A geneticista Mayana Zatz, coordenadora do Centro de Estudos do Genoma Humano da Universidade de São Paulo (USP), é hoje um dos principais nomes da ciência nacional e uma das responsáveis pela aprovação de pesquisas com células-tronco no País. Ela testa essas células em modelos animais com distrofia muscular – uma doença genética sem cura – e coordena o aconselhamento de casais com incidência de doenças genéticas na família.
Zatz participou de uma sabatina na segunda-feira (13/2), no Teatro Folha, em São Paulo. Ela respondeu às perguntas dos jornalistas da Folha Reinaldo José Lopes, editor de “Ciência” e “Saúde”, Marcelo Leite, editor de “Opinião”, e Hélio Schwartsman, colunista do jornal, além da editora de Ciência e Saúde do UOL, Tatiana Pronin.
Acompanhe os principais trechos da sabatina.
Tratamento – Se alguém estiver cobrando tratamento com células-tronco, tome cuidado. O que temos hoje é pesquisa – e pesquisa não pode ser cobrada. O único tratamento que existe é a infusão de células-tronco coletadas do sangue do paciente e usadas em um autotransplante de medula óssea [como no tratamento de Reynaldo Gianecchini]. Não sabemos os riscos de outras aplicações, como em rugas.
Exames genéticos – Por que se faz exames na gravidez como o ultrassom? É a mesma filosofia dos exames genéticos. Quando começamos a oferecê-los, os abortos diminuíram. Havia quem abortasse com medo de que o filho tivesse uma doença genética presente na família.
Burocracia – O custo para fazer um genoma no Brasil é cerca de cinco vezes maior do que na China. Temos muitas dificuldades para fazer pesquisa, especialmente para importar material. O governo diz que precisamos importar a cada seis meses. Isso é o mesmo que dizer a uma dona de casa que ela precisa comprar de uma vez só tudo que usará em seis meses. Sobra farinha e falta fubá. Os materiais são cadastrados, os pesquisadores são cadastrados. Por que não importamos material científico como se importam livros?
Religião – Muitas pessoas que nos ajudaram a aprovar a lei que autoriza pesquisas com células-tronco no Congresso [em 2005] são evangélicas. Um dirigente católico já me disse para não desistir da luta: “a Igreja muda de posição”.
Expectativas – Não queremos criar falsas expectativas e nem usar os pacientes como cobaia. Mas não podemos parar de divulgar os resultados das pesquisas para mostrar que os trabalhos têm andado.
Informação genética – Há empresas dos EUA sequenciando genoma e mandando pelo correio por mil dólares. Esses testes não são confiáveis e as pessoas não saberão interpretar os dados.
Ética – Se um paciente nos procura por causa de um problema muscular e descobrimos que ele tem gene para Alzheimer, devemos contar? Os EUA contam tudo. Aqui nós perguntamos se a pessoa quer saber as doenças que pode ter. Os exames genéticos mostram que 10% das pessoas não são filhos de quem pensam ser. Nós só falamos essa informação caso afete o tratamento ou aconselhamento genético.
Genes “fúteis” – Sou totalmente contra manipulação genética de genes que chamo de “fúteis”, como para aptidão a esportes ou cor dos olhos. E se o filho, em vez de esportista, quiser ser músico?
Futuro da genética – Pense na complexidade que é um ser humano. Hoje sabemos que não basta ter um gene para manifestar uma doença. Há genes “protetores” que parecem impedir essa manifestação. Ainda temos muitas perguntas.