo, em que você dá um tapa, ele vai e volta. Mas, se estiver meio danificado, com um furo, você dá um tapa e ele não volta mais.” Em outras palavras, estamos ultrapassando o espaço seguro para a humanidade crescer.
O trabalho a ser feito para evitar essa situação é enorme. Superintendente-geral da Fundação Amazonas Sustentável, Viana deu o exemplo do Estado. Ele mencionou um levantamento feito com 7.260 famílias, que demonstra que a região sofre com problemas básicos de saúde pública – a maioria, por exemplo, não tem banheiro – e 92% das pessoas jogam resíduos sólidos nos rios.
Viana destacou, ainda, que do total de emissões de gás do efeito estufa, 25% vêm da agricultura. “Há um espaço enorme para reduzir esse número, o problema é conseguir fazê-lo com inclusão social.” Isso porque, com o crescimento da população mundial, é preciso aumentar a produção de alimentos em 70% até 2050. Como garantir esse aumento e, ao mesmo tempo, desmatar menos – a pecuária é responsável por mais de 80% do desflorestamento da Amazônia – é o grande desafio.
Os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável
É por causa desse cenário preocupante que os 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), que substituirão os oito Objetivos do Milênio (ODM) após 2015, é mais amplo e tem dimensões sociais, econômicas e ambientais, enquanto o foco dos ODM era a pobreza. “Educação, direitos humanos, tudo está bem incorporado nos ODS, que foi muito mais participativo”, opinou Viana.
“É preciso botar a mão na massa, aprender a fazer as coisas de fato e não se limitar à educação teórica e distante”, disse o engenheiro. Por isso, completou Viana, está sendo organizado, junto com a Academia Brasileira de Ciências (ABC), o seminário “Ciência para a erradicação da pobreza”, que será realizado em Manaus, no mês de dezembro. “Temos que identificar as soluções e fazer com que as políticas públicas sejam mais eficientes. O Brasil gasta mal os recursos nessas ações.”
No debate, a professora da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), Marilene Corrêa, sugeriu que, dentro do seminário em parceria com a ABC, seja feito um simpósio especial sobre os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, de modo a criar uma visibilidade para que o tema seja trabalhado na próxima Reunião Anual da SBPC.
Durante a discussão, os participantes concordaram que é preciso trabalhar essa temática com uma nova abordagem. Virgílio Viana comentou que, por conta disso, está sendo elaborado o currículo de um curso de desenvolvimento sustentável na Universidade Estadual do Amazonas (UEA). “Para tratar deste assunto, não basta um engenheiro ou um profissional de saúde; é preciso que ele tenha de tudo um pouco. Aí está a multidisciplinaridade.”
O diretor científico da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) de Rondônia e Acadêmico, Luiz Hildebrando, acrescentou que nenhum dos modelos de ciência e tecnologia atuais é em beneficio da população local da Amazônia. “Sem o processo de pesquisa investido na inovação da região, não vamos ter um desenvolvimento sustentável que seja acessível.”