Odair Pastor Ferreira é natural do pequeno município de Assis Chateaubriand, no oeste do Paraná. Seus pais eram meeiros – agricultores que trabalham no sistema de arrendamento. Quando pequeno, teve uma infância típica de alguém criado em um sítio: “Ajudava meus pais nas tarefas diárias do campo, lidando com plantações e animais, e trabalhava como diarista para os vizinhos para conseguir uma renda extra. Mas frequentava a escola regularmente, contando com a constante participação e incentivo de minha mãe.”
Em sua casa não havia eletricidade. Assim, Odair não tinha muito contato com televisão, jogos eletrônicos e computadores. “Em contrapartida, fui um frequentador assíduo da biblioteca da escola. Eu lia livros de literatura infanto-juvenil e clássicos da literatura brasileira, como Machado de Assis, Lima Barreto, Aluísio de Azevedo e José de Alencar”, conta.
Em seu tempo livre, subia em árvores para pegar frutas, pescava no riacho, jogava bola de gude com seus irmãos e vizinhos e tinha paixão por futebol. “Além de frequentar os campos de futebol perto de casa, eu e meu tio montávamos traves em um campo de pastagem de animais e jogávamos bola com as crianças da vizinhança, principalmente nos finais de semana e dias chuvosos, quando não era possível o trabalho na lavoura”, conta.
Primogênito de dois filhos, ele foi o primeiro de toda a família a ter acesso ao ensino superior. Felizmente, os irmãos de Odair Ferreira seguiram seus passos. Um deles optou pelo curso de física da Universidade Estadual de Maringá (UEM) e, atualmente, é professor de ensino médio no estado do Paraná. O outro se graduou em matemática pela mesma instituição e, hoje em dia, é professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

O despertar do interesse pela ciência
“Sempre adorei resolver problemas, sentia – e sinto – uma enorme satisfação a cada resolução bem sucedida. Nos exercícios mais complexos, nunca desisti fácil, busco a solução por horas a fio”, revela. De acordo com Odair, seu interesse pela ciência é proveniente de um somatório de fatores que incluem, dentre outras coisas, as perfeições da natureza – observadas por ele desde pequeno em sua vida no campo -, a profunda admiração que sentia por pessoas detentoras de conhecimento, como seu avô Valdemar Pastor, e também o incentivo de alguns professores do ensino médio.
Na adolescência, o rapaz gostava de estudar química, física e matemática. Tendo seus familiares e professores do colégio como únicas referências profissionais, Odair enxergava as dificuldades enfrentadas na rotina no campo por aqueles que não eram donos de terra. Optou, então, pela carreira acadêmica. “Em um primeiro momento, entretanto, minha perspectiva era me tornar professor do ensino básico”, explica.
Entusiasmado com o ensino superior
Odair optou então pela licenciatura em química na UEM. Contente, ele lembra: “Para minha surpresa, ao chegar à graduação, tive as primeiras noções do significado da palavra universidade e das oportunidades oferecidas por ela a um jovem de 17 anos que acabara de sair do campo.” Ferreira, contudo, ainda precisava trabalhar durante o dia para conseguir manter seus estudos no período da noite.
Encantado com as oportunidades de crescimento intelectual e profissional, Ferreira estagiou logo no primeiro semestre como voluntário do projeto de extensão “Tabela Periódica: Um Laboratório Dinâmico para o Ensino de Química”, do Centro Interdisciplinar de Ciências e do Departamento de Química (DQI) da UEM, sob a orientação do professor Aloísio S. Takana. A partir do segundo período da faculdade conseguiu um estágio remunerado no Laboratório de Controle de Qualidade da empresa Leiner Davis Gelatin Brasil. Ao final do primeiro ano na UEM, candidatou-se a uma vaga no Programa Especial de Treinamento (PET) no DQI e permaneceu nesse grupo até o final da graduação.
Para Ferreira, a participação no PET foi de fundamental importância para sua iniciação em ciência e para o estabelecimento dos primeiros contatos com o método científico nos laboratórios de síntese orgânica e química dos materiais – área em que, posteriormente realizaria seus estudos de mestrado, doutorado e pós-doutorado pela Unicamp. O PET era um programa de tutoria no qual a professora Florângela Maionchi – contando com a co-tutoria dos professores Noboru Hioka e Ourídes Santim – conduzia um processo formativo amplo e consistente dentro da área de química. Além disso, através do PET, os alunos também estagiavam em laboratórios de pesquisa. “Em um desses estágios, sob a orientação do professor Adley Forti Rubira, tive meu primeiro contato com a química dos materiais. A dedicação contagiante do Prof. Adley me levou a atuar como pesquisador nessa área até os dias atuais”, reconhece.
Odair Ferreira teve seus esforços reconhecidos desde cedo. Já no fim da graduação, recebeu o “Diploma Especial de Láurea Acadêmica”, distinção oferecida pela UEM aos estudantes que possuíam notas superiores e/ou iguais a nove em dois terços de todas as disciplinas cursadas. “Fui o primeiro aluno em 28 anos de curso de química a receber esse diploma”, conta.
Passando à especialização
Sob a orientação do Acadêmico Oswaldo Luiz Alves, Ferreira especializou-se em química dos materiais. Em sua visão, as discussões entre os dois no decorrer do processo permitiram que seu aprendizado fosse além daquilo que consta nos livros e seu conhecimento, aprofundado. “Os projetos e oportunidades oferecidas pelo Prof. Alves foram fundamentais para o meu processo formativo como pesquisador e minha compreensão do como fazer ciência, sempre levando em conta as questões éticas e de meritocracia”, explica.
O reconhecimento ao seu empenho como cientista repetiu-se em 2002, quando sua dissertação de mestrado foi contemplada com o Prêmio Unesco/Orcyt de melhor dissertação no âmbito do Mercosul ampliado. Em 2009, por sua vez, recebeu – na categoria pesquisador – uma Menção Honrosa do Prêmio Abiquim de Tecnologia.
Atualmente, seus trabalhos de pesquisa consistem na preparação, caracterização e aplicação de materiais em diferentes áreas do conhecimento, regidos pelo conceito dos (nano)ecomateriais. De acordo com Ferreira, esses (nano)ecomateriais são desenvolvidos segundo uma estratégia de ponderação entre os avanços tecnológicos almejados para um determinado material e sua adequação ambiental, tanto do ponto de vista do processo produtivo quanto da sua disposição final – ou seja, materiais que são produzidos segundo uma estratégia planejada de descarte/reuso/reciclagem.
Dentro dessa perspectiva da produção de materiais que, além de serem obtidos a partir de fontes renováveis, possuem também funções de proteção ambiental e ecológica, o grupo de estudos de Ferreira desenvolve, dentre outros produtos, (nano)argilas aniônicas sintéticas para a remediação de efluentes industriais; argilas aniônicas sintéticas como precursoras para catalisadores a serem aplicados à cadeia produtiva de plásticos, petróleo, gás e energias renováveis; e nanotubos inorgânicos e suas aplicações como fotocatalisadores empregando luz UV e solar para a degradação de poluentes ambientais.
O amor pela ciência

É a possibilidade de desvendar os segredos da natureza que encanta Ferreira em sua carreira. “Isso promove avanços no conhecimento humano, disponibilizando-os na forma de tecnologias a serem utilizadas na geração de riqueza, para o bem estar das pessoas e para a inclusão social”, revela. Sobre sua área especificamente, ele se diz apaixonado pela capacidade de planejar e dominar átomos e moléculas para a criação de novos materiais com composição, estrutura, tamanho e morfologia controlados – possibilitando, dessa forma, a construção assertiva de suas propriedades.
Mais uma forma de reconhecimento
Antes de tornar-se professor adjunto da Universidade Federal do Ceará (UFC), Odair trabalhou durante três anos como coordenador e gerente de pesquisa e desenvolvimento na Contech Produtos Biodegradáveis, empresa do setor químico sediada na cidade de Valinhos, em São Paulo. Além disso, ele possui vasta experiência na interação universidade-empresa, atuando em processos de transferência de tecnologia. “Essa vivência em processos de transferência de tecnologia permitiu uma ampliação do meu conhecimento e amadurecimento profissional”, conta.
Detentor de três patentes depositadas – das quais duas foram licenciadas, resultando em produtos de base nanotecnológica lançados ao mercado – Ferreira foi eleito, no ano de 2012, membro afiliado da ABC. Honrado, ele reconhece a Academia como uma das mais respeitadas instituições científicas do país e enxerga na indicação um motivo para dedicar-se cada vez mais à pesquisa. “Minha participação na ABC poderá levar à ampliação da rede de contatos com outros jovens cientistas, dando início a uma colaboração entre pessoas que, embora de diferentes áreas, pensam e acreditam na ciência brasileira”, afirma o professor, que vê na ciência um fator de inclusão social.