Reunidos na Inglaterra, em Chicheley Hall, construção do século XIII de propriedade da Royal Society, os membros afiliados e ex-afiliados da ABC Alexandre Aleixo (MPEG), Daniella Bartholomeu (UFMG), Gisele Olimpio (UFBA), Lázaro Padilha (Unicamp), Leda Castilho (UFRJ) e Ricardo Fujiwara (UFMG) integraram, com outros 50 jovens cientistas de excelência do Brasil, Chile e Reino Unido, o seleto time que interagiu por três dias sobre temas estratégicos. O evento, intitulado “UK-Brazil-ChileFrontiers of Science”, foi realizado por uma parceria entre a Royal Society, a Academia Brasileira de Ciências e a Academia de Ciências do Chile, com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). A categoria de membros afiliados foi criada na ABC em 2007 e prevê a eleição pelos membros titulares de cada região de até cinco pesquisadores de alto nível, com menos de 40 anos, para fazer parte dos quadros da ABC por cinco anos não renováveis.
Daniella Bartholomeu, Ricardo Fujiwara, Leda Castilho,
Lázaro Padilha, Gisele Olimpio e Alexandre Aleixo
O biólogo da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Ricardo Fujiwara, eleito afiliado da ABC para o período 2012-2016, foi um dos coordenadores – junto com Julius Hafalla, da Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres – da sessão sobre Saúde Humana, da qual Daniella Bartholomeu, também bióloga da UFMG, foi uma das palestrantes. Ela é ex-afiliada da ABC, com mandato de 2008 a 2012. Veja a matéria da ABC sobre essa sessão.
Também biólogo, Alexandre Aleixo, do Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG) foi eleito para a ABC no período 2012-2016. Ele organizou a sessão sobre biodiversidade em conjunto com o pesquisador da Universidade de Sheffield Tom Webb, que teve como palestrantes o biólogo Gustavo Bravo, do Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo (USP) e o biólogo Nick Isaac, do Centro NERC Para Ecologia e Hidrologia, no Reino Unido.

Alexandre Aleixo, Gustavo Bravo, Nick Isaac e Tom Webb
Aleixo relatou que a mesa redonda intitulada “Biodiversidade numa Era de Grande Volume de Dados” abordou quais são os grandes obstáculos ao desenvolvimento do conhecimento na área. “A conclusão, basicamente, é que se conhece ainda muito pouco sobre a genealogia das espécies, como a biodiversidade se originou e quais são os processos por detrás disso”, relatou.
Segundo Aleixo, foi avaliado na sessão que nos próximos anos será preciso ainda acumular muita informação, principalmente focada na genética das espécies. Além disso, informações sobre as distribuições de organismos de fácil observação e identificação como aves e borboletas, por exemplo, podem ser também fornecidas por pessoas que não são cientistas, mas que fotografam e observam animais e plantas por prazer, um tipo de “hobby” que vem crescendo muito, inclusive no Brasil. “Usar esse tipo de colaboração para aumentar o conhecimento sobre as espécies deve ser uma alternativa a ser considerada para o futuro.”
Assim como Aleixo, que estuda os processos evolutivos que levaram à diversificação dos pássaros, Gustavo Bravo também trabalha com aves, sendo seu principal interesse a evolução, sistemática e ecologia de pássaros neotropicais. Os outros palestrantes – Nick Isaac é especialista em macroecologia e Tom Webb em biodiversidade e ecologia marinha – abordaram questões mais gerais. Saiba mais na matéria da Agência Fapesp sobre a sessão.
Sobre colaborações científicas, Aleixo relatou que seu grupo já interage com um grupo de Oxford, que não estava representado no evento, e que surgiram possibilidades de várias outras colaborações durante o evento, especialmente com Robert Young, especialista em biologia da conservação da Universidade de Salford Manchester, no Reino Unido.
Os outros membros e ex-membros afiliados da ABC apresentaram seus trabalhos em sessões de flash posters, nas quais cada um dos 26 convidados tinham cinco minutos para descrever seu trabalho, com o apoio de dois slides. A ideia era contextualizar sua pesquisa numa linguagem acessível, que favorecesse a interação multidisciplinar, visando futuras cooperações científicas.
Professora adjunta do Departamento de Química Analítica da Universidade Federal da Bahia (UFBA) Gisele Olimpio, eleita membro afiliado da ABC para o período de 2011 a 2015, tem interesse em como se dá a emissão de diferentes substâncias, tanto de origem natural quanto de origem antrópica (ou seja, causada pelo homem), para a atmosfera e como esta se auto-regula para transformar ou remover esses compostos que foram liberados. Os três pilares de sua pesquisa são a composição química das partículas, sua morfologia e física, e o seu potencial de toxicidade à saúde humana, quando inspiradas. Ela focou nas nanopartículas, que por seu tamanho têm maior probabilidade de irem mais fundo no trato respiratório e que no seu limiar ora se comportam como gases, ora como partículas e começam a interferir no organismo, participando das trocas gasosas que ocorrem na região alveolar dos pulmões.
“Eu tento usar essa mesma abordagem para avaliar o que é emitido, em termos de nanopartículas, na queima de combustíveis para geração de energia ou na queima industrial”, informou. Gisele destacou que toda forma de geração de energia gera resíduos, que poluem a atmosfera, o solo ou a água. Ela dá especial atenção à mudança da matriz energética mundial. “Essa mudança tem vários desdobramentos ambientais, sociais e geopolíticos, que caminham juntos. Estou mais focada na parte ambiental e posso ajudar na parte das mudanças climáticas, na pegada da água e na emissão de combustíveis fósseis, visando a sustentabilidade para as próximas gerações”.
O físico da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Lázaro Padilha, que será diplomado agora em 2014, pois foi eleito como membro afiliado da ABC para o período de 2014 a 2018, tem interesse em nanomateriais semicondutores para aplicação em células solares LED. Esses nanomateriais têm dimensões de milionésimos de milímetro, cerca de dez mil vezes menos que a espessura de um fio de cabelo, e essa limitação de tamanho faz com que os elétrons no material se comportem de forma única, possibilitando novas aplicações tecnológicas. “Para e
ntendermos os nanomateriais e podermos aumentar sua eficiência em aplicações, precisamos saber o que o elétron faz lá dentro quando excitado.”
Lázaro explica que em uma célula solar o nanomaterial absorve a luz do sol, o que excita o elétron que precisa ser extraído desse nanomaterial para gerar a corrente. Para observar seu comportamento e como esses processos são muito rápidos – ocorrem em picossegundos , que é um segundo dividido por um milhão e dividido por um milhão de novo – o estudo requer uma forma mais rápida para observar o elétron e saber o que ele está fazendo. “Nós usamos um laser com pulso ultra rápido, de femtossegundos – que é mil vezes mais rápido que o picossegundo -, para tentarmos mapear a dinâmica do elétron. A gente quer excitar esse elétron, ser capaz de retirar ele do material, para que ele forme a corrente.”
Conseguindo esse resultado, Lázaro e seu grupo interagem com colaboradores da parte de síntese dos materiais, a quem indicam o caminho a seguir para obter a maior eficiência de transferência desse elétron. “Esses colaboradores são químicos e engenheiros que desenvolvem materiais com alguma modificação na estrutura e nós os estudamos de uma forma educada. Assim conseguimos aumentar a eficiência das células solares e de LED. Então é isso que eu faço: usar um laser com pulso muito curto para estudar uma coisa que é muito pequena”, brinca Padilha.
A engenheira química da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe/UFRJ) Leda Castilho coordena o Laboratório de Engenharia de Cultivos Celulares, dedicado a pesquisas em biotecnologia farmacêutica. Seu foco é o estudo de novas tecnologias para o desenvolvimento de produtos biológicos aplicados à saúde humana, como biofármacos, vacinas e terapias celulares.
São três ás áreas de atuação do seu laboratório: a primeira é a área de clonagem e expressão de genes em células de mamíferos, para produção das proteínas recombinantes de uso terapêutico, porque essas células são capazes de produzir corretamente proteínas complexas. A segunda área se dedica ao estudo de como cultivar essas células em biorreatores e ampliar a escala dos processos. A terceira área é a de purificação do produto de interesse. “O nível de pureza requerido costuma ser elevadíssimo, porque os produtos são, na maior parte das vezes, injetáveis. Este é um processo desafiador, normalmente feito em várias etapas, com o objetivo de atingir o alto nível de pureza e remover determinados contaminantes críticos conforme regras de instituições como a OMS [Organização Mundial de Saúde], Anvisa, FDA [Food and DrugAdministration] etc.”, destaca Leda.
A ex-afiliada da ABC, eleita para o período de 2009 a 2013, explica que o produto de interesse, na maior parte das pesquisas do seu grupo, é uma proteína recombinante para ser usada como princípio ativo de um medicamento, comumente denominada biofármaco. Em outros casos, o produto pode ser um vírus propagado nas células, utilizado como princípio ativo de uma vacina como, por exemplo, numa parceria que estão desenvolvendo com a Fiocruz. No caso das terapias celulares, o produto de interesse é a própria célula e a contribuição de seu laboratório, numa parceria com o Laboratório Nacional de Células-Tronco Embrionárias da UFRJ, coordenado pelo também ex-afiliado da ABC Stevens Rehen, é estudar como obter células-tronco pluripotentes, ou células delas derivadas, em grande escala.
Sobre cooperação científica, Leda Castilho relata que não há muitos grupos de pesquisa na área de tecnologia de produção de biofármacos e que seu grupo já teve projetos conjuntos com o Centro de Imunologia Molecular de Cuba; com a Pontifícia Universidade Católica de Valparaíso do Chile; com a Universidade Nacional do Litoral de Santa Fé, na Argentina, e agora está iniciando um projeto com o Instituto de Biologia Experimental e Tecnológica de Portugal.
Leda destacou que seria muito interessante estabelecer cooperação com pesquisadores da área biomédica que tenham descoberto novas proteínas com potencial terapêutico. “Aí nós podemos colaborar para expressar e produzir essa proteína nova numa célula de mamífero, estudar o processo de cultivo e o processo de purificação para que a proteína então possa ser testada em animais e humanos. Sem essas colaborações, ficamos limitados a estudar a produção de biossimilares – que também são muito importantes para o país.” Ela explica que é com esses produtos já aprovados e conhecidos que o Ministério da Saúde está gastando 43% dos recursos para medicamentos, cerca de R$ 4 bilhões por ano. “Mas se a gente quiser, como país, desenvolver biofármacos inovadores, então uma parceria da área tecnológica com a área biomédica seria muito interessante.”
A visão dos organizadores
Para os líderes das instituições envolvidas na organização do evento, todos presentes, a reunião tem características muito especiais. O presidente da Academia chilena Juan Asenjo, que também é diretor do Centro de Engenharia Bioquímica e Biotecnologia da Universidade do Chile, relatou que foi convidado a participar do “Frontiers of Science” em Campinas em 2010 e ao ver que era uma parceria da ABC com a Royal Society se interessou em incluir a Academia Chilena de Ciências, o que foi muito bem-vindo.Ele reconhece a liderança da Academia brasileira na América Latina, e relatou que os dois países já têm uma parceria no Observatório Europeu, localizado no Chile.
Segundo o químico Martyn Poliakoff, secretário para Assuntos Internacionais e vice-presidente da Royal Society, a ideia desses encontros que a Royal Society costuma promover, em parceria com as academias de ciências de diferentes países, é reunir um número pequeno de jovens pesquisadores de excelência para interagir em temas estratégicos. Os temas tratados nessa ocasião foram a ciência do espaço, saúde humana, mudanças climáticas, biologia de plantas e bioenergia, biodiversidade, novos materiais e nanociência.

Marcelo Knobel, Jacob Palis, Juan Asenjo e Martyn Poliakoff
Poliakoff destacou que as publicações inglesas que tem como coautores cientistas de países fora da Europa tiveram o número de citações ampliado em 50%. Por acreditar que essa interação seja proveitosa também para os outros países, considera que esse tipo de encontro pequeno e multidisciplinar pode ser muito proveitoso cientificamente. “A educação científica é diferente em cada país. Então, cientistas de diferentes origens têm diferentes olhares sobre um mesmo problema. Essa é a riqueza dessa interação.”
O presidente da ABC, Jacob Palis, concorda inteiramente. Em sua visão, o estímulo à cooperação internacional, especialmente entre jovens pesquisadores, é o caminho para estimular o progresso da ciência global, em prol da sociedade. Segundo o físico da Universidade de Campinas (Unicamp) Marcelo Knobel, organizador do evento pela parte brasileira, a seleção dos convidados foi feita de forma muito criteriosa, através de indicações e de pesquisa realizada por ele mesmo. “Foi uma avaliação científica de quem poderia int
eragir bem com quem, quais os cientistas que seriam parceiros em potencial”, relatou, acrescentando que por sua experiência no evento realizado há quatro anos, “esse é um tipo de encontro que renova a paixão pela ciência.”
Sobre o “Frontiers of Science”
Esta é uma série de prestigiosos encontros internacionais para jovens cientistas de excelência, organizada pela Royal Society em parceria com as academias de ciências e organizações científicas em todos o mundo. A série teve início em 2004, em conjunto com a Academia Nacional de Ciências (NAS, na sigla em inglês) dos Estados Unidos. Continuou na Alemanha, sendo que em 2006, 2008 e 2011 os encontros foram realizados em parceria com a Fundação Alexander von Humboldt e em 2007, com o grupo de Academias Visegraad.
Em 2008 ocorreram encontros na Índia, conjuntamente com a Academia Nacional de Ciências da Índia; no Japão, com a Sociedade Japonesa para a Promoção da Ciência. Ainda em 2008 e também em 2011, a série “Frontiers of Science” promoveu encontros em Hong Kong, na China, em parceria com a Fundação Croucher. Em 2009, foram realizadas reuniões na China e na Holanda, em parceria com a Academia Chinesa de Ciências e a Academia real de Artes e Ciências da Holanda.
Em 2010 ocorreu o primeiro evento no Brasil, especificamente na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), em conjunto com a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). No mesmo ano, foi realizado um “Frontiers of Science” em parceria com a Academia Australiana de Ciências, na Austrália. Em 2013, ocorreu um na Rússia, em parceria com a Academia de Ciências da República do Tartaristão e a Academia Russa de Ciências.