“Pai, você me dá um barco com controle remoto como aqueles que meus amigos tem?” – “Por que não fazemos um?” Este foi um dos muitos diálogos de pai e filho vividos por Paulo Sérgio Boggio que influenciaram muito o seu futuro. Seu pai é engenheiro eletrônico e continua trabalhando ativamente, sendo diretor de Tecnologia aplicada à Educação em São Paulo. Por isso, ele cresceu ouvindo sobre o ambiente escolar e sobre abordagens educacionais. O pai mantinha no sítio da família uma espécie de laboratório de inovação tecnológica voltado aos processos de aprendizagem. A infância e adolescência de Paulo foram permeadas por descobertas nesse laboratório, já que ele ficava durante a semana em São Paulo e, nos finais de semana, no sítio da família. em Pirapora do Bom Jesus.
Hoje ele considera uma infelicidade não ter realizado iniciação científica, mas sua meta naquele momento era ser psicólogo clinico. Apesar disso, no entanto, ele teve a oportunidade de cursar disciplinas voltadas para pesquisa e aprender por observação com professores importantes para sua formação, como Emma Otta. Paulo também menciona a oportunidade de ter sido aluno da Acadêmica Dora Fix Ventura, uma pioneira nas Neurociências no Brasil, além de César Ades.
Na USP, ele cursou mestrado e doutorado em psicologia, respectivamente nas áreas de psicologia experimental e em neurociências e comportamento. Ele considera uma honra ter sido orientado nessa fase por Maria Teresa Araujo Silva: neste convívio, Boggio aprendeu muito observando a forma dela resolver problemas, de raciocinar e, não menos importante, sua forma de se relacionar com alunos e docentes. “Esse foi um período de muito crescimento técnico, científico, mas também pessoal. Boa parte do que aprendi e que acredito ser importante em um cientista vem dessa época”, afirma. Também foi muito importante para seu crescimento o convívio e o acompanhamento de Dora Fix Ventura, que esteve presente em momentos cruciais, tendo sido membro da banca nas fases de qualificação e de defesa dos dois trabalhos.
As suas pesquisas estão voltadas para a compreensão da cognição e comportamento humano, utilizando diferentes medidas de investigação, que vão desde o comportamento e funções cognitivas avaliadas por procedimentos típicos da psicologia até o estudo das bases neurobiológicas subjacentes a eles. Ele estuda como se dá a interação social por meio de medidas de observação e, ao mesmo tempo, por meio de medidas da atividade cerebral. No laboratório que ele coordena, por exemplo, um dos objetos de estudo é a memória, demonstrando que é possível aprimorá-la através de técnicas de estímulo cerebral não-invasivas e que isto pode impactar positivamente pacientes com prejuízo de memória, como portadores da doença de Alzheimer. Também tem mostrado o papel crucial de algumas estruturas cerebrais em aspectos semânticos da memória, abrindo novas portas para a compreensão das falhas de processamento semântico da informação em patologias como o autismo.
“É fascinante o momento em que estamos vivendo, no qual há integração entre ambiente e a
parato biológico na explicação dos fenômenos humanos, ultrapassando dogmas antigos e ainda muitas vezes propagados”, observa. Boggio também vê no próprio trabalho científico um grande prazer. “Não consigo ver profissão melhor. Na ciência o desafio está diretamente relacionado com a curiosidade, com o constante surgimento de novas perguntas e busca por outras tantas respostas”, afirma.
Para ser um bom cientista, Boggio avalia que humildade é fundamental, principalmente pelo fato de que os modelos e explicações de hoje não serão os de amanhã. Além de humildade, curiosidade, dedicação intensa e com prazer são necessárias ao cientista. Para jovens interessados em se tornar cientistas, ele afirma que não há monotonia nesta carreira, sendo uma vida de muitos desafios intelectuais, técnicos e pessoais. Ele acredita que o interesse por ciência deva se iniciar na primeira infância. “Fica difícil imaginar desenvolver o espírito científico com o modelo educacional vigente, que segue moldes tradicionais de ensino”, questiona. E acredita que é uma boa ajuda propor aos estudantes alternativas que agucem e estimulem a curiosidade e a capacidade de solução de problemas de forma criativa.
“O título de membro afiliado da ABC tem um significado ímpar. Foi um reforço, uma recompensa de valor intangível com relação às minhas escolhas na ciência. Ganhei energia para seguir nesse caminho e, em particular, em disseminar a ciência como um caminho possível de escolha profissional em nosso país”, enfatiza. Ele quer contribuir no esforço da Academia Brasileira de Ciências em levar conhecimento científico a todas as camadas da sociedade, evidenciando cada vez mais o papel da ciência no desenvolvimento de uma nação.