A importância do investimento em ciência, tecnologia e inovação para a saúde pública e para a indústria do setor foi tema das palestras de Luiz Eugênio de Souza, do Acadêmico José Fernando Perez e Ogari Pacheco, no painel C,T&I na Saúde, realizado no dia 8 de maio. Coordenado pelo Acadêmico Eduardo Moacyr Krieger, o painel integrou a Reunião Magna 2013 da Academia Brasileira de Ciências, que aconteceu no Rio de Janeiro.

Nas palavras de Krieger, vice-presidente da Fapesp e membro do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia do MCTI, ao abrir a sessão, “é necessário que este tema seja debatido pelos cientistas e pelos demais segmentos da sociedade. No caso da saúde, o diálogo com empresários e gestores é fundamental, por ser uma agenda incontornável para o desenvolvimento social, a pesquisa científica e a economia brasileira”.

Em conjunto, o painel abordou o tema abrangendo o setor público e o privado. Individualmente, no entanto, os palestrantes enfatizaram um ou outro setor, cabendo ao coordenador e à plateia uni-los em uma única proposta ou reconhecê-los como investimentos distintos.

As demandas da saúde pública

O primeiro palestrante, Luiz Eugênio de Souza, coordenador do Programa de Economia, Tecnologia e Inovação em Saúde da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva, abordou o papel da inovação, da tecnologia e da ciência para melhorar o serviço público de saúde do país.

Ele considerou que o sistema de saúde pública brasileiro tem especificidades a serem consideradas por cientistas, médicos e empresários. Ao relatar a fragilidade desse sistema, Souza indicou como esses profissionais poderiam colaborar para que uma solução fosse alcançada. Os empresários sabem que “o tema da inovação é especial, devido a dependência das importações de insumos que as indústrias do setor perpetuam para o prejuízo de toda a cadeia da saúde”; os médicos “podem auxiliar o entendimento e manter atualizado o perfil epidemiológico da maioria dos brasileiros, que são aqueles que dependem do Sistema Único de Saúde, o sistema público”; e os cientistas “podem desenvolver a tecnologia e a inovação necessárias para enfrentar este quadro epidemiológico”.

De acordo com o palestrante, as demandas da população deveriam orientar ou ajudar a orientar os investimentos em tecnologia e inovação no setor público e na área da saúde por completo, pois o governo brasileiro tem financiado pesquisas científicas, colaborado na formação de parques industriais, além de ser um grande consumidor. O desenvolvimento de uma saúde pública de qualidade, em sua opinião, deveria considerar ainda outros fatores. “A inovação deve passar pela prevenção e a promoção, pontos negligenciados, se comparados à atenção dada ao tratamento. Além disso, é indispensável ampliar o grupo de pessoas que decide o investimento dos recursos, de modo a incluir a sociedade que depende do sistema público, cientistas, gestores e, sim, empresários”, afirmou Souza. Com isto, concluiu o palestrante, “todo o ciclo da saúde será considerado, incluindo prevenção e promoção, e não apenas a doença. Afinal, haveria grupos distintos, com necessidades distintas, na decisão sobre esses investimentos”.

A perspectiva do setor privado

É importante notar que incluir a sociedade que depende do sistema público de saúde nas decisões referentes aos investimentos públicos na área não exclui a participação do setor privado. O entendimento demonstrado no painel foi que essa indústria alavanca as economias de todos os países, ao utilizar tecnologia de ponta e inteligência nacionais. Isto é especialmente importante para um país em desenvolvimento, como o Brasil, embora ainda não seja uma realidade, como demonstram os dados da Organização Mundial da Saúde e da Organização Mundial do Comércio, nos quais o país ocupa a 14a posição no mercado global de saúde, dominando apenas 0,5% dele na exportação de remédios e produtos de saúde. Ouvir os empresários, portanto, é importante, neste sentido.

Ogari Pacheco, presidente da Cristália, empresa brasileira de produtos químicos e farmacêuticos, foi o segundo palestrante. Ele introduziu a ótica empresarial no painel, lançando uma pergunta: “Inovamos porque crescemos ou crescemos porque inovamos? Não há resposta correta. Crescimento e inovação são indissociáveis, principalmente nas regras do mercado atual, no qual a grande competitividade, determina investimentos permanentes em ciência e tecnologia”, explicou.

Indo adiante, Pacheco argumentou que esta forma de ver crescimento e inovação justifica o valor que as indústrias devem dar aos cientistas e as universidades. Traduzido em ações, isso se faz “através de investimentos em centros de pesquisa e laboratórios universitários, na criação de espaços semelhantes a estes dentro das empresas, captando projetos científicos em desenvolvimento nas universidades, conhecendo estreitamente os grupos de pesquisadores nas regiões onde a empresa atua e nos setores no qual produz”.

O membro titular da ABC José Fernando Perez, diretor-presidente da Recepta Biopharma, empresa de biotecnologia no tratamento do câncer, foi o último palestrante do painel. Ele apresentou um levantamento com mais motivos para as empresas investirem em saúde no Brasil e ampararem-se na ciência. Para investir em saúde no país, ele citou a existência de pessoal científico e técnico altamente qualificado, excelentes instalações hospitalares com médicos e pessoal técnico com documentada experiência para a realização de testes clínicos, excelentes gestores oriundos da academia, custos operacionais menores quando comparados aos centros tradicionais, acesso a pacientes para a realização de testes clínicos de Fase I e II. “É fácil, se comparado aos centros tradicionais, tais como Estados Unidos, Europa e Japão. O motivo para trabalhar com cientistas brasileiros é a confiança na parceria, que interessa à indústria e à comunidade científica, o que garante execução de um bom negócio para ambos”, resumiu.

Após as apresentações, os empresários aproveitaram o interesse da plateia para expor diversos produtos criados por suas empresas nos últimos anos, aplicando conhecimento científico e investindo em tecnologia e inovação. Entre uma pergunta e outra, eles explicaram que as indústria investem estrategicamente a partir do mercado. “A indústria não é uma agência de fomento, o seu investimento em ciência, tecnologia e inovação é realizado para atender às demandas da própria indústria, mas no contexto de parceria esse inv
estimento leva benefícios para outros setores, a exemplo da universidade”, explicou Perez.

Por ser difícil separar os setores público e privado quando o assunto é saúde, o preço do medicamento no Brasil também foi questionado. Pacheco explicou que o alto preço do remédio é causado pelo custo elevado dessa produção no país. “Mesmo assim, o investimento em C,T&I continua sendo feito, porque só assim não fazemos cópias e sim produtos inovadores, que aumentam nossa competitividade e abrem novas perspectivas de tratamento”, respondeu.

O painel C,T&I na Saúde foi encerrado tendo oferecido duas visões sobre o tema, uma para o setor público e outra para o setor privado. Uma pergunta, no entanto, ficou no ar: sendo o governo federal cliente da indústria e investidor da pesquisa nessa área, ciência, tecnologia e inovação não deveriam beneficiar a saúde de todos os brasileiros e o ciclo da saúde por completo?