Carioca, Roberto Imbuzeiro Moraes Felinto de Oliveira foi eleito Membro Afiliado da ABC a partir de indicação feita pelo Acadêmico Marcelo Miranda Viana da Silva. Honrado, ele afirma: “Em termos científicos, eu não podia estar em melhor companhia e isto, por si só, é um grande benefício. Mais concretamente, espero ter a oportunidade de interagir com os meus pares, em especial os de outras áreas.” Certo de que seu mandato – período que irá de 2013 a 2017 – será de grande aprendizado, ele considera que talvez também tenha alguma coisa a ensinar. “Quem sabe não possa organizar alguns eventos interdisciplinares no futuro?”, especula.
O título coroa um conjunto de reconhecimentos aos seus esforços científicos: no ano de 1988, Oliveira recebeu uma Menção Honrosa na Olimpíada Brasileira de Matemática (OBM) e, em 1995, ganhou uma bolsa por desempenho acadêmico na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). Jovem e já muito realizado pelos caminhos profissionais que escolheu seguir, Roberto conta como aconteceu seu processo de escolha de curso e, ademais, afirma: “Eu torço para que todos os jovens interessados pelo campo científico possam ser tão felizes quanto eu sou nessa carreira fascinante. É uma felicidade suada e às vezes doída, mas gratificante como poucas coisas podem ser.”
Em sua visão, um cientista deve – mais do que duvidar – colocar tudo sob um constante questionamento. “Questionar é perguntar sem parar, mas como quem pretende entender. Pondere as respostas já dadas e observações já feitas com atenção e lembre-se de que entender as coisas a fundo é, por si só, uma atividade ativa criativa. A satisfação de descobrir e criar vem justamente de encontrar um ponto ainda não explorado no meio do que já se conhece.”
Influências familiares
Criado na Zona Norte do Rio, com a presença constante e muito próxima dos avós maternos, primos e amigos, ele recorda que sua maior alegria era “encontrar todo esse pessoal e brincar com a criançada”. Orgulhoso, ele afirma que sua mãe era a dona de casa mais qualificada que já conheceu: professora de inglês, ela era diplomada em piano pelo Conservatório Brasileiro de Música e possuía um mestrado incompleto em literatura. “Minha mãe largou os empregos quando eu nasci e, assim que cresci um pouco, voltou a trabalhar como professora particular e do município”, explica. Já seu pai era advogado e juiz.
Filho único, seus esportes preferidos eram o judô e a natação. Quando pequeno, também gostava de atividades que misturassem correria, muita gente e “alguma dose de estratégia”. Apaixonado pelos livros desde a infância, na escola preferia as redações e as aulas de ciências. “Lembro-me de gostar da série Cosmose dos telecursos de ciências, mas as influências mais fundamentais que tive em minha trajetória foram os dois cientistas da família: meu bisavô, Cláudio Chaves Imbuzeiro, e o marido de uma prima da minha mãe, Jair Barroso”, conta. Imbuzeiro, geólogo por formação e astrônomo por profissão, trabalhou no Observatório Nacional por muito tempo, mesmo depois de completar 90 anos de idade. Por sua vez, o também astrônomo Jair Barroso e sua mulher sempre mostraram muito entusiasmo pelos fenômenos da natureza, divertindo-se em explicá-los às crianças. “Uma de minhas lembranças mais marcantes é de uma noite passada vendo estrelas com estes tios e mais alguns primos durante uma viagem a Guarapari. O céu sempre me fascinou”, recorda, “mas naquela noite eu fui apresentado a nebulosas e aglomerados estelares.”
Por isso, Oliveira conta que durante boa parte da infância pensava em ser astronauta ou astrônomo. Com o tempo, a primeira opção se mostrou dificílima de alcançar e a segunda, um pouco decepcionante. “Boa parte da astronomia contemporânea é feita via radioastronomia, o que é muito interessante, mas eu queria era olhar para estrelas à noite, não analisar sinais”, confessa. Assim, em algum momento, os computadores surgiram em sua vida, despertando o interesse de Roberto pela informática. Ainda que por vezes cogitasse a ideia de ser músico, ele relembra: “Decidi que queria fazer hardware e trabalhar em alguma empresa de tecnologia de ponta. Era esse meu pensamento quando entrei na graduação.”
O interesse particular pela matemática, no entanto, tem uma origem um pouco mais remota: a Olimpíada Brasileira de Matemática (OBM) de 1991. Naquele ano, o diretor de sua escola – o extinto colégio Van Gogh, na Tijuca – o procurou para verificar seu interesse na competição, visto que uma categoria júnior acabava de ser criada. Para surpresa do rapaz – que nunca havia ouvido falar na Olimpíada – além de participar do evento, ele ainda foi contemplado com a já citada Menção Honrosa. “Foi bacana ganhar um prêmio da Sociedade Brasileira de Matemática, mas não cheguei a acompanhar as aulas oferecidas aos premiados. Ainda assim, quando vi que não gostava de engenharia, a matemática se revelou uma opção atraente, muito mais desafiante e profunda. Ela me permitia programar, pensar, filosofar, resolver problemas estimulantes e dialogar com outras ciências. Enfim, acabei fisgado”, conclui.
Aprofundando-se nas complexidades matemáticas
Uma vez dentro da universidade, Roberto se surpreendeu pelo constante estímulo vindo dos professores com os quais interagia no Departamento de Matemática da PUC-Rio. Cronologicamente, ele destaca alguns nomes que serviram de grande influência em sua formação: “Geovan Tavares, professor de Cálculo II especial, promoveu um curso com trabalhos computacionais muito bons. Outra pessoa importante foi o Acadêmico Carlos Tomei, que apresenta uma visão muito eclética à respeito da matemática.” Já com o professor Ricardo de Sá Earp, seu orientador de iniciação científica, ele afirma ter aprendido muito mais do que geometria diferencial: entendeu como levar a carreira a sério. “A partir do contato com esses pesquisadores, não foi difícil descobrir que queria fazer o mesmo que eles.”
De acordo com Oliveira, a graduação foi seu momento de aprender o básico e descobrir os caminhos que desejava seguir. Para chegar a interesses mais específicos, no entanto, ele cursou o mestrado no Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA) sob a orientação de Marcelo Viana. Sobre esse período, ele destaca não só a importância dos professores e da biblioteca da instituição, mas também das inúmeras palestras a que pôde assistir. E Roberto exemplifica: “Um aluno, Bernardo Lima – que hoje também é Membro Afiliado da ABC – me apresentou a Teoria da Probabilidade em uma palestra sobre percolação. Posteriormente, um matemático muito famoso, Persi Diaconis, ministrou uma conferência absolutamente fascinante sobre esta área e a combinatória, o que me fez correr para a biblioteca.” Nesta mesma biblioteca, o matemático descobriu um livro de seu futuro orientador de doutorado, o professor Joel Spencer.
Cursado na New York University, nos Estados Unidos (EUA), Roberto define o período de seu doutorado como o mais difícil de sua vida. Em meio às conturbações provocadas pela mudança de país, a saudade que sentia da família e o esforço exigido pelos estudos, ele afirma ter ficado bastante abalado. “De alguma forma, sobrevivi e acabei por aproveitar a experiência de morar em Nova Iorque e estudar em um dos melhores departamentos de matemática do mundo”
, conta. Oliveira credita a Spencer a formação de sua visão intuitiva em relação à matemática: a partir da convivência com seu orientador, ele aprendeu que entender bem é mais importante do que progredir depressa. “Além disso, também conheci nos EUA uma colaboradora com quem tenho quatro trabalhos importantes: minha esposa, Bianca Zadrozny”, diverte-se, explicando que os quatro trabalhos são um artigo e três filhos.
Após o término do doutorado, Imbuzeiro obteve seu título de pós-doutorado no grupo Physics of Information, do IBM T.J. Watson Research Center. Em setembro de 2006, tornou-se pesquisador do IMPA, que se tornou seu local de trabalho até os dias de hoje.
O trabalho de pesquisa
A matemática apresenta alguns ramos básicos bastante conhecidos, dentre os quais figuram a aritmética – estudo das operações elementares dos números ; a álgebra – estudo de certas classes de manipulações simbólicas; e a geometria, que estuda as formas. “O ramo básico pelo qual tenho maior interesse não tem um nome oficial, mas eu gosto de chamá-lo de desordem. Chamam-me a atenção os sistemas grandes, com muitas partes que não apresentem qualquer relação óbvia entre elas; sistemas, portanto, sem simetrias visíveis e com muita bagunça e acaso envolvidos,” relata Imbuzeiro.
Tentando uma exemplificação simples, ele cita as redes de relações do Facebook. “Essa rede engloba não apenas os seus amigos, mas também os amigos de seus amigos e, por sua vez, os amigos dessas pessoas também.É muito difícil e custoso determinar exatamente a estrutura de redes como essa, principalmente devido a suas constantes mudanças. Ainda assim, gostaríamos de entender como, por exemplo, se propaga uma notícia falsa”, elucida. Curioso, em sua visão o segredo da matemática está no simples fato de que muita desordem pode dar origem à ordem, “pelo menos do ponto de vista correto”.
Utilizando-se do exemplo de tijolos, os quais – ainda que sejam compostos por átomos completamente desordenados em seu interior – servem como sustentação para uma casa, ele conclui: “Meu principal desafio na pesquisa é entender como a desordem origina a ordem em estruturas matemáticas relacionadas a redes e relações entre objetos. Essas estruturas servem para descrever coisas que vão desde o já mencionado Facebook, até as interações entre átomos de certos materiais.”