O amor pela física transformou-se em um casamento, literalmente, com um pesquisador do mesmo instituto, na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). A cientista Raquel Giulian, de 32 anos, e um filho de um ano e dez meses, Heitor, não esconde o apreço em discutir e receber contribuições para pesquisas na sua própria casa. Mas foi com a equipe da universidade que a física premiada deste ano desenvolveu o estudo que tem como principal objetivo o estudo de materiais porosos que podem ser utilizados como detectores de gases.

Na prática, esses materiais são de grande utilidade para a indústria petroquímica, em que é necessário detectar a presença de certos gases corrosivos, mesmo em pouquíssimas quantidades, para evitar danos às tubulações, equipamentos e ao meio ambiente. O estudo explora a produção de semicondutores porosos através da implantação iônica. Nessa técnica, íons com velocidade muito alta são arremessados contra o material sólido e, ao penetrarem no meio, causam uma certa desordem de nível atômico. Em materiais como os antimonetos de índio e gálio (InSb e GaSb) – semicondutores sólidos compactos – o resultado é a formação de poros, que tornam a região implantada semelhante a uma esponja. “Estamos investigando as condições necessárias para a fabricação desses materiais, suas características físicas, propriedades elétricas, fotovoltaicas, entre outras, para explorar de forma mais eficiente o desenvolvimento de novas tecnologias”, explica.

O caminho para chegar até aqui foi longo. Olhando sua trajetória na ciência, é difícil acreditar que a Dra. Raquel prestou vestibular para ir atrás de, até então, seu maior sonho: poder frequentar um grande instituto de música. Com o lado artístico nas veias, ainda menina apareceu como figurante nas gravações do filme “O Quatrilho”, participou durante anos das atividades do CTG Cancela do Imigrante, além de apreciar poesia e tocar piano, violão e violino. Para se manter na universidade e ainda estudar música, voltava para sua cidade nos finais de semana como professora de piano e ainda vendia bombons para os colegas e professores. Além de tudo isso, estudava dobrado, uma consequência da educação defasada no colégio do interior. “Na universidade nunca fui uma aluna nota 10. A nota é um mérito para quem estudou, mas não quer dizer tudo. Boa vontade e persistência são mais importantes”, aconselha aos seus alunos.

Após terminar a graduação na UFRGS, em 2002, cursou dois anos de mestrado em física na mesma universidade. Em seguida, realizou doutorado e pós-doutorado pela Australian National University, na Austrália, onde se especializou no estudo de nanopartículas. O convite para trabalhar com materiais porosos aconteceu neste período, quando surgiu a ideia de adaptar suas análises para a pesquisa dos poros no Brasil. “O Brasil de hoje é um país muito competitivo e tem todas as condições para se tornar referência na pesquisa, mas ainda faltam investimentos. Temos que sair do país para que o estudo avance rapidamente. Existe carência de equipamentos e capital, mas sobra burocracia. Por isso, o prêmio veio em um ótimo momento para darmos seguimento ao projeto”, diz.