Stephen Patrick Walborn é físico nos tempos atuais, mas quando criança era “engenheiro”. Nascido e criado em Reading, Pennsylvania, nos Estados Unidos, ele usava as ferramentas do pai e materiais que achava em lugares aleatórios, como a praia e o lixo, para construir coisas – por exemplo, barcos de madeira e isopor com os quais “navegava na rua” como um jangadeiro sempre que chovia, já que o lugar em que morava costumava alagar.
Ele gostava tanto de brincar na floresta quanto de “pegar onda” no mar. No início, usava uma prancha de isopor, depois ganhou uma de bodyboard e, eventualmente, de surfe. Walborn também gostava de praticar snowboard desde que o esporte foi inventado, mas como o equipamento se desenvolvia bastante de ano e ano, ele fazia os seus próprios utensílios. Além disso, construía rampas de skate, outra atividade que também praticava.
“Eu brincava de inventor quando era pequeno”, recorda o jovem cientista. “A minha mãe era uma pessoa muito criativa e habilidosa, sempre fazia muitos projetos como as próprias mãos e me influenciou bastante. Quando criança eu já usava a máquina de costura dela para fazer roupas.” Ela era dona de uma loja de equipamento de tênis e seu pai era chefe de uma empresa da família, que produzia asfalto. Walborn também tem uma irmã um pouco mais nova, que se formou em ciência ambiental e, atualmente, é fazendeira.
O caminho até a física
Na escola, não era diferente e gostava de tudo um pouco: literatura, história, matemática, ciência, espanhol, programação de computador, educação física, wood shop e metal shop (aulas típicas dos colégios norte-americanos que ensinam a trabalhar com madeira e metais). Mas foi justamente o interesse por inventar e construir coisas que fez com que Walborn fosse atraído pela ciência.
No entanto, o caminho até a carreira acadêmica não se deu de forma simples. Até se formar em física pela Reed College em Portland, Oregon, Walborn passou por três cursos diferentes. No colégio, nos verões e durante a faculdade ele trabalhava como carpinteiro e pedreiro. Durante a segunda faculdade (Albright College, em Reading), ele se divertia aprendendo a soldar e trabalhar com metais na oficina do tio em tempo integral. Eventualmente, acabou abandonando o curso e se dedicando apenas ao trabalho. “Um dia eu estava fazendo instalações de ventilação numa fábrica de baterias de carro, um ambiente horrível. Olhei para os funcionários desta fábrica, que trabalhavam lá a vida inteira e pareciam mortos vivos, e pensei que estava na hora de voltar a estudar.”
Um ano depois, Walborn começou o curso em Reed College. Antes, ele estava trabalhando em uma estação de esqui “para poder praticar snowboard o tempo inteiro” e, através de um amigo, conheceu um aluno de física daquela faculdade, que estava construindo um laser adequado para fazer um condensado de Bose-Einstein. “Eu já me interessava por física e acho que foi nesta conversa que descobri que existia pesquisa, ou pelo menos que era algo que eu gostaria de fazer.” A Reed College o atraiu por ser conhecida como um lugar que fomenta o “pensamento alternativo”.
A pós-graduação no Brasil
No último ano do curso, começou a pensar em pós-graduação fora dos Estados Unidos e, conversando com um professor brasileiro de Reed College, Osiel Bonfim, considerou a opção de fazer mestrado na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), onde ainda teria a chance de aprender português. Em julho de 1998, o norte-americano chegou em Belo Horizonte.
Walborn conta que teve a sorte de conhecer pessoas muito importantes na sua formação, como a falecida Acadêmica Maria Carolina Nemes e o professor que o orientou, Carlos Monken, que o estimulou a estudar óptica quântica experimental. Outro membro afiliado, Marcelo Terra Cunha, com quem participava de um grupo de estudos, também o ajudou: “O meu mestrado foi feito em colaboração com ele, que é um excelente cientista e pessoa, e a melhor fonte de informação quando se enfrenta um problema de matemática”.
No laboratório, Walborn ficou impressionado com a forma de fazer ciência de ponta com menos recursos, comparado a outros países, de modo que sempre é preciso buscar alternativas. “Ainda há os atrasos de importação de no mínimo três meses, então é difícil competir com os melhores grupos do mundo.” Segundo o físico, fora do Brasil o experimentalista pode se perguntar “qual equipamento preciso comprar para fazer o experimento que quero”, enquanto no Brasil ele questiona “que experimento posso fazer com o equipamento que tenho”. “Na UFMG, vi os pesquisadores superando estes problemas com criatividade e imaginação, que é algo que admiro muito”, relata o jovem cientista.
Aplicações da informação quântica
Apesar de um começo difícil, em que não dominava o idioma, não tinha amigos e estava longe do mar, Walborn foi se adaptando ao novo país e, ao terminar o mestrado, decidiu não voltar para os Estados Unidos, que era o plano inicial. Estendeu para o doutorado com o professor Monken, ainda na área da óptica quântica experimental. Depois, seguiu com o pós-doutorado na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), orientado pelo professor Paulo Souto Ribeiro. “Novamente tive sorte de achar um grupo de excelentes pessoas”, comenta. Em 2006, Walborn passou num concurso do Instituto de Física da universidade, onde atualmente é professor adjunto.
A óptica quântica é o estudo de propriedades quânticas da luz. Nos últimos 30 anos, descobriu-se que as propriedades quânticas da luz e da matéria podem ser aproveitadas para realizar tarefas que são impossíveis ou difíceis com recursos clássicos e, assim, nasceu a informação quântica, área de pesquisa que une a física quântica à teoria da informação e é o campo de estudo de Walborn. “Muitos dos dispositivos de computação disponíveis hoje, como o transistor, funcionam graças à física quântica.”
Além de computação, as propriedades quânticas da luz podem ser usadas para tarefas de comunicação, como a criptografia, que Walborn afirma ser o único método de enviar informação confidencial em que a segurança é garantida pelas leis da natureza. Ele trabalha especificamente com “fótons gêmeos”, que têm suas propriedades amarradas ou correlacionadas. “Desta forma, ao se medir uma propriedade de um fóton – o seu momento, por exemplo, se descobre o momento do outro.”
A bela relação entre física e natureza
O físico conta que é fascinado pela interface entre teoria da informação/computação e a natureza. “Acho muito interessante esta pesquisa que identifica processamento de informação no DNA, buracos negros, dinâmica de populações.” Ele se encanta pela história do desenvolvimento do computador, que começou mecânico, tornou-se eletro-mecânico e, eventualmente, eletrônico. “Sinto-me afortunado de estar conectado de alguma forma ao próximo passo desta evolução.”
Walborn, que passa a integrar o quadro de jovens cientistas da Academia para o período 2014-2018, afirma que “se sente honrado em ser membro afiliado da ABC”. Os esportes continuam fazendo parte da sua vida e, atualmente, sua nova paixão é o stand-up paddle, chegando até mesmo, algumas vezes, a ir acampar com a bagagem amarrada na prancha.

“Em pé na prancha, tenho uma visão diferente do mar e o ritmo da remada tem um efeito meditativo”, conta o cientista que, mesmo nos momentos de lazer, não abandona a física. “Às vezes, quando há pouco vento, é possível ver a interferência/ refração/ difração das ondas no mar”.
E ele explica por que vê essa relação de forma tão peculiar: “A natureza é muito bonita e um fenômeno de física quântica pode ser belo da mesma forma que um pôr do sol. Estudamos muitos anos para poder reconhecer esta beleza nos resultados experimentais e em equações.”