A mesa-redonda sobre Inovação deu início ao segundo dia de atividades do Simpósio “Ciência, Tecnologia e Inovação: Visões da Jovem Academia”, em 15/9, na sede da ABC. Os palestrantes foram os Acadêmicos Afiliados Ado Jório de Vasconcelos, do Departamento de Física da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Edleno Silva de Moura, do Instituto de Ciências Exatas da Universidade Federal do Amazonas (UFAM) e o convidado Robert Wilson, da Aceleradora de Empresas StartUp Tropical Angels. O mediador Rafael Roesler, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, também fez uma pequena apresentação e Marcos André Gonçalves, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), foi o relator.

Marcos André Gonçalves, Rafael Roesler, Robert Wilson,
Edleno Silva de Moura e Ado Jório de Vasconcelos


Marcos Gonçalves, professor da área de Ciência da Computação da UFMG – com uma longa história de transformação de resultados de pesquisa em protótipos tecnológicos, inclusive com obtenção de patentes – reforçou que a mesa iria tratar de questões sobre incentivos a empresas startups, a Lei de Inovação, a garantia de retorno de riqueza à universidade, como apoiar e aumentar o número de cientistas nas empresas, como aproximar as empresas das universidades e como considerar aspectos relativos à inovação na avaliação de indivíduos. “Estamos vivenciando uma ditadura da inovação? Ou seja, um projeto para ser bom tem que inovar? Que impacto a produção tecnológica pode ter sobre a científica?”.

Contribuições dos NITs

Membro Afiliado desde 2008, Ado Jório de Vasconcelos, diretor da Coordenadoria de Transferência e Inovação Tecnológica da UFMG (CTIT), falou sobre Inovação nas universidades brasileiras. De acordo com ele, o Brasil obteve um bom nível de produtividade, de crescimento econômico – cerca de 7,5% – e alcançou a 13ª posição mundial em número de publicações em 2010. “Fomos responsáveis por 60% da produtividade da América Latina, o que resultou em diversos artigos na Nature, Science e outras publicações”.

Jório ressaltou que o país vive uma fase de financiamento muito boa, mas indagou onde exatamente o Brasil se encontra no quadro mundial. Segundo o Acadêmico, existe sim a ditadura da inovação e que os chamados NITs (Núcleos de Inovação Tecnológica) têm um papel importante dentro desse cenário. Ele explicou que com a implementação da Lei de Inovação, passou a ser exigido a criação dos NITs – ambientes especializados e cooperativos na geração sistemática de processos vinculados à inovação, como geração de produtos, pedidos de patente, entre outros. Por meio da participação ativa das Instituições de Ciência e Tecnologia (ICTs), o NIT fica com a finalidade de administrar a política de inovação da ICT. “O país hoje está se estruturando para fazer inovação, assim como se estruturou para fazer pesquisa nas últimas quatro décadas.”

Em números, o estado de Minas Gerais é o que tem mais NITs, com 21. Em segundo, vem o Rio de Janeiro com 19 e São Paulo, em terceiro, com 16. “A Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig) tem dado um apoio enorme à criação de uma rede de NITs”, esclareceu o físico, salientando que com a Lei da Inovação, os direitos da pesquisa passaram a ser da instituição. “Assim, elas começaram a criar seus próprios NITs e ganham com isso”.

Por fim, o físico comparou o cenário da inovação brasileira com o cenário internacional, destacando os seguintes dados: a UFMG alcançou 400 patentes em toda a sua história, enquanto o Massachussets Institute of Technology (MIT/EUA) faz 60 pedidos por ano. “Indo além, o chefe de um NIT no MIT precisa ter 15 anos de experiência. Ou seja, ser Doutor ou PhD e ter trabalhado na indústria. Aqui não há esse tipo de exigência, o que demonstra a grande diferença entre os níveis de profissionalismo”.

Pequenas empresas, grandes negócios

O segundo apresentador, Edleno Silva de Moura, também é experiente na criação de startups, tendo sido diretor de Tecnologia da empresa Akwan S/A, que foi adquirida pela Google Inc e se transformou na sede da empresa na América Latina, e sócio fundador da empresa de Tecnologia da Informação Nhemu, especializada em sistemas de informação voltados para a web.

Eleito Membro Afiliado da ABC para o período 2008-2012, Edleno falou sobre Pesquisa e empreendedorismo nas universidades, contando um pouco sobre suas experiências como pesquisador e um dos líderes do grupo de pesquisa de Banco de Dados e Recuperação de Informação (BDRI) da UFAM. “No Departamento de Ciência da Computação da UFAM temos um histórico razoável de publicações e formamos muita gente, mas não é o suficiente”. Moura observou que a equipe é comprometida com a qualidade da pesquisa e com resultados de excelência, assim como com a obtenção de valor no mercado e a capacidade de empreender. “Carregamos, acima de tudo, essa ideia do empreendedorismo, pois, combinando-o à pesquisa de ponta, aumentamos nossa contribuição à sociedade, a interação entre a indústria e a Academia, popularizamos a ciência no país e melhoramos nossas condições de vida”.

Na experiência com a empresa Akwan, da qual participou desde a criação, o pesquisador manteve contato com investidores e possíveis parceiros de negócio, o que contribuiu para o surgimento de mais duas empresas: a Nhemu e a Zunnit. “Nossos projetos são focados no desenvolvimento de tecnologias e os alunos são encorajados a desenvolver produtos. Dizemos a eles: Doutor e Mestre não precisam se restringir somente à docência; podem e devem atuar também na indústria, sendo empresários e donos de empresa”. Moura ressaltou ainda que a Akwan começou com investimentos de professores, a Zunnit recebeu capital de pessoa física e a Nhemu foi financiada por uma aceleradora de empresas chamada Blackey. “E o retorno para a universidade? Não é motivo de preocupação, pois ela sempre terá retorno. Temos como exemplo a Google e a Yahoo! que doam fortunas às universidades onde foram criadas”.

Por fim, Edleno Moura reiterou que empresas intensivas em tecnologia precisam de vínculos com grupos de pesquisa das universidades. “É o caminho para que se mantenham atuantes no mercado”.

Universidade e empresa caminhando juntas

Rafael Roesler, também Membro Afiliado da ABC desde 2008, é professor do Departamento de Farmacologia da UFRGS. Atua como pesquisador e consultor em vários projetos envolvendo parcerias entre universidades e empresas para inovação nos setores farmacêutico e biotecnológico. Em sua apresentação, ele relatou sua experiência com a formação de empresas biofarmacêuticas spin-off criadas na região Sul. “A questão é como nosso trabalho dentro da universidade chega como resultado à sociedade e ao mercado”. Roesler disse que a Lei da Inovação é muito centrada em viabilizar esse caminho mas que, por outro lado, ela complica com a burocratização.

Segundo ele, na inovação farmacêutica não é esse o caminho que funciona melhor. “A conversa entre o setor da pesquisa acadêmica e as grandes indústrias farmacêuticas não acontece facilmente. A melhor solução, em nível mundial, ocorre quando nasce uma spin-off a partir da pesquisa acadêmica, ou seja, uma pequena empresa inovadora vinculada ao instituto de pesquisa e à universidade”, explicou, acrescentando que embora não esteja previsto no sistema a comunicação entre as pequenas e grandes empresas, é preciso estimular e fazer acontecer essa interação.

O pesquisador citou como exemplo a NeuroAssay, spin-off que seu grupo de pesquisa criou. De acordo com ele, pequenas empresas sobrevivem de dinheiro público e do capital de investidores de risco. “Em 2008, sentamos com a Comissão de Biotecnologia da universidade e, sem nos afastarmos de nossa atividade de docência, formamos uma equipe científica. Os pesquisadores envolvidos tiveram a oportunidade de trabalhar com P&D, aplicando o que eles aprenderam no doutorado”, ressaltou.

Concluindo, Roesler relatou que, desde 2008, quando a empresa foi criada, o projeto só coletou casos de sucesso, tendo sido escolhido duas vezes pelo edital do Programa de Recursos Humanos para Atividades Estratégicas em Apoio à Inovação Tecnológica (RHAE – Pesquisador na Empresa/CNPq) e uma vez pelo Programa Primeira Empresa Inovadora (PRIME/Finep). “Além disso, conseguimos parcerias com instituições de outros países e um depósito de patente dos NANts, série de compostos inéditos com potencial terapêutico em câncer e doenças cerebrais, desenvolvidos em parceria com a UFRGS e a Noddtech Ltda.”

Ciência e negócio: fundo de capital de risco que investe em inovação tecnológica

A última apresentação da mesa sobre Inovação no evento da Jovem Academia foi a do engenheiro Robert Wilson, que apresentou uma parceria entre três iniciativas que visam formar um ponto central internacional de investimentos, inovação e criação de valor. Formado em Filosofia pela Stanford University, com Law Degree pela Harvard University, Wilson é sócio fundador da Ouranos L Venture Partners, um fundo de capital de risco que investe em inovação tecnológica para desenvolvimento sustentável no Brasil e no exterior, cujo primeiro projeto é a Tropical Angels, aceleradora de empresas nascentes nas áreas de tecnologia verde, biotecnologia aplicada à biodiversidade e ciências naturais, tecnologia da informação e inovação social. “Essas duas instituições, junto à StartUpRio!, objetivam colocar o Rio de Janeiro no mapa global da inovação tecnológica”, explicou.

Segundo ele, a estratégia apóia a criação de um caminho de futuro sustentável para a cidade no século XXI, além de pensar como utilizar e maximizar a exposição do Rio, a partir dos grandes eventos que sediará, e como criar um novo foco de investimentos. “A StartUpRio! é um projeto catalizador que agrega capital de risco, mentores globais, empreendedores e inovação tecnológica. Queremos transformar o Rio de Janeiro em um pólo de excelência”.

A aceleradora tem parcerias com os setores privado e público, centros acadêmicos e de pesquisa. Diferentemente de uma incubadora, que assiste pequenas empresas no ambiente universitário por tempo indeterminado, uma aceleradora financia a empresa – o que a incubadora não faz – por um prazo de três a seis meses e oferece espaço de trabalho, networking, colaboração de mentores, entre outros. “A incubadora disponibiliza espaço gratuito, internet, telefone e aconselhamento acadêmico a estudantes com ideias inovadoras. A aceleradora estimula a criação de um ecossistema permanente de empreendedorismo, capital de risco e TI”, finalizou Wilson.

Criando uma cultura de inovação

Após o debate, o relator da mesa, Marcos Gonçalves, elaborou um relatório com as principais propostas que surgiram. Uma dos destaques foi para a desburocratização, que traria agilidade para os processos internos das universidades quanto a iniciativas de inovação, principalmente com relação à criação de pequenas empresas.

Outro fator igualmente importante destacado foi a promoção de atividades multidisciplinares entre as partes envolvidas, como procuradores, cientistas e órgãos reguladores. “Não podemos esquecer de propor melhorias para a Lei da Inovação, a partir do fortalecimento das fundações universitárias e do surgimento de mecanismos que facilitem a importação de insumos paras as empresas inovadoras. A Lei precisa regular, e não gerar impasses e bloqueios”, ressaltou Gonçalves.

Quanto ao nível educacional, os Acadêmicos fortaleceram a ideia da criação de uma cultura de inovação desde o ensino básico à pós-graduação, disponibilizando recursos para a infra-estrutura necessária. “Vamos estimular essa caça de talentos. Para isso, a educação fundamental e média precisam trabalhar a criatividade das crianças, as instituições devem sediar feiras de empreendedorismo, oferecendo a ajuda de orientadores e mentores especializados aos que decidem montar uma empresa”, disse o relator, defendendo também o fortalecimento da pós-graduação empresarial.

No relatório apresentado por Gonçalves também constaram possíveis incentivos para os pesquisadores da área como, por exemplo, uma medida que avalie o número de empresas startups criadas e os empregos gerados. “Temos pesquisadores muito bons trabalhando em alguns NITs e outros que precisam de estímulos e de contatos com as pessoas certas, a tão valorizada networking. Por que não promover uma colaboração entre essas unidades e fomentar atividades de capacitação para as regiões com mais assimetrias?”, observou Gonçalves.

Finalizando a discussão, Edleno Moura apontou a importância de uma rede de colaboração que integre os profissionais, incluindo redes sociais de inovação fomentadas pelas FAPs. “Precisamos de atrativos para os pesquisadores como bons salários, auxílio de doutores estrangeiros que contribuam com o seu know-how e incentivos para atrair as empresas para as universidades. Somos muito bons em aprender, basta querermos e faremos inovação” concluiu.

Assista ao vídeo com o relatório da Mesa Inovação.