Demorou, mas compensou. É assim que cientistas analisam a reunião do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia (CCT), realizada na quarta-feira, 6 de fevereiro, com a presença da presidente Dilma Rousseff, pela primeira vez em seu governo. Esse foi o segundo encontro do colegiado no governo Dilma. O primeiro encontro do conselho – comandado pelo Palácio do Planalto – ocorreu em dezembro de 2011, sem a presença da presidente.
O que mais chamou a atenção dos cientistas-membros do CCT foi o compromisso de Dilma de se reunir com o colegiado, pelo menos, três vezes por ano, o que representa um marco na história do conselho. Desde sua criação, na década de 1980, o colegiado se reúne apenas uma vez por ano. O CCT é formado por cientistas, ministérios e representantes do setor industrial.
No entendimento dos cientistas, esse posicionamento de Dilma reforça o papel do CCT para o qual foi criado, de traçar diretrizes e fortalecer a política de ciência e tecnologia no País. Outro ponto destacado pela comunidade científica na reunião, dentre outros, foi o pedido de Dilma para o colegiado desenvolver para área de biotecnologia nacional, setor com forte potencial de crescimento no Brasil e que movimenta trilhões de dólares no mundo.
Próximo encontro
A prestação de conta dessas medidas deve ser feita a cada trimestre. Assim, o próximo encontro ficou agendado para daqui a quatro meses (junho), aproximadamente, quando o colegiado apresentará resultado das demandas solicitadas pela presidente da República.
Mudança de paradigma
Chaimovich concorda que o compromisso de Dilma com a área de ciência e tecnologia, de estreitar as relações, representa uma mudança de paradigma nas relações do Palácio do Planalto com o CCT. Outros cientistas-membros do CCT que participaram da reunião são a Acadêmica Helena Nader, presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), e seu vice-presidente, o físico Ennio Candotti. Compareceram também o físico Rogério Cezar de Cerqueira Leite, presidente do Conselho Administrativo da Associação Brasileira de Tecnologia de Luz Síncroton; a professora Marcia Cristina Barbosa, do Instituto de Física da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRS) e Mario Neto Borges, presidente da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig) e do Conselho Nacional das Fundações Estaduais de Amparo à Pesquisa (Confap).
Apoio inédito
Já Cerqueira Leite insistiu em dizer que o compromisso assumido por Dilma na reunião do CCT representa um momento inédito na história do Conselho. “A presidente está ouvindo os cientistas, isso é muito importante”, salientou Leite, também professor emérito da Unicamp, pesquisador emérito do CNPq e membro do Conselho Editorial da Folha de São Paulo. “Nunca houve apoio à ciência e tecnologia tão claramente definido no Brasil”, acrescentou, destacando o pedido da presidente de propostas “concretas ao CCT”, principalmente aos cientistas, para o desenvolvimento de áreas como a biotecnologia e novos laboratórios de uso aberto no país (acessíveis a todos os cientistas que tenham projetos viáveis e de boa qualidade).
Leite fez uma comparação do desempenho de um país que segue rigorosamente as ponderações científicas daqueles que as ignora. “A diferença é o atraso cultural e o atraso econômico quando os governantes não escutam as pessoas que pensam, as pessoas competentes e as que trabalham”.
Apesar de corte de recursos para ciência e tecnologia previstos na Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2013, Leite reconhece que Dilma “está colocando” mais dinheiro, por exemplo, na Finep e no CNPq, embora esse último precise de um apoio financeiro adicional. Aliás, disse Leite, Dilma entendeu o apelo de cientistas por recursos adicionais para o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), ao sinalizar que “pensaria no assunto”.
Colaboração
No geral, os cientistas entendem que a presidente Dilma busca a colaboração dos membros do CCT para fortalecer os instrumentos de política científica e os sistemas de ciência e tecnologia do país, com destaque para o CNPq e a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). A intenção é estimular a formação de capital humano em uma tentativa de alavancar o Plano Brasil Maior – política industrial, tecnológica e de comércio exterior lançada neste governo.
A professora do Instituto de Física da UFRS, Marcia Barbosa, considerou fundamental o fato de Dilma querer a colaboração da comunidade científica para buscar alternativas para o desenvolvimento da ciência no país.
“Ouvir o que o cientista tem a dizer sobre como fazer a transição de um país produtor de commodities para um país produtor de ciência e tecnologia (agregação de valor aos produtos) é muito importante”, disse Marcia.
Retomada de atribuições
O vice-presidente da SBPC, Candotti, avalia que o estreitamento das relações de Dilma com o CCT representa a recuperação do papel para o qual o CCT foi criado na década de 1980. “Em determinados momentos o CCT exerceu essa função (de apoiar ciência e tecnologia), mas ele sempre depende do interesse do presidente de atribuí-lo a essa missão, de fato”, analisou Candotti.