O sucesso profissional foi alcançado em pouco tempo na vida do matemático Antônio Caminha Muniz Neto. Mas a escolha da carreira, para ele, foi um processo um tanto traumático. Filho de pais advogados, Neto conta que seu pai advogou por 35 anos e sua mãe, apesar de bacharel em direito, deveria ter sido arquiteta. Com grande vocação para a área, ela não pôde seguir sua aptidão, pois não existiam cursos de arquitetura na cidade de Fortaleza no ano em que prestou vestibular.
Quando chegou sua vez de decidir qual graduação cursar, Antônio pensou tratar-se de uma escolha bastante natural. Por gostar de matemática desde pequeno e obter bons resultados nas avaliações de física e química, resolveu cursar engenharia eletrônica e prestou vestibular para o Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) e para o Instituto Militar de Engenharia (IME). Nos últimos três meses de seu terceiro ano do ensino médio, no entanto, Neto começou a cogitar a ideia de mudar seus planos e cursar matemática, o que assustou seus pais – que incentivavam sua ida para o ITA e consideravam a alternativa da matemática um “desperdício de talento”. Ele, então, seguiu o conselho dos pais e mudou-se para São José dos Campos. “Mas não gostei e, mesmo com toda a reticência de meus pais, voltei em 14 dias”, conta.
Ingressou então na Universidade Federal do Ceará (UFC), onde cursou três anos de engenharia elétrica. Nesse período, Antônio conseguiu uma bolsa de iniciação científica pelo Departamento de Matemática da instituição e seu antigo professor de preparação para as Olimpíadas Cearenses de Matemática, Antônio Valdenísio Bezerra, o convidou para auxiliá-lo em suas aulas. Antônio conta que, até conhecer Bezerra, o que aconteceu quando tinha 14 anos, ele não gostava da matemática do colégio, apesar de sempre conseguir boas notas. “Nas aulas de preparação, vi que os problemas olímpicos eram muito mais interessantes do que os da escola. Foi então que percebi como havia muita matemática interessante a aprender”, explica.
No fim do terceiro ano de curso, Caminha tinha certeza de que sua vocação não era a engenharia – ele gostava mesmo era de matemática. “Foi então que eu disse a meus pais que mudaria de curso e, caso eles não concordassem, eu sairia de casa”, lembra. Assim o atual professor da UFC graduou-se em matemática, certo de que entrar para o campo da pesquisa. O professor Gervásio Gurgel Bastos, seu orientador de mestrado, despertou nele o interesse pela álgebra comutativa e se destacou como influência significativa em sua trajetória. “A grande ironia é que, no final de meu mestrado, descobri que esse professor é primo de segundo grau de meu pai. Além disso, também fiquei sabendo que havia dois outros professores de matemática na família”, diverte-se.
Deparando-se com empecilhos relativos a problemas econômicos do governo FHC, Caminha teve de recusar uma vaga de doutorado no Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada (IMPA) para priorizar seu desejo de constituir uma família. Lamentando pela pouca quantidade de vagas, o matemático conta que, após esperar dois anos pelo aparecimento de algum concurso, decidiu mudar de área – de álgebra para geometria diferencial – e cursar o doutorado também na UFC. “Quando finalmente ingressei no doutorado, dois professores foram muito importantes para mim: meu orientador, o Acadêmico João Lucas Marques Barbosa, e o meu orientador informal, o Prof. Abdênago Alves de Barros”, recorda Antônio.
Geometria diferencial
Sobre sua linha de pesquisa, ele explica que a geometria diferencial procura entender como e por que as superfícies se curvam no espaço. “Meu trabalho de pesquisa lida com um tipo mais geral de superfície, chamado de variedade lorentziana. De um ponto de vista estritamente matemático, o interessante nesse tipo de objeto é o fato de que, contrariamente ao que ocorre na geometria euclidiana plana, a maneira natural de medir a separação de dois pontos distintos sobre ele – o que chamamos de distância na geometria euclidiana – pode gerar um resultado nulo ou até mesmo negativo”, empolga-se. E ainda continua: “De um ponto de vista físico, as variedades lorentzianas são o ambiente geométrico adequado para formular e estudar a Teoria da Relatividade Geral de Einstein”.
A mais fundamental das ciências
Para o novo Acadêmico, a matemática é encantadora. “Por seus métodos serem fundamentais às outras ciências, sempre a enxerguei como a mais fundamental delas”, admite. Segundo ele, a Ciência é a ferramenta fundamental para a compreensão da natureza e sua área de estudos, particularmente, possui uma estética atraente devido ao rigor de seu raciocínio lógico-dedutivo, que alicerça firmemente cada nova descoberta aos conhecimentos já existentes.
De acordo com Caminha, um cientista deve, acima de tudo, ter gosto pela pergunta “por que?”. “É fundamental ser curioso para fazer ciência”, explica. Mas, além disso, ele acredita serem necessários longos períodos de trabalho árduo e otimismo. “Em resumo, a célebre frase de Albert Einstein continua mais verdadeira do que nunca: para fazer ciência, é preciso misturar 1% de inspiração com 99% de transpiração”, brinca.
A um jovem interessado em ciência, Antônio diria que, como em qualquer carreira, existem pontos positivos e negativos em ser um cientista. Segundo a sua vivência, o principal ponto positivo é a possibilidade de estar sempre trabalhando com algo novo, o que é bastante instigante. Em contrapartida, ele opina que ser cientista no Brasil implica, na maioria dos casos, em ser professor de alguma instituição de ensino superior. “Isso exigirá da pessoa o cumprimento de uma enorme carga horária em sala de aula, em detrimento da pesquisa. Além disso, a remuneração é bem pior do que a de um médico, advogado ou engenheiro bem sucedidos”, lamenta o matemático.
Para Caminha, pesquisador nível 2 do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), o título de Membro Afiliado da ABC significa um marco em sua carreira. Sentindo-se reconhecido por anos de trabalho duro, ele afirma desejar contribuir com a Academia na divulgação da ciência e, especialmente, da matemática.