“Iniciativas capazes de transformar a vida de pessoas, por meio da educação, da arte ou da ciência”. Assim “O Globo” descreveu de modo geral os trabalhos dos agraciados com o Prêmio Faz Diferença, promovido pelo próprio jornal com o apoio do Sistema Firjan, na matéria publicada na edição do dia 29 de março. Nessa descrição, encaixam-se os Acadêmicos Miguel Nicolelis e Stevens Rehen, que subiram ao palco do Golden Room do Hotel Copacabana Palace no dia 27 de março para serem homenageados nas categorias Personalidade do Ano e Ciência/História, respectivamente.

O neurocientista Miguel Nicolelis recebeu o principal prêmio da noite das mãos do vice-presidente das Organizações Globo, João Roberto Marinho, e do diretor de redação do “O Globo”, Ascânio Seleme. Ele se disse satisfeito por três cientistas estarem sendo homenageados na cerimônia – além dos Acadêmicos, também foi premiada a diretora do Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Denise Pires de Carvalho, na categoria Saúde. “Isso mostra que a ciência brasileira está lentamente, mas de forma definitiva, assumindo um papel de maior relevância e sendo reconhecida como uma atividade de importância para o país”, defendeu o pesquisador da Universidade de Duke, nos Estados Unidos.

O trabalho de Nicolelis é desenvolver a interface cérebro-máquina, possibilitando que a força da mente mova objetos virtuais e que, assim, pessoas com paralisia voltem a andar. Um de seus objetivos é que uma criança paraplégica dê o pontapé inicial da Copa do Mundo de 2014, que será realizada no Brasil. “Acho que o cientista nunca se aposenta; sempre tentamos dar continuidade aos nossos devaneios intelectuais. Essa área de neuroengenharia está crescendo muito no mundo todo e quero continuar participando até o final da minha vida!” Em seu discurso, Nicolelis declarou que a ciência tem a chance de construir uma nação e é um agente de transformação social. “Nesse prêmio, conheci exemplos maravilhosos de brasilidade. A face do Brasil mudou. Aqui, se tira poesia do lixo. O país do futuro que era tão falado, mas que jamais chegava, finalmente chegou.”


Ana Lucia Azevedo, Stevens Rehen e Jorge Moreno

Já o prêmio do bioquímico da UFRJ Stevens Rehen foi entregue pela editora de Ciência do “O Globo”, Ana Lúcia Azevedo, e pelo diretor da Infoglobo em Brasília, Jorge Bastos Moreno. Rehen coordena uma equipe com mais de 30 pesquisadores no Hospital Universitário Clementino Fraga Filho e seu laboratório produz 50% de toda a ciência de células-tronco embrionárias no país. Recentemente, ao utilizar a técnica de reprogramação celular em células da pele de pessoas com esquizofrenia, transformando-as em neurônios, ele identificou distúrbios no metabolismo desses pacientes, um feito inédito no mundo. “Existe uma percepção social sobre a importância da ciência para o progresso do país”, comentou o Membro Afiliado da ABC. “Isso tem que se transformar em mais investimentos, não só do governo, mas também da sociedade.”

Rehen afirmou que, além dos desafios inerentes à ciência, existem as questões da burocracia, cortes no orçamento e outras dificuldades que precisam ser trabalhadas. “Apesar do cenário otimista, a ciência brasileira tem que crescer mais; ainda temos poucos cientistas no país.” Entretanto, o pesquisador reconheceu a importância de iniciativas como o Prêmio Faz Diferença: “Um dos pontos mais positivos da visibilidade que esse tipo de prêmio traz é poder mostrar quem são os cientistas, o que fazem e congregá-los dentro de uma festa com outras personalidades. Isso desmitifica aquela ideia de que o cientista é uma pessoa diferente.” E, após dois pós-doutorados em neurociência nos Estados Unidos, ele admite: “Apesar das complicações, nunca estive tão feliz quanto hoje, no Brasil.”


Edmar Bacha, sua esposa e a filha premiada ao centro, Julia Bacha

Outro Acadêmico estava presente na cerimônia, mas no papel de pai: o economista Edmar Bacha subiu ao palco com a esposa para prestigiar a entrega do prêmio na categoria Mundo para sua filha, a cineasta Julia Bacha. Ela já conquistou 15 premiações pela direção do filme “Budrus”, que aborda o conflito entre Israel e Palestina. Julia se mostrou satisfeita com a oportunidade de tornar o Oriente Médio mais visível no Brasil e afirmou que seu trabalho é uma prova de que há israelenses e palestinos que atuam juntos para construir a paz, como os membros da sua equipe.

Qual é a importância da ciência para a sociedade?

A pergunta foi feita a premiados da noite e outras personalidades que participaram do evento, mas que não tinham relação com o meio científico. Para a atriz Cassia Kis Magro, a ciência melhora a qualidade de vida do ser humano: “Ao contrário do que muita gente pensa, eu acho que o mundo está muito melhor atualmente, e uma fatia enorme disso é responsabilidade da ciência. Mas também sei que o Brasil investe pouquíssimo nessa área”. Já o ator Tiago Abravanel, ganhador da categoria Segundo Caderno /Teatro, afirmou que a ciência é essencial para a evolução do país. “É importante sermos reconhecidos na área em que atuamos, seja cultura, ciência ou esporte”, completou.

Vencedor da categoria Economia, o empresário Eike Batista acredita que a ciência é vital: “A humanidade teve uma evolução extraordinária através das ciências dos diferentes setores – biotecnologia, a área nuclear, a engenharia e outras. É absolutamente necessário dar esses exemplos e motivar jovens”. Ele declarou que o prêmio gera, justamente, a semente da motivação. “Isso vale ouro, porque é a motivação que muda o mundo, na verdade.” Batista acentuou que o Brasil tem que investir mais, acreditar mais e ser mais ousado, enfatizando a necessidade de se gastar com pesquisa, ainda que o retorno não seja garantido: “É o que eu faço na minha empresa”. Em seu discurso, Eike Batista reiterou a importância que dá a essa área: “Todos os meus amigos da ciência podem contar comigo. Eu adoro investir em ciência.”

O colunista do jornal “O Globo” Ancelmo Góis (à esquerda), que apresentou o prêmio juntamente com a comentarista de Economia Miriam Leitão, relacionou ciência a prosperidade: “Pode-se descobrir ouro, petróleo, mas existe uma outra matéria-prima, chamada educação, que faz a diferença no progresso. E a ciência é a parte nobre da educação. Quem conseguir avançar na ciência está avançando na educação e, portanto, na sociedade”. Jorge Bastos Moreno (à direita) afirmou que é através da ciência que a sociedade se descobre: “Temos grandes cientistas fazendo trabalhos no mundo todo e que não têm o reconhecimento que deveriam. Então uma premiação onde são agraciados vários pesquisadores é importante para que os leitores saibam quem são os nossos cientistas.”

Vencedora da categoria Revista da TV, juntamente com Thelma Guedes, a autora da novela “Cordel Encantado” Duca Rachid acha que a ciência é fundamental para tirar as pessoas da escuridão: “Ela contribui para o desenvolvimento humano”. O colunista do “O Globo” e membro da Academia Brasileira de Letras Merval Pereira declarou que é importantíssimo o trabalho dos cientistas premiados: “Eu fiz parte do júri que escolheu o Nicolelis para Personalidade do Ano, então isso já dá a dimensão da minha opinião. Sem apostar na educação e na ciência e tecnologia, o país não vai ser competitivo nesse mundo atual.”
Também colunista do jornal, Zuenir Ventura (à esquerda) considera que o prêmio simboliza o casamento entre cultura e ciência: “Um país não avança sem esses dois fatores”. Premiado na categoria Prosa&Verso, o diretor da editora da Uerj, Ítalo Moriconi, (no centro) acredita que a ciência está cada vez mais presente na sociedade: “Estamos num grande salto tecnológico; nem conseguimos prever qual a consequência social e antropológica disso”. Já o representante da ONG “Um teto para o meu país” Luciano Coelho, (à direita) agraciado na categoria Razão Social, afirmou que o seu projeto leva para as pessoas que têm menos oportunidades o contato com aquelas que têm mais: “Grande parte dessas oportunidades é proporcionada pela ciência, pois buscamos metodologias inovadoras para elas se desenvolverem melhor. Ou seja, tudo tem a ver com ciência.”