O Simpósio Indo-Brasileiro de Ciências Biomédicas ocorreu nos dias 29 e 30 de agosto, com o objetivo de reunir cientistas de ambos os países para promover a integração e a troca de conhecimento nas áreas da neurociência e células-tronco. Na manhã do primeiro dia, palestraram no evento os Acadêmicos Roberto Lent e Fernando Garcia de Mello, assim como os pesquisadores indianos Vijayalakshmi Ravindranath e Anuranjan Anand. As apresentações abordaram o cenário das doenças neurodegenerativas nos dois países – como a epilepsia, Mal de Parkinson, Mal de Alzheimer, entre outras -, evidenciando as pesquisas que estão sendo desenvolvidas e futuros tratamentos.

Revisando dogmas da neurociência

O neurocientista Roberto Lent, do Laboratório de Neuroplasticidade do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade Federal do Rio de Janeiro (ICB-UFRJ), é Mestre e Doutor pelo ICB e PhD pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT). Ele tratou da evolução e o desenvolvimento do cérebro, apresentando resultados de doze anos de trabalho. “Não trouxe grandes aplicações médicas ou tecnológicas. A minha pesquisa mudou alguns dogmas da neurociência quantitativa. Com os nossos estudos, desenvolvemos um método quantitativo para levantar os números absolutos de neurônios de diferentes regiões do cérebro, como o cerebelo ou hipocampo”, relata Lent.

Com seu trabalho, o Acadêmico deu início a uma análise que observa a perda de neurônios do cérebro em condições patológicas, como, por exemplo, em indivíduos que sofreram acidente vascular cerebral (AVC), epilepsia, Alzheimer e outras doenças neurodegenerativas. “A princípio, esses 10-12 anos de pesquisa serviram para otimizar o método e aplicá-lo a conceitos básicos, revisando certos dogmas. Por exemplo: estimava-se que o cérebro tinha cem bilhões de neurônios, descobrimos que tem menos. Acreditava-se que o córtex foi a região que mais se desenvolveu durante a evolução, mas foi o cerebelo”.

Buscando os estágios iniciais do Alzheimer

Desde 2009, a pesquisadora Vijayalakshmi Ravindranath é a responsável pelo Centro para Neurociências, do Instituto Indiano de Ciências, onde pesquisa o mal de Alzheimer. A indiana conta que a incidência dessa doença e de outras similares aumentou ao redor do mundo. “São enfermidades que não tem nenhuma cura até o momento, apenas tratamentos sintomáticos que, ao final, não resultam em nenhuma melhora”, explica.

Segundo ela, seus estudos vão em duas direções. De início, é tentar entender quais os primeiros sintomas que levam à doença, obervando os sinais que, muitas vezes, passam despercebidos. “Dependendo do momento em que o paciente descobre ser portador da doença, pode ser tarde demais, porque os neurônios já perderam sua capacidade, já estão mortos”. Seu trabalho busca responder a uma pergunta principal: por que o falecimento de um pequeno setor de neurônios, em uma região muito pequena do cérebro chamada substância nigra, acaba causando danos tão sérios para o paciente? O outro foco da pesquisa é descobrir novas drogas para a enfermidade, a partir dos estudos em seu laboratório.

Para ela, o Brasil possui uma comunidade científica muito forte. “Procuro promover uma ampla troca de conhecimentos entre os dois países, não apenas para o meu laboratório. Juntar pesquisadores capacitados das mais diferentes nacionalidades em um mesmo assunto enriquece e renova”.

O Acadêmico Fernando Garcia de Mello, chefe do Laboratório de Neuroquímica do Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho da UFRJ (IBCCF-UFRJ), é Mestre em Biologia e Doutor em Ciências pela UFRJ. Assim como Vijayalakshmi, ele também tenta identificar quais os mecanismos ou os primeiros eventos que ocorrem no cérebro e no sistema nervoso dos indivíduos que vão desenvolver Alzheimer, que, segundo ele, é uma doença que na maioria dos casos é diagnosticada em um estágio muito avançado. “Dificilmente é possível reverter os quadros clínicos característicos do Alzheimer. Atualmente, a tendência dos pesquisadores é tentar identificar quais são os eventos mais iniciais dessa patologia. Com isso, seria possível aplicar diagnósticos mais precisos e promover intervenções farmocológicas e clínicas que impeçam o avanço da enfermidade. Estamos perto disso? Ainda não.”

Os genes da epilepsia

O cientista indiano Anuranjan Anand, do Centro Jawaharlal Nehru para Pesquisa Científica Avançada (JNCASR, na sigla em inglês), é professor titular e presidente do mesmo instituto. Pesquisador responsável pelo Laboratório de Genética Humana, Anand desenvolve um trabalho voltado para pacientes com epilepsia. “A principal característica dessa doença é o estado de descontrole de algumas subregiões do cérebro. Olhando para o nível celular, eu tento descobrir quais os genes responsáveis por alterar a função cerebral durante o episódio epiléptico”, aponta.

Em sua apresentação, Anand explicou que tenta identificar o máximo de genes diferentes possíveis que alteram as condições cerebrais. O indiano, que junto com seu grupo de pesquisa conseguiu descobrir alguns dos genes associados ao estado clínico da doença, disse que o objetivo atual dos pesquisadores envolvidos com a patologia é mostrar os esforços dos laboratórios, priorizando uma ação conjunta, pois, assim, é possível avançar e ter esperança de criar novas terapias para a população que sofre com epilepsia. “Essa é uma das maiores expectativas globais. Mas nem todo conhecimento é facilmente e rapidamente aplicado, pois essa enfermidade é tremendamente complexa: são cerca de 40 classes diferentes de epilepsia e cada uma delas está associada a uma determinada subregião e a diversas funções do cérebro”.