Um país onde muito se pesquisa e pouco sai do papel. É este o Brasil destacado por um levantamento inédito do Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi), realizado entre estabelecimentos de pesquisa não-acadêmicos. A pequena quantidade de pedidos de patentes, segundo os autores do estudo, mostra a dificuldade para aplicar, na prática, os investimentos públicos em ciência, que aumentaram significativamente nos últimos anos. Em 2009, o Brasil publicou 32 mil artigos em publicações científicas, o que equivale a 54% da produção latino-americana e 2,7% da mundial.
Foram contabilizados 673 pedidos de patentes entre 1990 e 2007. As instituições que encabeçam o ranking das invenções são ligadas a secretarias estaduais ou ministérios, como a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), o Instituto de Pesquisa Tecnológica de São Paulo (IPT) e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
Com a patente, o pesquisador ganha um título de propriedade temporária sobre aquela invenção, para que possa desenvolver seu produto sem concorrência. Se não pedir a patente, qualquer competidor pode apropriar-se do seu objeto de trabalho. É um procedimento básico para diversas áreas científicas – embora, em algumas, o objetivo do trabalho seja apenas gerar conhecimento, sem resultados imediatos.
Alguns cientistas contentam-se em apresentar seus estudos em revistas científicas, congressos e seminários. Como, depois de uma apresentação em público, não é mais permitido patentear o trabalho, acabam sem registrá-lo.
Os pesquisadores ainda não estão preocupados em fazer de seus trabalhos um bem intangível – lamenta Luciana Goulart de Oliveira, do Inpi, que assina o levantamento com Jeziel da Silva Nunes. “Mais de metade do que se gasta com pesquisa vem de fundos públicos. E o que é público deveria gerar resultado. Então, há muito dinheiro investido e pouco repassado para a sociedade, na forma de resultados.”

Pouco envolvimento das empresas

A prevalência do Estado, seja como financiador ou patenteador, é uma situação oposta à observada nos EUA e em boa parte da União Europeia. Lá, a iniciativa privada domina o investimento e registro de novos produtos.
“Segundo o Ministério da Ciência e Tecnologia, em 2008 havia 152 mil pesquisadores em instituições de pesquisa e 54 mil no setor empresarial”, destaca Luciana. “Ainda não há a mentalidade de levar esses estudiosos para passar o seu know-how ao mercado.”
De acordo com o levantamento no Inpi, a falta de pesquisadores nas empresas é ruim para a economia. Uma empresa que não mantém seu corpo de pesquisadores não se diferencia das demais. Sem o investimento em diferenciais, como novas tecnologias, ela está indefesa contra uma série de obstáculos.
“No setor elétrico, as fábricas de tomadas, por exemplo, estão se extinguindo, porque é mais fácil comprar da China. Lá o custo de produção é menor, por causa da mão de obra extremamente barata”, explica Luciana. “O mesmo ocorre com os setores calçadista, eletrônico, de máquinas e equipamentos. São casos assim que nos fazem ler tanto atualmente sobre a desindustrialização do Brasil. Estamos perdendo uma base industrial altamente empregadora.”
Dois anos atrás, o Inpi conferiu quais, entre as universidades, eram as maiores depositantes de patentes – e, assim, deparou-se com nomes como USP, UFRJ e Unicamp. Agora, enveredou sua pesquisa pela primeira vez para as instituições não-acadêmicas.
“É o primeiro levantamento do gênero feito no Brasil”, ressalta Luciana. “Fizemos justamente para estabelecer uma série histórica. Assim, no futuro, podemos atribuir o fato de uma década ser mais ou menos produtiva a determinada política pública ou incentivo.”
Os pedidos de patentes foram, proporcionalmente, mais numerosos nos anos 2000 do que nos anos 90. Esta mudança deve-se a uma revisão na Lei de Propriedade Industrial, em 1996, que derrubou a proibição ao patenteamento de remédios e alimentos, e ao próprio desenvolvimento do setor de pesquisa do país.
Outro dado que chamou atenção, dado o tamanho do país e sua quantidade de pesquisadores, é como a pesquisa científica está concentrada em poucas mãos. Dos 673 depósitos de patentes identificados, 91% vêm de apenas 18 instituições.

Para Jerson Lima Silva, diretor científico da Faperj e da Academia Brasileira de Ciências, falta uma maior interação entre os pesquisadores e o Inpi.
“O tempo de tramitação de um pedido de patente pode demorar até sete anos. É algo que desagrada muitos pesquisadores, embora não possa ser reduzido para apenas alguns meses”, pondera. “Mas também precisamos destacar que, em áreas que somos fortes, como a agricultura e a produção de jatos, não é necessário o depósito de tantas patentes como na produção de automóveis, por exemplo. Neste caso, as mudanças na montagem são muito mais frequentes, e cada uma precisa ser protegida por um novo documento.”
Silva assinala que, embora o pedido de patentes ainda seja aquém do desejado, as pesquisas brasileiras têm sido cada vez mais citadas em trabalhos estrangeiros – inclusive em depósitos de patentes.