O governo está estudando criar um instituto ou centro nacional de oceanografia para coletar informações sobre a costa brasileira. A informação é do Acadêmico e climatologista Carlos Nobre, secretário de Políticas e Programas de Pesquisa e Desenvolvimento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI). “Estamos pensando no melhor formato, se será um centro ou instituto nacional temático nos moldes dos INCTs [Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia]. Ainda não sabemos como será, mas essa é uma das prioridades do governo”, disse Nobre durante a sessão sobre Oceanos – coordenada pelo também Membro Titular da ABC Luiz Drude de Lacerda – da Reunião Magna da Academia Brasileira de Ciências, no Rio de Janeiro.
A novidade veio como resposta ao físico e oceanógrafo da USP Edmo Campos, que falou sobre a necessidade de pesquisas nacionais oceanográficas no Brasil. “Os engenheiros que estão projetando o pré-sal acham que o oceano é uma piscina sem movimento, que basta colocar uns tubos e extrairemos petróleo de camadas profundas. Mas não é assim”, disse Campos.
Luiz Drude de Lacerda, Cesar Martins, Edmo Campos e Angela Wagener
De acordo com o especialista – que é um dos 25 cientistas brasileiros membros do IPCC, o painel da ONU sobre o clima – faltam informações sobre o movimento do oceano na costa brasileira e sobre os impactos das mudanças climáticas nessa dinâmica. “Ter um grande instituto é a única forma de fazer pesquisa oceanográfica em escala nacional”. Segundo Campos, já se sabe que o Atlântico Sul está sofrendo alterações que podem se propagar aos demais oceanos. “Mas não temos trabalhos de observação suficientes para compreender esse fenômeno”.
Já para a presidente da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), a Acadêmica e biomédica Helena Nader, a Marinha deve investir em pesquisas nacionais sobre o mar. A SBPC e a ABC apoiam a proposta relatada pelo deputado Fernando Jordão (PMDB-RJ) no Projeto de Lei 8.051/2010, que divide os royalties dos contratos de concessão do pré-sal entre o MCTI e a Marinha.
O Alpha Crucis
O físico e livre-docente da Universidade de São Paulo (USP) Edmo Campos falou sobre o Alpha Crucis, navio oceanográfico que deve chegar ao porto de Santos, em São Paulo, no dia 10 de maio. O navio foi comprado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) por US$ 11 milhões e tem capacidade para 20 pessoas. Esse será o único navio nacional para pesquisas oceanográficas disponível no país. O anterior, batizado de professor Wladimir Besnard, sofreu um incêndio e foi inutilizado em 2008. “Estamos todos ansiosos pela chegada do Alpha Crucis e pelo início das pesquisas”, disse.
Amazônia Azul
Campos também falou sobre a importância da região que percorre o litoral brasileiro chamada de Amazônia Azul, um território submerso de milhões de quilômetros quadrados, repleto de riquezas biológicas e minerais. Assim como a Amazônia Verde, a área é ameaçada pela exploração predatória e interesses internacionais. “A Amazônia Azul faz parte da região chamada de Zona Econômica Exclusiva Brasileira”, explicou. “Sua área equivale a da Amazônia verde. É dentro desta região que está o pré-sal, por isso ela tem uma importância econômica para as próximas décadas. Por estar no oceano, requer um conhecimento um pouco alem do petróleo, especificamente.”
Pesquisas sobre a contaminação ambiental
A sessão da Reunião Magna da ABC sobre Oceanos contou também com apresentações da professora da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) Angela Wagener e do pesquisador da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Cesar Martins.
Wagener mostrou detalhes da sua pesquisa, que consiste em buscar mais informações sobre a contaminação ambiental. Seu trabalho envolve os hidrocarbonetos – grande grupo de substâncias químicas constituídas de carbono e hidrogênio que provém de varias fontes naturais e antrópicas. Dentro desse grupo, ela trabalha especialmente com os policíclicos aromáticos (HPAs).
A doutora em Química explicou que há uma dificuldade acentuada em se conseguir assegurar a fonte do hidrocarboneto encontrado em águas, sedimentos e biotas. Boa parte do seu trabalho é feito na região da Baía de Guanabara, do porto do Rio de Janeiro, São João de Meriti e outras áreas bastante contaminadas.
Já o Doutor em Oceanografia Quimica e Geologica e professor do Centro de Estudos do Mar da UFPR Cesar Martins utiliza marcadores orgânicos geoquímicos como ferramenta para o entendimento das mudanças naturais. Segundo o pesquisador, esses marcadores podem ser de origem natural ou antrópica e têm uma natureza específica, estabilidade química, resistência a processos de degradação e pouca alteração em uma determinada escala de tempo. Assim, servem como indicadores de eventos e processos. Dentro dessa categoria incluem-se os HPAs, estudados por Wagener, além de esteróis fecais, indicadores que não causam nenhum tipo de dano para a biota. “Coprostanol é um esterol utilizado pra esse fim, que está agregado a fezes humanas. Se encontro muito desse composto no ambiente, significa que o local foi exposto ao esgoto”, exemplificou o pesquisador.